Incra defende parceria com garimpo no Pará e autoriza cessão de 3,5% de assentamento a mineradora
10 de dezembro de 2021
Órgão vinculado ao Ministério da Agricultura não informou qual percentual vai receber pela exploração de ouro na região da Volta Grande do Xingu. (Reprodução)
Com informações do Estadão
BRASÍLIA – O Instituto Nacional da Colonização e Reforma Agrária (Incra) defendeu a parceria que firmou com uma empresa de exploração mineral de ouro e declarou, no contrato assinado com a canadense Belo Sun, que a área explorada será de 3,5% do assentamento Ressaca, localizado na Volta Grande do Xingu, nas proximidades da hidrelétrica de Belo Monte, no Pará.
Por meio de nota enviada à reportagem, o Incra declarou que a concessão de 2.428 hectares à Belo Sun é uma parcela pequena dos 41 mil hectares que formam a área destinada à reforma agrária. “Portanto, foi autorizado o uso de uma área que representa cerca de 3,5% do assentamento”, informou.
O órgão vinculado ao Ministério da Agricultura não detalhou qual seria, afinal, o porcentual que passaria a receber sobre a extração de ouro na região. Declarou apenas que seu contrato se baseia em regras previstas no Código de Mineração e artigos que contemplam a remuneração de proprietários de terras que venham a ser concedidas a terceiros.
A reportagem questionou o Incra se, em alguma vez em toda a sua história, já firmou parceria com exploradores de garimpo em áreas de assentamento. O órgão não se manifestou.
Assentamento Ressaca, no Pará; Incra fez acordo com a mineradora Belo Sun para a exploração de ouro na região. (Andrew Christian Johnson)
Na quinta-feira, 9, o Ministério Público Federal (MPF) recomendou a suspensão dos efeitos do contrato firmado entre o Incra e a mineradora, até que se chegue a um acordo sobre o caso. O órgão informou que vai fazer reuniões para levantar dados sobre o contrato entre o Incra e a Belo Sun, que pretende implantar um megaprojeto de mineração no município de Senador José Porfírio (PA). “O MPF quer avaliar detalhes da proposta e, se necessário, buscar uma solução extrajudicial para correção de eventuais irregularidades”, declarou o órgão, por meio de nota.
No acordo, o Incra concordou em reduzir uma área de 2.428 hectares da região, cortando o território do assentamento Ressaca e da gleba Ituna, onde vivem cerca de 600 famílias. Em troca, o Incra vai receber uma fazenda localizada a mais de 1.500 quilômetros de distância dali, no município de Luciara (MT), nas margens do Rio Araguaia.
O contrato estipula ainda que a empresa deve recolher o valor de R$ 1,34 milhão ao Incra, cifra apurada pela Diretoria de Desenvolvimento e Consolidação de Projetos de Assentamentos, “em contraprestação pelo uso da área do imóvel pertencente ao Incra”. Para chegar ao valor, foi usado o critério de composição do custo da terra, com base na Planilha de Preços Referencias de Terras na região do imóvel. “A planilha é o resultado de estudo do mercado de terras elaborado por equipe técnica do Incra”, informou o órgão.
O Incra afirma que exigiu compensações pelo uso da área e que não será destacada do assentamento. “Tampouco haverá retirada de famílias, por inexistirem assentados vivendo no local diretamente afetado pelo empreendimento”, declarou.
Na realidade, há, sim, famílias que vivem no local, conforme levantamento feito pelo pesquisador Elielson Pereira da Silva, doutor em Ciências e Desenvolvimento Socioambiental da Universidade Federal do Pará.
Segundo o Incra, o contrato inclui “ações em benefício dos próprios moradores dos assentamentos da região, em especial do Ressaca, que tem e continuará tendo capacidade para 600 famílias, não havendo, desta forma, remoção de nenhuma delas do assentamento”.
“Além de estar previsto o pagamento de participação nos resultados ou rendas provenientes da atividade do empreendimento ao Incra (regulada por legislação específica do Código de Mineração), a Belo Sun está obrigada a fazer, sem qualquer ônus para a autarquia, o georreferenciamento e a demarcação de 3 mil quilômetros de extensão em assentamentos dentro da Gleba Ituna e/ou em glebas públicas federais contíguas”, declarou o órgão.
Os equipamentos que estão no acordo (GPS, notebooks, tablets, scanners, caminhonetes), segundo o Incra, “fazem parte dos meios operacionais considerados necessários pelo Incra para o monitoramento e a fiscalização de todas as etapas do processo de execução do contrato, incluindo as atividades da empresa”.
A respeito de receber uma fazenda específica da empresa, a Fazenda Ricaville, com 1,89 mil hectares, em Mato Grosso, a mais de 1,5 mil quilômetros de distância da Volta Grande do Xingu, o Incra afirmou que essa posse “permitirá atender demandas referentes à missão do Incra como agente promovedor de reforma agrária em todo o território nacional”.
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