Fraude na compra de merenda escolar por R$ 11,4 milhões motivou operação da PF


Por: Marcela Leiros e Ana Pastana

25 de fevereiro de 2025
Em 2020, mais de 20 mil kits do projeto
Em 2020, mais de 20 mil kits do projeto "Hora da Merenda" foram distribuídos pela Prefeitura de Manaus (Divulgação/Semcom)

MANAUS (AM) – A suspeita de fraude na dispensa de licitação para a aquisição de 20 mil kits do projeto “Hora da Merenda” pela Prefeitura de Manaus, em 2020, motivou a “Operação Sem Sabor“, deflagrada pela Polícia Federal (PF) nesta terça-feira, 25. Na época, a gestão municipal, comandada pelo então prefeito Arthur Virgílio Neto, adquiriu alimentos no valor de R$ 11,4 milhões para os estudantes em isolamento social. A investigação aponta o desvio de recursos públicos.

Servidores públicos e empresários estão sendo investigados, segundo a Polícia Federal. O esquema envolve a aquisição de alimentos fornecidos pela empresa A Chaves Coimbra, sob o CNPJ 12.023.960/0001-56, com o nome fantasia Ranchão Comércio de Produtos Alimentícios Ltda.

Detalhes do empenho da Prefeitura de Manaus com a empresa A Chaves Coimbra (Reprodução/Portal da Transparência)

Naquele ano, mais de 20 mil kits do projeto “Hora da Merenda” foram distribuídos em mais de 28 unidades escolares da Secretaria Municipal de Educação (Semed), sob a gestão da secretária Kátia Schweickardt. As cestas continham itens básicos, como arroz, macarrão, farinha, açúcar e outros produtos. A entrega considerou o período em que as aulas presenciais foram suspensas por causa do isolamento social.

Segundo a investigação da Polícia Federal, a empresa contratada não possuía capacidade operacional e foi favorecida no “processo irregular” realizado em 2020, resultando em “prejuízos milionários aos cofres públicos. As investigações começaram a partir de uma ação popular e de auditorias do Ministério Público Federal (MPF) e do Tribunal de Contas da União (TCU).

Sem endereço

De acordo com o Comprovante de Inscrição e de Situação Cadastral da Receita Federal, o empreendimento funciona em um beco no bairro Educandos, Zona Sul de Manaus. A CENARIUM esteve no endereço e constatou que, no local, funciona o Frigorífico Peixão.

Comprovante de Situação Cadastral da A Chaves Coimbra (Reprodução)

Moradores da região confirmaram, à CENARIUM, que no endereço não há outra empresa além do frigorífico há mais de 20 anos.

Frigorífico Peixão, localizado no bairro Educandos, Zona Sul de Manaus (Ricardo Oliveira/Cenarium)
Leia também: PF mira fraude em aquisição de merenda escolar na Prefeitura de Manaus
Irregularidades

Nas auditorias do MPF e do TCU, foram identificadas irregularidades na contratação da fornecedora dos kits de merenda, como indícios de uso indevido da dispensa de licitação, superfaturamento e movimentações financeiras suspeitas entre empresas envolvidas no certame.

A PF afirma, ainda, que há suspeita de direcionamento da contratação, uma vez que a empresa vencedora não possuía histórico de fornecimento de gêneros alimentícios para o setor público e tinha sede em um local desconhecido.

Ainda de acordo com a Polícia Federal, servidores públicos, empresários e intermediários manipularam o processo licitatório para beneficiar a empresa contratada. Um levantamento bancário mostrou que parte dos valores pagos pela Prefeitura de Manaus, na época, foi imediatamente repassada a uma das empresas concorrentes. Também foram identificadas conexões empresariais entre os envolvidos, sugerindo uma atuação coordenada para favorecer a fornecedora.

TCU investigou superfaturamento

O TCU começou a investigar a Prefeitura de Manaus por superfaturamento de R$ 2,8 milhões na compra de merenda escolar. Por meio do Programa Especial de Atuação no Enfrentamento à Crise da Covid-19 (Coopera), o órgão analisou o processo de aquisição dos “kits de merenda”.

Conforme o tribunal, a gestão municipal pagou R$ 4 por pacote de achocolatado em pó (400g), enquanto o setor técnico do órgão encontrou o mesmo produto por R$ 2,51, um preço R$ 1,49 mais baixo. O feijão carioca tipo 1 (1kg) custou R$ 8 para a prefeitura à época, porém, o TCU registrou o mesmo produto por R$ 4,99, um preço R$ 3,01 inferior.

A Secretaria de Controle Externo de Aquisições Logísticas (Selog) do TCU também detectou a ausência de planejamento adequado para a contratação dos alimentos. A compra por dispensa de licitação ocorreu, segundo o órgão técnico, sem que a gestão justificasse a previsão legal para a escolha da modalidade.

No entendimento do TCU, também houve direcionamento da contratação, uma vez que outros fornecedores da prefeitura não foram convocados. Com isso, a pesquisa de preços ficou limitada às empresas que foram convidadas a apresentar proposta, o que prejudicou a avaliação de se os valores ofertados estavam compatíveis com os praticados no mercado.

Revisado por Gustavo Gilona

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