Fim de bonificação regional ameaça educação no Amapá, alertam ativistas
Por: Marcela Leiros
18 de fevereiro de 2025
MANAUS (AM) – Após o Ministério Público Federal (MPF) ajuizar ação para anular o edital do processo seletivo da Universidade Federal do Amapá (Unifap) por conta da bonificação regional de 20% na nota do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) para estudantes da Região Norte, ativistas alertaram à CENARIUM que o fim do bônus causa mais desigualdade na educação.
A bonificação regional é um acréscimo na nota do Enem para candidatos que tenham cursado integralmente o Ensino Médio em escolas situadas no Estado do Amapá ou no Pará, especificamente na Mesorregião do Marajó ou ainda no município de Almeirim. A política de bonificação foi adotada pela Unifap a partir do processo seletivo de 2020. O MPF alega que o bônus é inconstitucional, pois viola os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade.
A estudante Amanda Brito, uma das lideranças do movimento “Bonifica Sim”, lembra que, sem o bônus, a desigualdade na educação do Estado fica cada vez mais evidente. Ela recorda que, antes da bonificação ser implementada, o curso de Medicina da universidade não teve nenhum estudante do Amapá nos anos de 2018 e 2019.
“Um dos argumentos que ele [MPF] usa, o principal deles, na verdade, é que todos são iguais perante a lei, que não existe esse negócio de regionalização, que, se tivesse essa bonificação, ia ter ainda mais esse preconceito de região. O que é um absurdo, porque a gente faz isso exatamente para equiparar a educação do Amapá com os outros estados”, defende a estudante.
A ativista de Direitos Humanos e vereadora suplente Fleur Duarte também participa do movimento. Em vídeo publicado no Instagram, ela destacou a importância da política pública criada para preencher vagas da Unifap com estudantes da localidade onde a universidade está inserida.
“O objetivo, de fato, dessa política pública é para que pessoas de comunidades distantes possam ter acesso e o direito às universidades do nosso Estado, como comunidades quilombolas, comunidades ribeirinhas, comunidades indígenas, comunidades rurais, onde a educação básica não é a mesma educação oferecida na nossa capital. Vale ressaltar que o Amapá é o segundo Estado do País com o pior índice de desenvolvimento educacional do Brasil“, explicou.
O deputado federal Dorinaldo Malafaia (PDT/AP) afirmou, em vídeo no Instagram, que vai apresentar um projeto que regulamente a bonificação. “Vamos apresentar um projeto que regulamente a bonificação. Me solidarizo e me comprometo com os estudantes afetados por essa ação, que desconsidera a realidade da universidade pública na nossa região“, declarou.
Uma petição on-line está disponível para coletar assinaturas de quem quiser contribuir para tornar lei a bonificação regional, no link: https://www.peticao.online/salvar_o_direito_dos_amapaenses_e_marajoaras_de_ingressarem_ao_ensino_superior_publico.
Ação do MPF
Na ação protocolada pelo procurador da República Pedro Afonso Arenhardt Eidt, que pediu a anulação do Edital n.º 01/2025 do processo seletivo da Unifap, assim como da Resolução do Conselho Universitário (Consu) n.º 19/2019 — que instituiu a política de bonificação — o MPF alega que o bônus configura, na prática, uma reserva de aproximadamente 100% das vagas.
Isso porque, considerando que a concorrência no Enem se realiza com base na média da nota obtida em cinco áreas de conhecimento, sendo essa a base para a candidatura ao Sistema de Seleção Unificada (Sisu), o acréscimo de 20% em cima da nota apurada torna as notas dos beneficiários “inalcançáveis” para os demais candidatos, de acordo com o MPF.
“A aplicação desse percentual tem elevado as notas dos beneficiários a patamares inalcançáveis pelos demais candidatos, principalmente no curso de Medicina, modalidade de graduação mais disputada no País“, consta no documento do MPF.

O MPF lembra que o bônus fez as notas de corte para Medicina na Unifap serem as maiores do País em 2022 e 2023. “Esses dados demonstram que a política de bônus regional da Unifap, sob o pretexto de garantir ingresso mais igualitário aos cursos superiores da universidade, tendo como base o curso mais disputado da instituição, resultou, na prática, em uma reserva integral das vagas para candidatos beneficiados nos últimos dois Processos Seletivos e em uma reserva de quase 100% das vagas nos dois anteriores. Assim, a medida adotada pela universidade afronta os princípios da razoabilidade e proporcionalidade“, diz o órgão.

O caso lembra o ocorrido com a Universidade do Estado do Amazonas (UEA) em 2024, quando o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu pela inconstitucionalidade da lei estadual que reservava 80% das vagas nos vestibulares da instituição para candidatos que estudaram em escolas no Amazonas.
Veja a ação na íntegra: