Imperador Trump: ‘Contemplai as minhas obras, ó poderosos, e desesperai-vos’!


Por: André Lopes*

18 de novembro de 2025

A frase acima pertence, historicamente, a Ramsés II, faraó da XIX dinastia. Ramsés II quis deixar sua marca na história com grandes construções e feitos… alguns o consideram um megalomaníaco crônico, outros, um grande faraó que governou o seu País como um estadista. Às vezes, é difícil encontrar o limite entre o orgulho e o dever… assim como entre a loucura e a genialidade. Porém, para homens como Donald Trump, “imperador do planeta”, não é tão difícil. Sua genialidade é de uma criança de cinco anos. Sua perspicácia se resume ao mundo dos negócios e da manipulação que faz parte da elite capitalista dos Estados Unidos. Mas, no mundo da política, diferente do que se esperava, Trump se mostra frágil e refém de uma máquina imperialista de dominação global. Pouco pode fazer contra os “lobbies” e as pressões que sofre e, como todo político, tenta sobreviver na selva que o criou. Talvez, por isso mesmo, esteja encarnando, neste momento, um superimperialismo com esteroides, no qual, a cada dia que passa, quebra as regras da “ordem internacional”, nos levando a um cenário perigoso, em um crescente caos, trazendo insegurança a todo o planeta. E, assim, todos se desesperam perante Ramsés.

A frase acima pertence, historicamente, a Ramsés II, faraó da XIX dinastia. Ramsés II quis deixar sua marca na história com grandes construções e feitos… alguns o consideram um megalomaníaco crônico, outros, um grande faraó que governou o seu País como um estadista. Às vezes, é difícil encontrar o limite entre o orgulho e o dever… assim como entre a loucura e a genialidade. Porém, para homens como Donald Trump, “imperador do planeta”, não é tão difícil. Sua genialidade é de uma criança de cinco anos. Sua perspicácia se resume ao mundo dos negócios e da manipulação que faz parte da elite capitalista dos Estados Unidos. Mas, no mundo da política, diferente do que se esperava, Trump se mostra frágil e refém de uma máquina imperialista de dominação global. Pouco pode fazer contra os “lobbies” e as pressões que sofre e, como todo político, tenta sobreviver na selva que o criou. Talvez, por isso mesmo, esteja encarnando, neste momento, um superimperialismo com esteroides, no qual, a cada dia que passa, quebra as regras da “ordem internacional”, nos levando a um cenário perigoso, em um crescente caos, trazendo insegurança a todo o planeta. E, assim, todos se desesperam perante Ramsés.

Como bem disse Samir Amin, um dos teóricos do imperialismo do século XX, o sistema capitalista, por vocação, se tornou o “primeiro sistema social planetário”. Todos os povos estão ligados, desde as fábricas empoeiradas de Detroit até as diminutas ilhas da Polinésia: todos os seres são influenciados por este sistema e seus protagonistas, a potência hegemônica e seus satélites. Mas os Países Centrais não conseguiriam nada sem a conivência das burguesias dos Países Periféricos. Essas burguesias periféricas são os representantes do imperialismo, seja por meio de ditaduras militares ou de governos alinhados com o capitalismo multinacional espoliador de recursos naturais; espoliação esta necessária para mover as economias centrais do sistema capitalista interestatal. Para cumprir essa missão, faz-se necessária a reprodução dos valores e estilos de vida dos Países Centrais nas sociedades “marginais” da ordem internacional estabelecida. “As burguesias do Terceiro Mundo não conhecem outro objetivo: imitam o modelo de consumo ocidental e a escola reproduz, nesses países, os modelos de organização do trabalho que acompanham as tecnologias ocidentais” (Amin). Mesmo que, atualmente, o expoente do imperialismo sejam os Estados Unidos, não se pode esquecer que seu início e fundamento ideológico surgiram, em primeiro lugar, na Europa. Ao aumentar a produção industrial na segunda metade do século XIX, a expansão imperialista partiu em busca de novos territórios, mercados e recursos naturais em nome do “progresso e da missão civilizadora” para com os povos “aborígenes”. “A filosofia europeia das luzes definiu o quadro essencial da ideologia do capitalismo europeu, baseado no materialismo mecanicista, no qual o progresso, a ciência e a técnica impõem os valores na sociedade e estabelecem as relações sociais” (Amin). Na realidade, o capitalismo cria uma “teologia” que divide o mundo entre desenvolvidos e subdesenvolvidos, onde o imperialismo “civilizador” é justificado e todas as atrocidades têm como objetivo um “bem maior”: utilizando-se de uma narrativa “ahistórica”, a barbárie seria uma característica somente dos colonizados. Assim, paralela à formação dessa “teologia da civilização ocidental”, o imperialismo se desenvolveu mediante duas fases: o surgimento e implantação (1880–1914) e, após a Segunda Guerra Mundial (1945–1970). Também ocorreram duas crises: “uma primeira grande crise (1914–45), da qual surgiram as revoluções russa e chinesa, e uma segunda” (Amin), da Guerra do Vietnã até o fim da URSS. No fim do século XX, todos acreditavam que, após a queda do Muro de Berlim, tudo terminaria. Francis Fukuyama, o “messias” do “neoliberalismo humanitário”, proclamou o fim da História. O fato foi que, das ruínas da Guerra Fria, surgiu o primeiro império global, com cerca de 800 bases militares e centros de vigilância por todo o planeta para proteger “o mercado, os direitos humanos e os valores universais”: a “ordem internacional baseada em regras”, o Império Americano. Na década de 1990, sem fronteiras e sem qualquer tipo de adversário, os Estados Unidos alcançaram um poder que nem seus maiores defensores haviam sonhado. Poderíamos dizer que, nas palavras do economista Michael Hudson, havia se iniciado uma terceira fase de expansão: o “Superimperialismo”.

Para a burguesia dos países periféricos, a agressividade imperialista norte-americana sempre passou despercebida, ou mesmo foi “bem-vinda”: uma “Pax Americana” em nome de um mundo global kantiano que garantisse o lucro e o pagamento dos juros ao sistema financeiro internacional. É necessário ser claro e dizer que não existe um paraíso kantiano global: os Estados Unidos têm uma longa tradição de apoio ao fascismo que vai muito além das ditaduras militares na América Latina durante a Guerra Fria. No início do governo de Franklin Delano Roosevelt, organizações fascistas nos Estados Unidos, simpatizantes de Hitler e Mussolini, tentaram um golpe militar porque se opunham à política do “New Deal”. Como registrou Moniz Bandeira em sua obra “A Desordem Mundial”, “grupos financeiros e industriais, majoritariamente controlados por membros das vinte e quatro famílias mais ricas e poderosas – entre elas Morgan, Robert Sterling Clark, Rockefeller, Goodyear, Prescott Bush – urdiram uma conspiração” (Moniz Bandeira). Tal golpe de Estado, financiado por essas famílias, seria perpetrado por uma organização fascista chamada “Legião Americana”. Eles planejavam invadir a Casa Branca, tomar Roosevelt como prisioneiro e obrigá-lo a terminar com o New Deal. Este verdadeiro golpe de Estado perpetrado por famílias milionárias simpatizantes do nazismo – que tinham à sua disposição um exército privado de quinhentos mil ex-soldados e civis – foi denunciado pelo general Smedley Darlington Butler, oficial condecorado que se recusou a participar da conspiração (Moniz Bandeira). Foi aberta uma investigação, mas, ao ser encoberta pela imprensa, esta caiu no esquecimento. A verdade é que as elites norte-americanas sempre apoiaram o nazifascismo, como o próprio avô do ex-presidente George W. Bush, Prescott Bush, que participou no financiamento da compra de armas para o regime do III Reich – trabalhando como diretor da “Union Banking Corporation”, interconectada com a Corporação Siderúrgica Alemã – recebendo 1,5 milhão de dólares pelos seus serviços (Moniz Bandeira). Assim começou a fortuna da família Bush. Analisando o passado das elites norte-americanas, torna-se mais fácil compreender sua disposição não apenas imperialista, mas também sua profunda conexão com os regimes mais arbitrários e alguns dos mais terríveis crimes contra a humanidade do planeta, como o que está ocorrendo com os povos árabes em todo o Oriente Médio há mais de 30 anos.

No entanto, a tal “ordem internacional” se fratura a cada dia que passa, ao mesmo tempo em que as obras do “Faraó” parecem não ter limites: como um lunático, Trump avança cada vez mais. Sua última façanha foi o ataque direto de Washington às usinas atômicas iranianas. No dia anterior, a Agência Internacional de Energia Atômica fez uma dura crítica ao programa nuclear iraniano, amparando a ofensiva. Após as hostilidades, estes foram os resultados, alguns bastante comprometedores para o sistema interestatal capitalista: a nação persa surge como a grande potência do oeste da Ásia, representante de milhões de muçulmanos humilhados e massacrados por décadas; Rússia e China estão convictas de que o ataque ao Irã faz parte de um plano maior para quebrar a conexão das rotas da Ásia e o projeto dos BRICs; o governo norte-americano não apenas abandonou a mesa de negociação no último momento, mas atacou instalações nucleares iranianas, colocando um fim a qualquer diálogo a curto e médio prazo com Washington; China e Rússia, da mesma forma, se viram traídas pelo governo Trump; a União Europeia – na figura da presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen – antes mais envolvida com a guerra na Ucrânia, agora afirma que o país persa é “o principal fator de desestabilização da região”. Tudo isso está fraturando a ordem internacional, e o mundo se divide em um embate “leste-oeste” que não é mais ideológico (os três pilares dos BRICs são um país capitalista desenvolvimentista, um socialista e uma república islâmica), mas de civilizações. A “Era do Caos” de “Ozymandias” parece ter vindo para ficar. Enquanto isso, nossos pobres países do Sul Global assistem atônitos ao que ocorre no mundo, sem muito poder fazer. O professor José Luís Fiori disse certa vez que temos um “craque” da negociação geopolítica na presidência da república, mas o que pode fazer qualquer presidente que defende o diálogo em um mundo onde as relações internacionais estão sendo esmagadas pelo poder bélico e pela violência do “Leviatã”? A que tipo de governança global podemos retornar quando as normas de direito internacional, a cada dia que passa, são ignoradas e o Direito Internacional se transforma em “ficção científica”? Às vezes me encontro refletindo se a humanidade está de fato evoluindo, quando, na realidade, parece ocorrer justamente o contrário: a hegemonia, para os mandatários de Washington, é realmente tão importante a ponto de “tocar fogo” em todo o planeta? A Trump, o “Nero da modernidade”, realmente lhe requisitaram essa missão a cumprir? Diante de todo o caos “in crescendo”, não são bem os confucianos ateus, os eslavos “expansionistas” e nem os persas xiitas que trazem instabilidade ao mundo… sim, as “democracias ocidentais” prontas a defender os direitos humanos que sobram debaixo dos escombros de milhares de famílias destruídas.

Desde as margens do Lago Titicaca, assisto a todo esse caos, perguntando-me se realmente este lugar sagrado, ocupado por povos tradicionais há milhares de anos, estaria protegido de um possível inverno nuclear. Para os antigos andinos, as mais altas montanhas são divindades, chamadas de “Apus”. Quando estive na cordilheira de Vilcabamba, no último dia antes de descer para o vilarejo de Yanama, como de costume, fiz uma reverência aos Apus, agradecendo sua proteção. Gostaria de estender esta prece a toda a humanidade que assiste, de forma atônita, a esta entropia apocalíptica causada por uma elite empresarial protofascista que parece não conhecer limites por meio da empáfia de seu representante… Trump, o “Imperador do Caos”.

(*)André Lopes é graduado em Direito e mestre em Desenvolvimento Sustentável e Recursos Naturais pela UPeace: Universidade das Nações Unidas.

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