Exonerado por Bolsonaro, ex-diretor do Inpe é premiado por responsabilidade científica

Ricardo Galvão foi exonerado do cargo após duas semanas de embate do governo contra os dados de desmatamento do Inpe (Reprodução/ Werther Santana)

Com informações Estadão

SÃO PAULO – O físico Ricardo Galvão, exonerado do cargo de diretor do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) pelo presidente Jair Bolsonaro em 2019 após defender os dados de desmatamento da Amazônia gerados pela instituição, foi contemplado nessa segunda-feira, 8, com o prêmio internacional de Liberdade e Responsabilidade Científica.

A láurea foi concedida pela Associação Americana para o Avanço da Ciência (AAAS), a equivalente da SBPC nos Estados Unidos, 1 ano e meio após Galvão protagonizar um episódio que despertou o mundo para a devastação que a Amazônia vinha sofrendo no primeiro ano da gestão Bolsonaro.

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Quando dados de alertas do Inpe vieram à tona mostrando que a ação da motosserra estava acelerando na região, o presidente afirmou que os números eram mentirosos e insinuou que Galvão estaria “a serviço de alguma ONG”. O pesquisador reagiu, defendeu a ciência produzida pelo Inpe e seus pesquisadores e acusou Bolsonaro, em entrevista ao Estadão, de tomar uma “atitude pusilânime e covarde”.

Após duas semanas de embates, Galvão foi exonerado. Ele estava no Inpe desde 1970 e cumpria mandato à frente do órgão até 2020. Com a exoneração, ele voltou a atuar na USP.

Os dados produzidos pelo instituto, porém, continuaram mostrando mês a mês o aumento da devastação. Os números consolidados pelo sistema Prodes, que apontam a taxa oficial e anual de desmatamento, tiveram duas altas consecutivas em 2019 e 2020 – no ano passado chegou ao maior valor desde 2008. Nos dois anos de gestão Bolsonaro, os alertas de desmatamento da Amazônia foram, em média, 82% superiores aos três anos anteriores ao seu governo.

“O professor Galvão defendeu a ciência sólida em face da hostilidade. Ele agiu para proteger o bem-estar do povo brasileiro e da imensa maravilha natural que é a floresta amazônica, um patrimônio mundial”, afirmou em nota Jessica Wyndham, diretora do Programa de Responsabilidade Científica, Direitos Humanos e Direito da AAAS.

O texto divulgado pela associação cita ainda uma frase dita por Galvão em 2019, logo após sua exoneração: “O líder de qualquer país deveria saber que em assuntos científicos não há autoridade acima da soberania da ciência.”

Em agradecimento à instituição, o pesquisador lembrou a luta contra o negacionismo científico, contra o qual muitos cientistas brasileiros vêm lutando nos últimos anos. “Como latino-americano, receber este prêmio é bastante significativo, não apenas para mim, mas também para muitos outros cientistas que, em diferentes ocasiões, reagiram bravamente às políticas negacionistas de líderes políticos poderosos, em particular no que diz respeito à preservação da Floresta Amazônica”, disse.

Desde que foi exonerado, Galvão se transformou em uma voz importante reconhecida no Brasil e no mundo em defesa da ciência e da proteção da Amazônia. Por seus atos, foi premiado ainda em 2019 pela revista britânica Nature como uma das personalidades da ciência mundial, ao lado da adolescente sueca Greta Thunberg.

O pesquisador receberá o prêmio em uma cerimônia virtual nesta quarta-feira, 10, durante a 187ª reunião anual da AAAS.

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