Fé no Clima: membros de diferentes religiões realizam ato espiritual pela COP30


Por: Ana Cláudia Leocádio

14 de agosto de 2025
Fé no Clima: membros de diferentes religiões realizam ato espiritual pela COP30
Evento "Fé no Clima", no Memorial dos Povos Indígenas, em Brasília (Valter Campanato/Agência Brasil)

BRASÍLIA (DF) – Representantes de diferentes tradições religiosas se reuniram nesta quarta-feira, 13, no Memorial dos Povos Indígenas, em Brasília, para uma mobilização espiritual rumo à 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudança Climática (COP30), que será realizada em novembro, na cidade de Belém, no Pará. Além das lideranças, o movimento ‘Fé no Clima 2025: Um Chamado espiritual e ético rumo à COP30’ contou com a participação da ministra do Meio Ambiente e Mudança Climática, Marina Silva, da diretora-executiva da COP, Ana Toni, e da ativista estadunidense Karenna Gore, diretora-executiva do Centro para a Ética da Terra (Center for Earth Ethics).

Reunidos em círculo, sob a concha acústica de concreto projetada por Oscar Niemeyer, localizada no interior do Memorial dos Povos Indígenas, os participantes compartilharam de que maneira suas religiões abordam as questões da natureza e a relação do ser humano com ela, chamando a todos à ação diante da emergência das mudanças climáticas.

O ‘Fé no Clima 2025’ é uma parceria entre o Instituto de Estudos da Religião (Iser), o Centro Brasil no Clima (CBC) e o Fórum Brasileiro de Mudança Climática (FBMC). A diretora do Iser, Moema Salgado, explicou que o movimento foi lançado em 2015 para realizar um trabalho de mobilização e engajamento de lideranças religiosas no enfrentamento da crise climática. Desde então, tem realizado diferentes atividades pelo País.

Ana Toni, Marina Silva e Karenna Gore (Valter Campanato/Agência Brasil)

O evento foi realizado em Brasília, segundo Salgado, para aproveitar a visita ao Brasil da ativista Karenna Gore, filha do ex-vice-presidente dos Estados Unidos, Al Gore, que também é ativista ambiental. Karenna foi convidada pela ministra Marina Silva para ser a coordenadora para a América do Norte do Balanço Ético Global (BEG), uma iniciativa que tem como objetivo aprimorar a ética da ação climática, sobretudo na preparação da COP30 no Brasil.

Foi uma oportunidade que a gente teve de reunir algumas lideranças religiosas e responsáveis políticos. Pessoas que estão mobilizando grandes grupos, como a ministra do Meio Ambiente e o Ministério dos Povos Indígenas, no sentido de apostar e tentar que a COP seja um momento de novos compromissos e nova ambição. Hoje é uma espécie de abertura para abrir esse caminho rumo à COP”, explicou Moema Salgado sobre o encontro promovido nesta quarta-feira.

O diretor do Memorial dos Povos Indígenas, em Brasília, Davi Terena, do povo Terena do Mato Grosso do Sul, destacou a importância da fé nesse momento em que a situação climática do planeta só tende a piorar. “A fé viva faz a pessoa se mexer”, disse. Para Terena, embora a preocupação do mundo seja sobre como resolver as questões do clima, o problema mais sério, atualmente, é com os devastadores da floresta, cujo interesse é apenas ganhar dinheiro.

Os indígenas Ramona Jucá, do povo Potiguara Ibirapi, do Rio dos Índios, no Rio Grande do Norte, e o guarani Mirim Ju Yam, da Terra Itakopé, em São Paulo, deram início à cerimônia com cantos indígenas e chamaram a atenção para a importância dos povos originários, que são os verdadeiros donos das terras do País. Jucá também convidou os participantes a entoarem o cântico tradicional indígena “Pisa ligeiro, quem não pode com a formiga, não assanha o formigueiro” e a marcharem em círculo.

Ramona Jucá (com microfone), do povo Potiguara Ibirapi, do Rio dos Índios, no Rio Grande do Norte (Ana Cláudia Leocádio/CENARIUM)
Marina fala em altar de pedras lavradas

A ministra Marina Silva falou dos quatro ciclos de mobilização da COP30, uma iniciativa do Brasil como anfitrião do evento, entre os quais o Balanço Ético Global (BEG) é um deles, assim como o Círculo dos Povos, o dos Ministros de Finanças e o dos ex-presidentes das COPs anteriores.

Cristã, Marina usou um texto bíblico sobre Abraão para indicar a dificuldade que se enfrenta para, juntos, agirem no combate à mudança climática. Ela citou uma passagem em que o patriarca bíblico pediu que fizessem um altar utilizando apenas pedras não lavradas, muito mais difíceis de encaixar e que exigem mais argamassa para fixá-las.

“Uma grande parte dessa argamassa vai ficar nas fendas porque o encaixe não vai ser perfeito. Eu sempre penso nessa argamassa como sendo o amor, o respeito, a disposição para depender do outro, do olhar do outro, da escuta do outro, da sustentação do outro, sem o qual não estaríamos nós nem estaríamos aqui”, afirmou.

No evento, Marina Silva falou dos quatro ciclos de mobilização da COP30 (Valter Campanato/Agência Brasil)

Para a ministra, é possível a fé trabalhar de forma suplementar com a ciência, principalmente agora, em favor da COP30 no Brasil, para buscar viabilizar os recursos para financiar, principalmente, os países mais vulneráveis, que já pagam o preço. Dos US$ 13 trilhões necessários, nem US$ 100 bilhões foram viabilizados até agora.

Para a diretora-executiva da COP30, Ana Toni, como esta pretende ser a Conferência da Implementação, o BEG será a bússola que orientará como o Brasil fará as mudanças. “Vai depender de cada um de nós”, afirmou.

A ativista Karenna Gore falou que voltou ao Brasil não apenas com o sentimento de amor familiar, mas pela urgência climática que o mundo enfrenta. Ela disse saber que, nos Estados Unidos, todos são beneficiados pelas florestas do mundo, mas que precisam fazer sua parte também pelo planeta. O desafio é agir coletivamente sem destruir o habitat e descobrir como a fé vai ajudar a humanidade no caminho da preservação.

‘Sem natureza não existe religião’

Representante da Umbanda, Mãe Cícera de Oxum, do Templo Rosa Branca, localizado na área administrativa de Sobradinho, em Brasília, se disse lisonjeada por participar de uma mobilização em defesa da conservação das florestas, por meio de uma ação inter-religiosa. “Costumo dizer que nós somos, todos nós que estamos aqui, pessoas curandeiras urbanas. Porque aqui a gente briga para preservar nosso Cerrado, a Amazônia, os nossos rios. Eu sou barranqueira, nasci na beira do São Francisco”, afirmou.

Conforme Mãe Cícera, na Umbanda a questão da natureza é primordial porque é dela que vêm os santos. “Sem natureza não tem religião. Sem folha não tem santo. Sem casca não tem remédio. Sem raiz não tem remédio. A floresta, a natureza, guarda fielmente os nossos deuses”, ressaltou, citando, dentre os orixás, Xangô, o deus da pedra, e Nanã, a deusa da água parada que ajuda a receber os solos em decomposição. “Então, sem natureza não existe Umbanda. Sem natureza não existe Candomblé. Sem natureza não existe religião”, concluiu.

Mãe Cícera de Oxum (Ana Cláudia Leocádio/CENARIUM)

O presidente do Jnana Mandiram, que significa ‘Templo de Sabedoria’, localizado em Brasília, Prem Kumar, também disse-se entusiasmado com o convite que recebeu para participar do ‘Fé no Clima’. Representante da religião hinduísta, o nome Prem Kumar significa ‘Filho do Amor’. Para ele, há muita identidade entre a cosmovisão dos povos indígenas brasileiros e os ensinamentos das escrituras Vedas, o livro sagrado que baseia o hinduísmo, principalmente no que se refere à linearidade do tempo.

Segundo a cosmovisão hinduísta, “o tempo é cíclico. É como se formam as estações do ano. Há um progresso e também há uma evolução, mas é uma evolução em espiral; assim também é a visão dos povos indígenas brasileiros”, afirmou.

O presidente do Jnana Mandiram, Prem Kumar (Ana Cláudia Leocádio/CENARIUM)
Leia mais: Brasil monitora direitos indígenas em países antes da COP30
Editado por Adrisa De Góes
Revisado por Gustavo Gilona

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