Governo estuda PEC para tirar despesas do teto, liberando espaço para emendas

Bolsonaro, à frente de Guedes, durante cerimônia no Palácio do Planalto (Pedro Ladeira /Folhapress)

Bernardo Caram e Fábio Pupo – Da Folhapress

SÃO PAULO – O governo estuda com aliados uma manobra orçamentária para retirar certas despesas do teto de gastos em 2021 sem decretar o estado de calamidade pública (que libera de forma irrestrita gastos ligados à pandemia). A medida ajudaria a resolver o imbróglio no Orçamento deste ano ao abrir espaço para emendas parlamentares.

A ideia é editar uma nova PEC (Proposta de Emenda à Constituição) para liberar gastos emergenciais específicos e, assim, resolver dois problemas do governo. Por um lado, seriam liberadas despesas para a pandemia; por outro, haveria possibilidade de autorizar mais verbas para deputados e senadores que queiram destinar recursos para obras e outras medidas em seus redutos eleitorais.

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O plano em discussão prevê deixar fora da contabilidade do teto de gastos, da meta fiscal e da regra de ouro certos programas gestados pela Economia, como o Pronampe (programa de crédito para micro e pequenas empresas) e o BEm (Benefício Emergencial de Manutenção do Emprego), além de iniciativas de outras pastas.

Também ficariam de fora dos limites despesas com saúde e outras medidas para mitigar as consequências da Covid-19, de acordo com a avaliação preliminar do governo e de aliados. Os estudos são feitos menos de um mês após a promulgação da emenda constitucional Emergencial, que destravou o auxílio emergencial e que já tinha criado uma cláusula de calamidade pública – que, caso acionada, liberaria gatilhos para contenção de despesas.

Mesmo assim, o ministro Paulo Guedes (Economia) mostra resistência em acionar o estado de calamidade nos moldes aprovados pelo Congresso. Em sua visão, isso criaria um “cheque em branco” para novas despesas sem as devidas contrapartidas.

Isso porque a PEC sugerida por Guedes originalmente previa que o acionamento da cláusula de calamidade permitiria uma vedação de despesas (como o congelamento de salário de servidores e o impedimento de novos gastos obrigatórios) por até três anos.

Mas o Congresso modificou o trecho e restringiu esse ajuste somente para o exercício da calamidade. Neste ano, os salários de servidores já estão congelados e o governo já não tem feito outros tipos de gastos que seriam impedidos – como novos concursos públicos.

Por isso, acionar a calamidade apenas liberaria despesas de forma indiscriminada. “[Ao] apertar hoje o botão de calamidade, você seguraria os salários [de servidores], que já estão travados até dezembro. Seria apenas uma licença para gastar, um cheque em branco. Em vez de ser um sinal de estabilidade, seria o contrário”, disse o ministro na última semana.

Diante da falta de recursos e da resistência de Bolsonaro em cortar verbas de outros programas, o governo já havia decidido financiar certas iniciativas por meio de créditos extraordinários – liberados em momentos de justificada urgência. Esse instrumento não conta no teto de gastos (regra que limita as despesas do governo à variação da inflação).

No entanto, os créditos extraordinários impactam a meta fiscal – diferença entre receitas e despesas previstas pelo governo para o ano, exceto o gasto com juros – e a regra de ouro, que impede o governo de se endividar para pagar despesas correntes, como salários, Previdência e benefícios assistenciais.

A PEC, portanto, abriria caminho para o governo implementar esses gastos sem nenhum tipo de trava. Mas autorizaria apenas despesas específicas, sem liberar novos gastos de maneira ampla e irrestrita como ocorreu em 2020. Na sexta-feira, 8, Guedes indicou que o governo poderá usar créditos extraordinários para financiar programas além do BEm e do Pronampe, mas não deixou claro o plano.

Em videoconferência, o ministro falou em usar esses recursos fora do teto para “preservar algumas áreas críticas importantes”. Destacou ainda que a verba pode ser usada para os dois programas e “mais um pouquinho para efeitos colaterais”.

Guedes também já tinha dado declarações recentes de que o país tem espaço fiscal para fazer mais gastos por meio da flexibilização das regras fiscais, mas desde que voltados à Covid-19 e com valores delimitados.
O BEm é uma complementação parcial de remuneração paga pelo governo a trabalhadores com salário e jornada cortados ou contrato suspenso.

O Pronampe, por sua vez, é um programa de crédito emergencial de baixo custo, com garantia do governo, voltado a pequenas empresas. O novo plano em avaliação seria uma forma de resolver o impasse que se formou em torno do Orçamento deste ano.

Ao aprovarem as contas de 2021, os parlamentares subestimaram gastos obrigatórios, como benefícios previdenciários, e turbinaram as emendas parlamentares. Um acordo entre governo e parlamentares previa uma liberação adicional de R$ 16 bilhões em emendas neste ano. No entanto, o Orçamento foi aprovado com a previsão de R$ 29 bilhões para essa rubrica, patamar considerado insustentável pela equipe econômica.

O movimento criou uma disputa. O Ministério da Economia tenta recompor os gastos obrigatórios e, para isso, afirma que é necessário cortar emendas. Os parlamentares resistem a abrir mão dessa verba. O prazo para sanção do projeto vai até 22 de abril.

TETO DE GASTOS
Limita por 20 anos o crescimento dos gastos do governo federal à variação da inflação.

META FISCAL
É o esforço que o governo promete fazer para evitar o crescimento da dívida pública. O valor estabelecido corresponde à diferença entre as receitas e despesas previstas pelo governo para o ano, exceto o gasto com juros.

REGRA DE OURO
Impede o governo de se endividar para pagar despesas correntes, como salários, Previdência e benefícios assistenciais

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