Com informações do Portal Alma Preta
BRASIL – “É necessário reconhecer o racismo institucional no SUS (Sistema Único de Saúde) e os impactos do racismo na saúde da população negra quanto às doenças crônicas não transmissíveis”, destaca a doutora em Saúde Coletiva Ionara Magalhães de Souza, integrante do GT Racismo e Saúde da Abrasco.
Algumas doenças crônicas não transmissíveis acometem mais a população negra do Brasil, tanto por fatores biológicos quanto sociais. Dentre estas patologias, destacam-se a hipertensão ou pressão alta, que é uma doença que ataca os vasos sanguíneos, coração, cérebro, olhos e pode causar paralisação dos rins; e também a diabetes, que acontece quando o pâncreas não é capaz de produzir insulina, a sua produção é insuficiente ou quando o corpo não é capaz de fazer bom uso da insulina que produz.
Essas doenças correspondem a afecções provocadas por múltiplas causas, comportamentos de risco e de exposição, de acordo com Ionara. “Caracterizadas pelo curso prolongado, podem incidir em períodos de agudização, resultar em incapacidades funcionais, anos potenciais de vida perdidos e produzir sofrimento psíquico, transtornos familiares e impactos sociais”, avalia.
Além da população negra, outros grupos sociais são afetados pelas doenças crônicas não transmissíveis, de acordo com a médica, como os povos de terreiros, comunidades indígenas e quilombolas ou populações em situação de rua e privadas de liberdade. Isso ocorre, principalmente, pela vulnerabilidade desses grupos.
“No Brasil, um país racista e profundamente iníquo, a população negra apresenta as piores condições de vida, elevadas taxas de morbidade e as maiores chances de morrer precocemente, por causas mais agressivas e violentas, quando comparada com a população geral”, ressalta.
Fatores de risco
Para o médico Laio Victor Tavares, especialista em Medicina de Família e Comunidade, é importante ressaltar que os fatores de risco das doenças crônicas podem estar relacionados à falta de acessos que a população negra encontra no caminho até a saúde.
“A gente entende que são doenças que demandam muito de um sistema de saúde mais robusto e várias frentes de trabalho. E isso chega com muito mais dificuldade para as pessoas negras”, pondera o mestrando de Epidemiologia em Saúde Pública.
Os perigos para indivíduos em insegurança alimentar e nutricional, com pouco acesso à alimentação saudável, à informação e que, normalmente, são discriminados nos serviços de saúde são múltiplos, segundo Ionara. Associados aos processos de adoecimento, o tabagismo, o consumo abusivo de álcool, a alimentação pobre em frutas e hortaliças e o sedentarismo, são pontos que merecem atenção, ressalta a médica.
“É importante considerar que esses fatores e comportamentos de risco e de exposição são determinados por aspectos políticos e socioeconômicos e não podem ser analisados isoladamente, descontextualizados”, complementa a doutora.
Reconhecer o racismo
Para evitar os danos que as doenças crônicas não transmissíveis podem causar na população negra, a médica Ionara destaca que, além de reconhecer o racismo institucional na saúde pública, é possível adotar algumas medidas sociais, além de hábitos saudáveis, como alimentação mais equilibrada e prática de esportes.
“Implementar em todo o território nacional a Política Nacional de Saúde Integral da População Negra, investir em ações e programas de enfrentamento da discriminação nos serviços de saúde, utilizar a raça/cor da pele nos formulários e instrumentos de pesquisa, serve para monitorar e produzir indicadores de saúde e análises desagregadas por raça/cor da pele”, ressalta.
Laio Tavares também avalia que os cuidados para o bem viver estão totalmente relacionados à identificação dos fatores de risco e, que sem essa análise, é impossível compreender o que faz a população negra ser mais suscetível.
“A situação é fruto do adoecimento programado, usado para dominação colonial, portanto, persiste. Grupos populacionais específicos são submetidos a jornadas de trabalho mais longas, por exemplo. Logo, é criada uma necessidade de uma alimentação menos saudável e mais rápida, o que mostra o desligamento da cultura alimentar ancestral”, pondera Laio.
Identificar necessidades específicas de saúde para o planejamento e priorização de ações e serviços, gerar e disseminar informações sobre a saúde da população negra também são medidas que contribuem para a melhora do bem estar deste grupo. Para Ionara, é necessário investir em informação e na formação de profissionais de saúde, priorizar e implementar estratégias de redução das iniquidades e promoção da equidade racial em saúde.
“Muitos adoecimentos e mortes são preveníveis, evitáveis, injustificáveis e inadmissíveis. A atenção à saúde da população negra requer, sobremaneira, a compreensão do racismo como determinante da saúde e o reconhecimento do direito à saúde como bem inalienável de todas as populações”, conclui a doutora.
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