Guardiões de terra cobiçada por garimpeiros, indígenas Wajãpi denunciam poluição nos rios do Amapá; ‘Tem gerado preocupação’

Indígenas Wajãpi relatam preocupação com alteração na qualidade da água, usada pelas famílias para consumo e banho (Arquivo/Reprodução/Conselho das Aldeias Wajãpi - Apina)

Bruno Pacheco – Da Revista Cenarium

MANAUS – Conhecidos por serem os “guardiões” de uma terra cobiçada por garimpeiros ilegais e mineradoras, que buscam a riqueza em ouro e ferro da região, os Wajãpi denunciaram, na última quarta-feira, 16, que os rios que banham a Terra Indígena que leva o nome deles, no Oeste do Amapá, estão sofrendo com a poluição. O caso foi relatado em uma nota emitida pelo Conselho das Aldeias Wajãpi – Apina, organização que representa os indígenas.

No documento, a entidade relata que os rios Riozinho e Onça estão sofrendo com alterações na qualidade da água, desde 11 de fevereiro deste ano, causadas por uma lama, cuja origem não foi identificada. A organização afirma que recebeu relatos e imagens de indígenas que vivem nas proximidades dos rios, o que tem gerado preocupação entre as lideranças e as famílias do local.

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“Fotos e vídeos de várias aldeias mostram as águas com muita lama e como dependemos dos rios para beber água e tomar banho, isto gerou muita preocupação para os nossos chefes e famílias. Durante o final de semana, a água suja do rio Onça chegou até a aldeia Pairakae, localizada no Rio Felício, afluente do Amapari. E a lama do Riozinho chegou até a Vila do Riozinho, junto à BR-210, no Assentamento Perimetral Norte, em Pedra Branca do Amapari, onde nossos vizinhos assentados também se assustaram muito”, diz trecho da nota.

Aldeia Kwapo’ywyry, Terra Indígena Wajãpi (Frame: Rodrigo Arajeju)

O conselho lembra, ainda, que há anos está denunciando sinais de garimpo e outras atividades ilegais no entorno da terra indígena, como as tentativas de instalação de garimpos, em 2019, no Riozinho, em áreas da Floresta Estadual do Amapá (Flota/AP). “Em 2021, denunciamos a circulação de garimpeiros neste rio, inclusive, dentro da Terra Indígena Wajãpi (TIW), e sinais de instalação de novo garimpo na Reserva de Desenvolvimento Sustentável (RDS) do Rio Iratapuru, próximo aos limites da TIW”, lembra outro trecho da nota.

“Estamos pedindo há muitos anos para os órgãos responsáveis do Governo Federal e do Governo do Estado do Amapá para investigarem esses crimes ambientais e evitar que isso afete a nossa terra, a nossa saúde e os nossos jeitos de viver, que dependem da floresta em pé”, reforça o conselho, no documento.

Fiscalização urgente

Na nota, o conselho pede a órgãos fiscalizadores, como o Ministério Público Federal (MPF), Fundação Nacional do Índio (Funai), Secretaria de Estado de Meio Ambiente (Sema) do Amapá, Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) e Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMbio) para que investiguem o caso.

A entidade indígena quer saber o motivo das águas dos rios ficarem sujas de lama e se há relação com algum acidente natural ou com atividade de garimpo. “Não queremos nossas águas poluídas e nem nossa terra ameaçada por atividades ilegais no entorno ou dentro da Terra Indígena Wajãpi. Nós, do Apina, somos contra o garimpo e a mineração em Terras Indígenas e Unidades de Conservação”, conclui o conselho, em nota.

Confira o documento na íntegra:

Indígenas Wajãpi denunciam poluição nos rios da região (Reprodução/Conselho das Aldeias Wajãpi)

Busca por minérios preciosos

A Terra Indígena Wajãpi está localizada nos municípios de Laranjal do Jari e Pedra Branca do Amapari, no Amapá, e possui uma área de 607 mil hectares, a maior do Estado, em extensão, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Os indígenas se mudaram do Baixo Rio Xingu, no Norte do Pará, para a região, há mais de dois séculos. Desde antes de sua homologação e demarcação, em 1996, os Wajãpi já viviam em represália com garimpeiros e caçadores que buscavam por minérios preciosos.

Segundo o livro “Terra Indígena Wajãpi: da demarcação às experiências de gestão territorial“, escrito por Dominique Tilkin Gallois e publicado em 2011 pelo Instituto de Pesquisa e Formação Indígena (Iepé), os Wajãpi já tinham encontrado com caçadores de pele, conhecidos como “gateiros”, e também com garimpeiros que circulavam nas bacias dos rios Jari e Amapari, no final dos anos 1960.

Somente em 1973, no entanto, os Wajãpi tiveram o primeiro contato com a Funai, quando o Governo Federal estava dando início aos trabalhos de construção da Rodovia Perimetral Norte, a BR-210. Esse projeto tinha como um dos objetivos cortar o território Wajãpi e outras regiões indígenas. Conforme o passar dos anos, a região continuava sendo alvo de garimpeiros e invasores determinados a roubar a terra.

Em 2019, indígenas da aldeia Wajãpi, em Pedra Branca do Amapari, chegaram a relatar uma invasão de 50 garimpeiros na região, após a morte do cacique Emyra Wajãpi, da aldeia Mariry. Segundo lideranças locais, Emyra teria sido atacado enquanto voltava da casa da filha. O corpo dele foi encontrado dentro de um rio.

Em agosto daquele ano, um laudo preliminar da Polícia Federal (PF), no entanto, apontou a causa da morte do líder indígena como afogamento. Em dezembro de 2019, o inquérito que investigava o caso foi arquivado pelo Ministério Público Federal (MPF), após as investigações descartarem o assassinato.

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