Gilmar Mendes apela por consenso em reunião sobre Marco Temporal


Por: Ana Cláudia Leocádio

12 de maio de 2025
Gilmar Mendes apela por consenso em reunião sobre Marco Temporal
Encontro é mais uma tentativa de buscar consenso sobre o tema (Divulgação/STF)

BRASÍLIA (DF) – O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes reabriu os trabalhos da Comissão Especial de Conciliação sobre a Lei do Marco Temporal (14.701/2023), nesta segunda-feira, 12. Durante o encontro, o magistrado fez mais um apelo para se chegar a consenso sobre os pontos do anteprojeto de lei para substituir a legislação vigente com novos dispositivos que abrangem as questões da demarcação das Terras Indígenas (TIs) e que geram controvérsias.

A Comissão de Conciliação foi instalada, em agosto de 2024, no âmbito das ações que pedem a constitucionalidade (ADO 87), a inconstitucionalidade (ADI 7582, 7583 e 7586) e inconstitucionalidade por omissão (ADO 86) dos dispositivos da Lei 14.701/2023. A legislação aprovada pelo Congresso Nacional é uma reação à decisão do STF de tornar inconstitucional a tese do Marco Temporal, que estipula a data da promulgação da Constituição de 1988, como limite para requerer a demarcação das TIs.

Reunião que busca consenso sobre o tema foi realizada nesta segunda-feira (Divulgação/STF)

Gilmar Mendes é relator das ações relacionadas ao Marco Temporal no STF e vê nessa comissão uma forma de se chegar a um denominador comum sobre o assunto e evitar o “vai-e-vém” do tema, com decisões judiciais sendo contestadas com leis aprovadas pelo Congresso.

Ao reabrir a nova rodada de reuniões, Mendes parabenizou os participantes, mas lembrou aos presentes o compromisso de cada um. “Ainda assim, gostaria de relembrá-los que, para sentar à mesa de autocomposição, é necessário interesse e boa-fé. Se alguém não estiver aqui com essa intenção, não se chegará a lugar nenhum”, afirmou.

O ministro defendeu que somente por meio do diálogo será possível resolver os problemas de centenas de anos que envolvem a questão das terras indígenas. “Espero que vocês usem o diálogo e entendimento, ao invés das lutas tradicionais que já se mostraram não dar certo, porque as mortes e os conflitos no campo permanecem, estão aí acontecendo com bastante frequência, infelizmente. Todos nós sabemos que a fórmula conhecida do insucesso é repetir o mesmo modo de ação”, reiterou Gilmar Mendes.

Ministro do STF Gilmar Mendes coordena os trabalhos da comissão (Divulgação/STF)

Na avaliação do magistrado, qualquer decisão dada pelo STF sobre o assunto, reconhecendo a Lei constitucional ou inconstitucional, não encerrará os conflitos que ocorrem no Brasil há décadas. Tanto a Lei do Marco Temporal quanto o anteprojeto apresentado pelo gabinete de Gilmar Mendes, em fevereiro deste ano, regulamentam o artigo 231 da Carta Magna, que trata dos direitos dos povos indígenas.

Mendes também criticou a atitude de parlamentares que vêm defendendo eleitoralmente posições, a seu ver, ”irrefletidas e demagógicas”, sobre o tema das Terras Indígenas, o que acaba estimulando Organizações Não Governamentais (ONGs) a incentivarem invasões e conflitos.

“Ambos agem irresponsavelmente, porque não podem assegurar a paz do campo, o que acaba sendo um negócio lucrativo para tais intermediadores do conflito. Esses parlamentares, e algumas ONGs, se autoafirmam na sua bolha, com base em devaneios, e prometem o que não podem cumprir. São mercadores de ilusões”, afirmou Mendes, sem citar nomes.

Gilmar Mendes relata ações no STF sobre a constitucionalidade do Marco Temporal (Agência Brasil)

Representante do Congresso Nacional, o senador Hiran Gonçalves (PP-RR), expôs a relação com indígenas do Estado que ele representa, Roraima, e disse esperar que a Comissão chegue a um resultado satisfatório. O parlamentar é autor de uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que coloca na Carta Magna a tese do Marco Temporal.

Nós temos que ter coragem, temos que ter equilíbrio e sabedoria para preservar as populações naturais, respeitá-las, mas também fazer com que o nosso Brasil cresça. E aproveitar nossas riquezas como todos os países desenvolvidos no mundo o fazem, com inteligência. Então esse é o meu pensamento”, ressaltou o senador.

Senador de Roraima, Dr. Hiran também participou da reunião nesta segunda-feira (Divulgação/STF)
Anteprojeto

Dividido em cinco capítulos e 94 artigos, o anteprojeto foi apresentado pelo gabinete de Gilmar Mendes no retorno para finalizar os trabalhos, em fevereiro deste ano. Após críticas, o ministro retirou uma grande parte das propostas, porque tratavam de exploração econômica das TIs, como a mineração. Esta parte será discutida na Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO 86). A Advocacia-Geral da União (AGU) apresentou outra proposta, mais concisa, para ser analisada pelo STF e cotejada com a minuta do ministro.

Desde então, os integrantes da comissão tentam chegar a consensos sobre os dispositivos até o texto final, que será apresentado ao Congresso Nacional. Na reunião desta segunda-feira, o grupo conseguiu analisar pontos até Seção III, que trata das atividades econômicas em Terras Indígenas, com os artigos não retirados pelo ministro.

Mesa de conciliação no Supremo Tribunal Federal (Divulgação/STF)

Segundo o juiz Diego Viegas, responsável pela condução dos trabalhos junto com o juiz Lucas Faber, mesmo os pontos em que houve consenso entre as partes, ao final, serão submetidos à votação para deixar clara a decisão. A dúvida é sobre os pontos de dissenso, que ainda não têm uma dinâmica definida.

Mesa de discussão

Além dos representantes dos partidos políticos autores das ações, a Comissão de Conciliação conta com a participação de indicados do Ministério dos Povos Indígenas (MPI), AGU, Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) e os chamados “amicus curiae” (amigos da Corte), admitidos para prestar informações ou esclarecer questões técnicas no processo judicial.

A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), autora de uma das ações, retirou-se da comissão logo após a instalação do colegiado, em agosto do passado, por considerar a tentativa de conciliação “forçada e compulsória” e que não se podia conciliar sobre direitos indígenas. A entidade também considera que seus direitos já estão garantidos na Constituição e não podem ser negociados de forma arbitrária. A partir da saída, a Apib passou a chamar o colegiado de “câmara da morte”.

A expectativa agora é finalizar os trabalhos da Comissão até dia 23 de junho, com reuniões já programadas para finalizar os debates dos dispositivos do anteprojeto, fazer a votação final e apresentar um Projeto de Lei (PL) para dar lugar à do Marco Temporal, tese já considerada inconstitucional pelo STF.

A crítica dos indígenas a esse debate, inaugurado por Gilmar Mendes no STF, é de que estaria flexibilizando direitos já consolidados na Constituição e criando mais obstáculos para a demarcação das TIs, além de ampliar direitos aos não-indígenas que ocupam ilegalmente as terras, propondo indenizações por terra nua, por exemplo. E aos indígenas, que receberão terras praticamente sem floresta, nenhuma compensação é proposta.

Na avaliação de Gilmar Mendes, não há outra saída a não ser enfrentar e conciliar. “Nós estamos propondo outra saída possível para o impasse, baseada em uma reconciliação, uma nova forma de solução para a jurisdição constitucional, de maneira a resolver definitivamente o problema do conflito no campo e não ficar empurrando para frente sem que este tenha fim”, declarou.

Leia mais: Indígenas realizam protesto contra PEC do Marco Temporal
Editado por Jadson Lima

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