Homem é indenizado por hospital em Manaus que não reconheceu união homoafetiva

Decisão do Juízo da 2ª Vara da Fazenda Pública foi proferida em videoconferência (Foto: Raphael Alves/TJAM)

MANAUS – A Defensoria Pública do Estado do Amazonas (DPE-AM) obteve na Justiça indenização por danos morais no valor de R$ 20 mil a um homem que teve direito civil negado pela Fundação de Medicina Tropical “Doutor Heitor Vieira Dourado” (FMT-HVD) após o falecimento de seu companheiro, ocorrido na unidade de saúde. O hospital negou ao viúvo informações de prontuário médico e laudo pericial, sob justificativa de não haver decisão judicial de reconhecimento da união homoafetiva.

A união homoafetiva dos homens era firmada perante cartório e dotada de fé pública, formalizando a união estável. Os documentos hospitalares eram necessários para fins de Imposto de Renda e medidas previdenciárias. Para a Defensoria, a negativa do hospital incorreu em conduta extremada que causou constrangimento relevante, passível de dano moral.

A decisão de indenizar o viúvo foi tomada em recurso de Apelação interposto contra sentença proferida pelo Juízo da 2ª Vara da Fazenda Pública, no qual julgou improcedente o pedido formulado pelo autor no bojo da ação de indenização por danos morais em face do hospital. Na origem, o viúvo informou que mantinha união estável homoafetiva com seu companheiro, possuindo Escritura Pública Declaratória de União Estável firmada perante o Cartório Rabelo do 1º Ofício de Notas.

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Em decorrência da morte de seu companheiro em janeiro de 2015, o homem solicitou à unidade de saúde cópia do prontuário médico e preenchimento de informações em laudo pericial para fins de Declaração de Imposto de Renda e previdenciários, o que foi negado a ele sob justificativa da exigência de reconhecimento judicial da união estável homoafetiva, frente divergências jurisprudenciais.

Em suas razões, a DPE-AM suscitou que a motivação do hospital para negativa da cópia do prontuário são dissonantes com o reconhecimento pelo Estado da união estável, firmado através do julgamento do Supremo Tribunal Federal (STF), que reconheceu a união homoafetiva como entidade familiar para todos os fins, restando evidente a ocorrência de dano moral.

Relatório

O recurso foi julgado pela Terceira Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Amazonas (TJAM), após sustentação oral da DPE-AM, tendo como relator o desembargador Aristóteles Lima Thury. Em seu relatório, o desembargador afirmou que “a negativa de acesso ao prontuário de seu companheiro foi suficiente, por si só, para causar sofrimento íntimo relevante, ultrapassando a sensação de mero dissabor da vida cotidiana”.

“Isso porque, é notório que a sociedade brasileira ainda atravessa uma mudança nos padrões morais pela aceitabilidade de uniões homoafetivas, não somente no sentido de discriminação entre as pessoas em casos pontuais e isolados, mas também no estranhismo que tal situação ainda, e infelizmente, pode gerar em determinada situações, como por exemplo, entender de pronto que uma Escritura de União Homoafetiva se equipara inconteste à união heterossexual”, afirmou o desembargador em seu relatório.

Julgamento estendido

A sustentação oral da Defensoria ocorreu após voto contrário de um dos desembargadores da Câmara Cível. Nos casos em que não há decisão unânime, abre-se um julgamento estendido, convocando mais dois desembargadores para compor a câmara, que é formada por três magistrados. Assim, o tribunal passa a ter cinco julgadores. A sustentação oral é feita no julgamento estendido.

“Nesse julgamento ampliado, a Defensoria sustentou o argumento de que houve uma negativa infundada, que essa negativa tinha por trás um teor de preconceito com a união homoafetiva e que, portanto, deveria o Estado ser condenado. Assim, foi deliberada a vitória do assistido, com a condenação do Estado e concessão da indenização por danos morais”, explica o defensor público Rafael Barbosa, que fez a sustentação oral.

Dessa forma, a Câmara Cível conheceu o recurso, reformando a decisão do juízo e condenando o hospital ao pagamento de R$ 20 mil a título de indenização por danos morais. Após a sustentação oral, o voto do relator foi seguido por outros membros da Câmara Cível.

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