‘Floresta Amazônica mostra sinais de esgotamento’, alerta Carlos Nobre, especialista da USP

Carlos Nobre durante apresentação no USP Talks (Reprodução/Canal USP)

Bruno Pacheco – Da Cenarium

MANAUS (AM) – Em meio à alta de 1,07°C na temperatura global comparada a níveis pré-industriais, evidenciada no relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC, sigla em inglês), a Floresta Amazônica mostra sinais de esgotamento e não consegue mais remover o gás carbônico da atmosfera, segundo especialista em mudanças climáticas e Amazônia, o pesquisador Carlos Nobre, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) e do Instituto de Estudos Avançados (IEA) da Universidade de São Paulo (USP).

Em um estudo desenvolvido pelo Inpe e publicado recentemente na revista científica Nature, denominado “Amazônia como fonte de carbono ligada ao desmatamento e mudanças climáticas“, cientistas alertam que a Amazônia está se caminhando para se tornar uma savana, por conta do aumento no desmatamento nos últimos anos. A pesquisa, realizada entre os anos de 2010 a 2018, mostra ainda que as queimadas foram provocadas pelo homem e não por causas naturais.

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Segundo Carlos Nobre, a Floresta Amazônica não consegue mais remover o gás carbônico da atmosfera (Ricardo Oliveira/Cenarium)

“A pesquisa publicada pela revista Nature mostra, pela primeira vez, que áreas do Sul do Amazonas, a floresta, estão perdendo carbono. Grande parte da Amazônia retira gás carbônico da atmosfera, um sumidouro de carbono, mas o Sul da Amazônia, o Norte de Mato Grosso, o Sul do Pará, o estudo mostra, pela primeira vez, que mesmo a floresta sem desmatamento, sem queimada, ela já não está absorvendo carbono. Isso é preocupante, mostrando que a floresta está perdendo característica típica de florestas de todo o planeta de removerem gás carbônico da atmosfera”, comentou Nobre, em fala concedida à rádio.

Alertas

Em 1990, Nobre já havia feito o primeiro alerta sobre o caso, apontando para uma Amazônia com menos biodiversidade. Para ele, os resultados desses estudos deixam mais claro, ainda, o enorme risco de “savanização” da Floresta Amazônica.

“Isso é uma ideia que eu mesmo fiz em 1990, lançando a hipótese, naquela época, de que o desmatamento poderia levar à savanização, de grande parte da Amazônia se tornar uma sanava tropical bastante degradada, diferente do Cerrado. Uma savana tropical com menos biomassa e biodiversidade. E este estudo mostra claramente que nós estamos muito próximo desse ponto de não retorno de savanização”, salientou.

Sumidouro

Sumidouros de carbono é uma denominação dada a um processo em que ocorre maior absorção de dióxido de carbono do que emissão. Conforme o estudo do Inpe, a Amazônia é considerada uma das mais importante sumidouros de carbono do mundo, por abrigar as maiores florestas tropicais do planeta. Contudo, segundo a pesquisa, este sumidouro parece estar em declínio, como resultado de fatores como desmatamento e mudanças climáticas.

Para chegar ao resultado do estudo, os cientistas realizaram 590 medições de perfis verticais de aeronaves de concentrações troposféricas inferiores de dióxido de carbono e monóxido de carbono em quatro locais na Amazônia nos nove anos de pesquisa.

Ambientalistas afirmam que País não fez o dever de casa assumido em 2009 e 2015 para combater o desmatamento (Reprodução/Shutterstock.com)

“Descobrimos que as emissões totais de carbono são maiores na Amazônia oriental do que na parte ocidental, principalmente como resultado de diferenças espaciais nas emissões de fogo derivadas do monóxido de carbono. O sudeste da Amazônia, em particular, atua como uma fonte líquida de carbono (fluxo total de carbono menos as emissões do fogo) para a atmosfera”, diz trecho da pesquisa.

De acordo com o estudo, nos últimos 40 anos, o leste da Amazônia tem sido sujeito a mais desmatamento, aquecimento e estresse de umidade do que a parte oeste, especialmente durante a estação seca, com o sudeste experimentando as tendências mais fortes.

Tendências

Ao explorar o efeito das mudanças climáticas e as tendências de desmatamento nas emissões de carbono nos locais de estudo, os pesquisadores descobriram que a intensificação da estação seca e um aumento no desmatamento parecem promover estresse no ecossistema, aumento na ocorrência de incêndios e maiores emissões de carbono no leste do Amazonas.

Carlos Nobre desenvolve o projeto “Amazônia 4.0” para promover a bioeconomia da floresta. (Reprodução/Internet)

“A região que apresenta essas maiores transformações é o Sul da Amazônia, que vai desde o Sul da Bolívia, Acre, Rondônia, Norte do Mato Grosso, Sul e Sudeste do Pará. É ali que nós estamos vendo as maiores transformações do risco de savanização e, em parte dessas regiões, a floresta está perdendo carbono e é ali que ocorre o maior número de desmatamento e queimadas”, salienta Carlos Nobre.

Para o especialista, o único caminho para evitar que a Amazônia atinja ao limite e seja destruída é zerando o desmatamento nos próximos anos. “Não há outro caminho que não seja zerar o desmatamento nos próximos anos. Não podemos esperar mais. Temos que mudar o modelo de ocupação da Amazônia, porque uma floresta amazônica recrescendo, ela retira gás carbônico da atmosfera. Esse é o nosso grande desafio”, concluiu o pesquisador Carlos Nobre.

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