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Funcionário diz que igreja o demitiu por homofobia; Justiça ordena reintegração
A população LGBTQIA+ historicamente tem seus direitos negados, e ativistas defendem que assegurar qualidade de vida a comunidade, implica compreender suas demandas e tratá-las (Reprodução/Internet)
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06 de junho de 2022
Com informações da Folhapress
SÃO PAULO — Um ex-funcionário da Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias está processando a instituição religiosa na Justiça do Trabalho por ter sido demitido por justa causa sob a acusação de ter cometido infidelidade conjugal e, com isso, ter violado o código de conduta previsto por seu empregador.
Para o empregado, porém, a decisão da igreja foi motivada por homofobia. Separado de fato (quando o casal não formaliza o divórcio) desde 2016, Frederico Jorge Cardoso Rocha, 61, tem, há cerca de dois anos, um relacionamento homoafetivo.
A Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias nega. “Um funcionário não é demitido devido a sua identidade ou preferência sexual”, afirma, em nota. A entidade religiosa diz que todos os seus funcionários aceitam voluntariamente viver de acordo com os padrões da instituição, como fidelidade conjugal.
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Bandeira símbolo dos direitos LGBTQIA+ – Marton Monus-14.jun.21/Folhapress
Rocha trabalhou para a igreja por 37 anos como comprador. Ele prospectava e negociava terrenos em toda a América Latina, onde novas capelas e templos seriam instalados.
Na sexta-feira, 3, a juíza substituta Caroline Ferreira Ferrari, da 15ª Vara do Trabalho de São Paulo determinou a reintegração provisória de Rocha ao trabalho, por meio de um recurso chamado de tutela de emergência.
Pesou para a concessão, segundo escreveu Ferrari na decisão, as condições de saúde do ex-funcionário –que tem uma cirurgia agendada para o dia 15 de junho – e o risco de um agravamento devido ao rompimento de vínculo com o plano de saúde em consequência da dispensa por justa causa.
Pelo tipo de demissão, cuja aplicação é prevista pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) para faltas graves, Rocha ficou sem o direito à multa de 40% dos depósitos feitos no Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), ao aviso prévio e ao seguro-desemprego.
Perdeu também o plano de saúde. Como tinha mais de dez anos como segurado, ele poderia, caso a demissão tivesse sido sem justa causa, manter o plano de saúde, desde que assumisse o pagamento integral do benefício.
A reintegração provisória ao emprego, bem como a reinclusão do ex-funcionário no plano de saúde terá de ser cumprida em 48 horas, sob pena de multa diária de R$ 500. A igreja pode recorrer.
No processo que move contra a Igreja, Rocha pede a reversão da demissão e o pagamento dos salários e demais benefícios que deixaram de ser pagos desde o início de abril, quando foi dispensado. Caso a demissão seja mantida, ele quer o cancelamento da justa causa e a liberação das verbas trabalhistas decorrentes da dispensa comum, como a multa de 40% do FGTS.
O ex-funcionário também pede o pagamento de indenização por danos morais de R$ 750 mil, que incluem compensações pelo que considerou uma violação de sua intimidade e vida privada e por dispensa discriminatória.
Doutrina da igreja
Rocha tem convicção de que seu relacionamento – e não o divórcio não consumado – foi o motivo de sua demissão porque um membro da igreja procurou sua ex-mulher para perguntar se ele era, de fato, homossexual.
A apuração, explica o ex-funcionário, decorre de um procedimento interno da doutrina da igreja, que é a necessidade de os empregados terem uma credencial chamada de “recomendação para o templo”, durante o qual há uma entrevista presencial realizada a cada dois anos.
Quando passou por esse procedimento, em fevereiro deste ano, Rocha diz ter sido informado que a igreja havia recebido uma denúncia de que ele era homossexual e vivia um relacionamento homoafetivo.
Naquele momento, conta Rocha, ele negou o questionamento. Tinha medo de perder o emprego e considera que a igreja é “reconhecidamente homofóbica”, segundo escreveu sua defesa na ação trabalhista.
“Não é fácil dizer a verdade. Passei muitos anos da minha vida para aceitar quem eu sou, que eu sou homossexual, são anos de terapia. É difícil dizer isso quando você sabe o preconceito que vai sofrer”, diz.
A igreja baseou a demissão, segundo o comunicado que apresentou ao ex-funcionário, em dois itens previstos para a justa causa, que são mau procedimento e insubordinação. No comunicado de dispensa, ele é informado de que violou “deveres de fidelidade conjugal”.
A exigência da fidelidade conjugal é prevista em contrato a que todos os funcionários tiveram que assinar a partir de 2008.
Ele afirma que a separação judicial da ex-mulher nunca foi concretizada porque a manutenção do vínculo permitia que ela fosse sua dependente no plano de saúde. “Sou uma pessoa discreta, nunca expus a igreja a qualquer constrangimento. Meu trabalho sempre foi executado de maneira íntegra, não aceito a humilhação de uma justa causa.”
Para a advogada Maria Helena Autuori, sócia do escritório Autuori Burmann, a invasão de privacidade é um agravante, independentemente dos valores da instituição religiosa. “Ele não cometeu nenhum ato ilícito. O que ele fez em sua vida privada não afeta o contrato de trabalho, não faz mal a ninguém e nem mesmo à igreja”, afirma.
Frederico Rocha também encaminhou ao Ministério Público Estadual uma representação para que a igreja seja interpelada criminalmente. Desde 2019, homofobia é crime pelo enquadramento na Lei do Racismo.
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