Estudo revela que 73% dos custos de pessoas com demência estão sob responsabilidade das famílias
25 de dezembro de 2023
Mãos de profissional da saúde segura réplica de um cérebro com sintomas de demência (Reprodução)
Da Revista Cenarium Amazônia*
BRASÍLIA (DF) – Pelo menos 73% dos custos que envolvem o cuidado de pessoas com demência no Brasil ficam para as famílias dos pacientes. O número foi divulgado pelo Relatório Nacional sobre a Demência no Brasil (Renade), do Hospital Alemão Oswaldo Cruz, a partir da iniciativa do Programa de Apoio ao Desenvolvimento Institucional do Sistema Único de Saúde (Proadi-SUS). O estudo revelou que, além dos custos, as pessoas responsáveis pelos cuidados estão sobrecarregadas e que, na maior parte das vezes, são mulheres.
O relatório mostra que esses custos podem chegar a 81,3% por parte do familiar a depender do estágio da demência.
“Isso envolve horas de dedicação para o cuidado. A pessoa, por exemplo, pode ter que parar de trabalhar para cuidar. Isso tudo envolve o que a gente chama de custo informal. É importante que se ofereça um apoio para a família”, afirmou a psiquiatra e epidemiologista Cleusa Ferri, pesquisadora e coordenadora do Projeto Renade, no Hospital Alemão Oswaldo Cruz, em entrevista à Agência Brasil.
O relatório enumera custos diretos em saúde, como internações, consultas e medicamentos, e também os recursos indiretos, como a perda de produtividade da pessoa que é cuidadora.
“As atividades relacionadas ao cuidado e supervisão da pessoa com demência consomem uma média diária de 10 horas e 12 minutos”, aponta o relatório.
Olhar para o cuidador
A médica Cleusa Ferri avalia que é necessário aumentar o número de serviços de qualidade que atendam às necessidades da pessoa com demência e também dos parentes. “O familiar pode até ser um parceiro do cuidado. Mas precisamos também pensar nesse cuidador”.
A psiquiatra e epidemiologista Cleusa Ferri, pesquisadora e coordenadora do Projeto Renade, no Hospital Alemão Oswaldo Cruz (Cleusa Ferri/Arquivo Pessoal)
Para elaboração do estudo, os pesquisadores entrevistaram 140 pessoas com demência e cuidadores de todas as regiões do País, com média de idade de 81,3 anos, sendo 69,3% mulheres. Os dados foram coletados com pessoas em diferentes fases da demência.
O relatório mostra, por exemplo, que entre os 140 cuidadores, pelo menos 45% das pessoas apresentavam sintomas psiquiátricos de ansiedade e depressão, 71,4% apresentavam sinais de sobrecarga relativa ao cuidado, 83,6% exerciam o cuidado de maneira informal e sem remuneração.
O estudo chama a atenção para que, dentro dessa amostra, 51,4% dos pacientes utilizaram, em algum momento, o serviço privado de saúde, 42% não utilizavam nenhum tipo de medicamento para demência. “Somente 15% retiravam a medicação, gratuitamente, no SUS”, disse a epidemiologista Cleusa Ferri.
O estudo aponta que a maioria das pessoas cuidadoras de familiares com algum tipo de demência são mulheres.
“Nessa amostra, temos 86% das cuidadoras sendo mulheres. Isso é um fato. Há uma cultura da mulher cuidar para o resto da vida. Entendo que é uma questão cultural.
Familiar abraça idosa com demência (Rafa Neddermeyer/Agência Brasil)
Subdiagnósticos
De acordo com a pesquisadora, o Brasil contabiliza cerca de 2 milhões de pessoas com demência e 80% delas não estão diagnosticadas. “A taxa de subdiagnóstico é grande. Temos muitas pessoas sem diagnóstico e, portanto, sem cuidado específico para as necessidades que envolvem a doença. Então, esse é um desafio muito importante”, afirma a especialista. Ela cita que esse cenário não é exclusivo do Brasil.
Na Europa, o subdiagnóstico chega a ser de mais de 50% e na América do Norte, mais de 60%.
“No Brasil, temos 1,85 milhão de pessoas com a doença. E a projeção é que esse número triplique até 2050”.
A pesquisadora acrescenta que a invisibilidade da doença é outro desafio. “Temos muito para aumentar o conhecimento, deixar mais visível. A falta de conhecimento da população sobre essa condição precisa ser enfrentada”. Nesse contexto, a invisibilidade também ocorre diante das desigualdades sociais.
Em um cenário de 80% de pessoas sem diagnóstico, isso significa a necessidade de melhorar as políticas públicas para aumentar o conhecimento da população sobre a demência. “Há uma questão de estigma também. As pessoas evitam falar do tema e procurar ajuda”.
Essa situação, na avaliação da pesquisadora, também contribui para dificuldades para conscientização, treinamento de cuidadores e busca por apoio.
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