Hapvida é acusada de obrigar médicos a prescrever cloroquina contra covid-19

A recomendação se estende à Secretaria Municipal de Saúde e ao Hospital Regional José Mendes (HRJM) (Dirceu Portugal)

Da Revista Cenarium

MANAUS – A rede hospitalar Hapvida está sendo acusada por profissionais de São Paulo e do Ceará, a obrigar médicos a prescrever a hidroxicloroquina aos pacientes.

Conforme apurou reportagem do UOL, a pressão estaria acontecendo porque a rede hospitalar, que possui unidades em vários estados do Brasil inclusive no Amazonas, teria comprado uma carga volumosa do medicamento.

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Segundo documento apurado pelo site, a operadora afirma que investiu mais de R$ 110 milhões no combate à pandemia, “em equipamentos, profissionais e insumos”, diz a reportagem.

A Sociedade Brasileira de Infectologia, presidida pelo cientista Sérgio Cimerman, não recomenda o uso da hidroxicloroquina em pacintes com Covid-19 (Reprodução/Internet)

“Reforço a importância do uso da hidroxicloroquina”, escreveu um dos coordenadores da operadora Hapvida no interior de São Paulo. A informação circulou no fim de julho em grupos do aplicativo WhatsApp de médicos que prestam serviços à empresa, na região de Ribeirão Preto (SP), interior de São Paulo.

Leia também: Me destruir não vai fazer cloroquina funcionar’, diz pesquisador acusado de causar morte de 11 pessoas com uso de substância

Segundo o médico Mauro*, que não quis se identificar, o assédio aos profissionais é pesado. Tanto o é que ele foi desligado dos quadros da empresa, por não concordar em receitar o medicamento aos seus pacientes.

“Eu não queria prescrever hidroxicloroquina a pacientes com a covid-19 porque não é um medicamento aconselhado por entidades de saúde”, relatou o profissional.

No Ceará

Além de São Paulo, existem também denúncias da mesma prática, no Estado do Ceará. Segundo a reportagem, a pressão aos médicos cearenses que fazem parte da rede Hapvida, é enorme.

“Desde o fim de março havia a sugestão para prescrever o remédio. Em abril, a pressão aumentou muito. Mas a maioria dos médicos não quis receitar, por não haver evidências sólidas”, acusou o médico Felipe Nobre.

Ainda segundo ele, o modus operandi para a hidroxicloroquina, seguia os protocolos sanitários. “Até então, era usado apenas em pacientes internados, que tinham acompanhamento e faziam eletrocardiograma diariamente. Não havia nada que indicasse que também deveria ser usado para casos leves”, descreveu.

“A partir de maio, queriam que entregasse para qualquer caso de síndrome gripal. Os coordenadores mandavam estudos de baixa qualidade para justificar e usavam poder argumentativo chulo para tentar nos convencer”, relata Felipe.

Nota

Em nota, a empresa Hapvida afirma que o protocolo contra a covid-19, no qual recomenda o uso de medicamentos como a hidroxicloroquina, foi elaborado por um comitê médico internacional “que se apoia em evidências clínicas, e em comum acordo com os pacientes”.

A empresa afirma ainda em nota, que “sempre respeitou a soberania médica quando o objetivo é salvar vidas” e diz que nunca pressionou os profissionais de saúde a prescreverem hidroxicloroquina ou qualquer remédio no tratamento da covid-19”, diz.

Polêmica

Vedete dos debates médicos há mais de 6 meses, a cloroquina ou hidroxicloroquina é um medicamento indicado em tratamentos de doenças como malária, por exemplo.

No Brasil, o medicamento tem no presidente Jair Bolsonaro (sem partido), o maior entusiasta. O político faz propaganda constante do uso do medicamento e diz, mesmo não sendo médico, que ele cura a infecção causada pelo novo Coronavírus.

No entanto, a Organização Mundial da Saúde (OMS) e centenas de outros organismos internacionais já condenaram seu uso. Segundo a comunidade científica, a hidroxicloquina não tem eficácia comprovada contra o Sars-Cov-2, nome cientifico do vírus causador da Covid-19, e ainda pode causar danos ao sistema cardiovascular.

O nome do cientista Marcus Lacerda ganhou repercussão nacional, após o mesmo ter sido atacado por estudo sobre o uso da cloroquina em pacientes com Covid-19 (Reprodução/Internet)

Em recente declaração à imprensa, Sérgio Cimerman, diretor científico da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI), condenou o uso do medicamento na base do “achômetro”.

“Os estudos observacionais têm uma relevância baixa, porque não são, por exemplo, randomizados (quando participantes são definidos de forma aleatória). Podem ter muitos vieses. Não são adequados (para atestar a eficácia de um medicamento)”, ponderou.

Em Manaus, o infectologista Marcus Lacerda chegou a ser atacado e ameaçado nas redes sociais, após seu estudo comprovar que altas ou baixas doses de hidroxicloroquina, não fazem a menor diferença no tratamento da Covid-19.

Rejeitada pela comunidade acadêmica e defendida por setores da extrema-direita, a cloroquina segue como um dos capítulos intermináveis da pandemia que assolou o mundo e deixou mais de 100 mil mortos no Brasil.

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