Estudos mostram redução na populações de insetos; biodiversidade tem queda no Brasil

Anthanassa drusilla rioverde, subespécie de borboleta com população pressionada pelo aumento das pedreiras no sul de Minas Gerais (Thomas Lewinsohn/Unicamp/divulgação)
Com informações do Infoglobo

MANAUS – Estudos em diversas partes no mundo apontam tendência de redução nas populações e insetos, mas atá agora pouco se sabia sobre o Brasil, local que abriga grande variedade desses animais. Um grupo de cientistas finalmente conseguiu reunir em uma única análise 75 observações sobre populações desses bichos, e o resultado mostra que seu número está em queda.

O trabalho, coordenado pelo biólogo Thomas Lewinsohn, professor da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), teve que contornar um problema difícil: a escassez de pesquisas brasileiras de longo prazo para monitorar populações de insetos de maneira sistemática. Para cobrir a lacuna de dados, o cientista e outros três colegas arranjaram uma maneira de contabilizar num só trabalho estudos formais e considerações de outros entomólogos sobre suas experiências de campo.

O trabalho reuniu estudos que versavam sobre medidas de quantidade para 39 conjuntos estudados e medidas de biodiversidade para 38 diferentes áreas estudadas. O resultado preocupante é que 19 observações mostram populações em queda, e 14 mostram a biodiversidade em queda, em quatro dos seis biomas brasileiros (Amazônia, Mata Atlântica, Cerrado e Pampa).

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Apesar das limitações de não poder contar com muitos estudos quantitativos, essa avaliação é a mais abrangente feita no país até agora abarcando vários subgrupos de insetos. O resultado, que divide as avaliações entre insetos aquáticos, borboletas/mariposas, abelhas e outros insetos terrestres, está descrito em um artigo científico publicado nesta quinta-feira.

O grupo aquático, com libélulas e outros animais de habitat alagado, foi o que apresentou situação menos preocupante. Os cientistas acreditam, porém, que o resultado pode ser um artifício, já que algumas séries de coletas começaram em locais que já estavam deteriorados.

O panorama geral mostrado no estudo, de qualquer forma, indica uma tendência de declínio, ainda que seja difícil quantificar esse declínio. Lewinsohn afirma que esse cenário está longe de ter sido uma grande surpresa, porque o sumiço dos insetos é algo que pode ser notado até como experiência informal.

“Eu moro a uns 5 km da Unicamp, num local que era uma antiga fazenda, depois foi convertida em chácaras. A gente veio para cá em 1978, e nessa época não tinha luz de rua. A luz externa que eu tinha na casa, e uma parede branca, funcionavam como uma armadilha luminosa de insetos”, conta o cientista.

“Ao longo dos anos, a mata foi sendo derrubada e foram aparecendo muito mais casas, com mais luz elétrica, e o que aconteceu é que os insetos foram sumindo. A luz de rua é uma armadilha mortal, e muitos insetos morrem atraídos. A mudança da ocupação [da terra] foi a responsável pelo desaparecimento dos insetos aqui”, avalia.

O estudo não tratou do motivo na redução da quantidade de insetos no país, mas a perda de hábitat é considerada o principal fator de explicação. Há outras variáveis a serem consideradas, como o uso de agrotóxicos e a mudança climática.

Obstáculos para a pesquisa

Apesar da preocupação no campo de pesquisa, a quantidade de estudos realizados no Brasil sobre o tema foi pequena, porque acompanhamentos ecológicos de longo prazo requerem projetos de pesquisa com financiamento de longo prazo: um recurso raro no Brasil. A maior parte da pesquisa entomológica do país está atrelada a projetos de pós-graduação que são difíceis de encaixar em programas de natureza repetitiva, como acompanhamento de populações de animais.

Com a metodologia montada para suprir essa lacuna, porém, o biólogo e seus coautores conseguiram convencer a revista na revista britânica Biology Letters, da Royal Society (a maior agremiação científica do Reino Unido) que seus dados eram o cenário mais abrangente sobre o declínio dos insetos no Brasil feita até agora. A publicação acolheu então o estudo, divulgado nesta terça-feira à noite.

Lewinsohn explica que a notícia de que o Brasil está perdendo seus insetos é ruim não apenas para a natureza, mas para a economia.

“Eles têm valor econômico para agricultura, pela polinização, e muitos insetos são o que se costumava chamar de “inimigos naturais” das pragas agrícolas, por serem predadores e parasitas delas”, explica. “Outro serviço menos visível prestado pelos insetos é o processo de decomposição e ciclagem de nutrientes no solo. Insetos como os besouros rola-bosta são essenciais, por exemplo, para a reciclagem de esterco de gado”.

A importância sistêmica desses artrópodes para diferentes ecossistemas justifica que eles ganhem mais atenção por parte de levantamentos ecológicos, e que esses trabalhos sejam de longa duração. Segundo Lewinsohn, o Congresso Brasileiro de Entomologia, que neste ano ocorre na na semana que vem em Fortaleza (CE), vai discutir propostas para cobrir essa lacuna.

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