Indígenas caminham duas horas até chegar à parada de ônibus em Manaus


Por: Ana Pastana

07 de maio de 2025
Indígenas caminham duas horas até chegar à parada de ônibus em Manaus
Indígenas da Comunidade Parque das Tribos, no bairro Tarumã-Açu, na Zona Oeste de Manaus (Composição: Paulo Dutra/CENARIUM)

MANAUS (AM) – Indígenas da Comunidade Parque das Tribos, no bairro Tarumã-Açu, na Zona Oeste de Manaus, enfrentam dificuldades para ter acesso ao transporte coletivo que atende à localidade. De acordo com relatos à CENARIUM, moradores caminham por mais de duas horas para chegar até o ponto de ônibus mais próximo.

O indígena da etnia Guarani Estevão da Silva Cavalcante, de 16 anos, é natural do município de São Paulo de Olivença (a 985 quilômetros da capital amazonense) e está em Manaus em busca de mais oportunidades de estudo. Estevão, que estuda no bairro São Jorge, na Zona Oeste de Manaus, leva cerca de duas horas e 47 minutos para chegar até a parada de ônibus.

“Às 9h, em ponto, eu já estou vindo para cá [para a parada de ônibus], depois eu pego o ônibus das 11h40 e vou para a escola“, afirmou, acrescentando que faz o percurso a pé todos os dias.

O estudante, que mora em uma região de difícil acesso, reforçou a necessidade de paradas de ônibus mais próximas ao local onde mora. “A única coisa que eu pediria, mesmo, era que as linhas de ônibus entrassem até lá [em casa] e que também houvesse mais paradas de ônibus por lá”, reforçou.

O estudante indígena Estevão da Silva Cavalcante (Ricardo Oliveira/Cenarium)

A dona de casa Jaqueline Duarte da Silva, indígena da etnia Munduruku, também precisa caminhar por um quilômetro para chegar até a parada de ônibus mais próxima. A mulher afirma que, no final de semana, a espera por um transporte coletivo pode levar até duas horas.

O transporte, dia de semana, passa a cada uma hora, no final de semana é de duas em duas horas“, disse. Questionada sobre quanto tempo leva para chegar até a parada de ônibus, Jaqueline afirma que caminha por um quilômetro.

[Ando] Um quilômetro para poder pegar o ônibus e quando para tem motorista que só ‘Jesus na causa’, tem uns que estão de bom humor e param porque o ônibus já vem bem lotado. Aqui, nós necessitamos de mais ônibus, durante a semana, seria no caso de três a quatro rotas a mais para diminuir o prazo de duas a três horas esperando o ônibus. Agora eu estou precisando sair, estou desde 10h50 aqui e só vou pegar 11h45, 12h“, declarou.

À direita, a dona de casa Jaqueline da Silva e a filha Aline da Silva (Ricardo Oliveira/Cenarium)

Durante a reportagem, a equipe presenciou a espera por um transporte coletivo da dona de casa e da filha dela. Após uma hora de espera, quando um ônibus se aproximou, Jaqueline foi informada que a motorista que estaria indo para o horário de almoço e que um outro veículo passaria. “Agora, é esperar até as 12h, 12h30“, lamentou.

O que diz o Immu

A CENARIUM entrou em contato com o Immu para questionar sobre as dificuldades com o transporte coletivo relatadas por moradores da Comunidade Parque das Tribos. Em nota, o órgão informou que “atualmente, nove veículos operam nas linhas que atendem a região“, sendo as linhas 011, 012 e 005.

Questionado sobre o porquê algumas regiões da comunidade os coletivos não operam, o instituto municipal informou que “determinadas localidades ainda não contam com atendimento direto devido à inviabilidade operacional de trajeto e manobra dos coletivos em pontos mais internos da comunidade“.

Além disso, o Immu informou que “mantém estudos técnicos em andamento visando a melhoria do atendimento à comunidade” e que estão “avaliando alternativas viáveis de acesso para garantir maior cobertura, segurança e regularidade nas operações do transporte coletivo na região“.

Aumento da tarifa

A Prefeitura de Manaus aumentou o valor da tarifa do transporte coletivo de R$ 4,50 para R$ 6, no valor integral. O valor, que passou a valer a partir do dia 20 abril deste ano, foi oficializado pelo prefeito da capital amazonense, David Almeida (Avante), por meio do decreto 6.166/2025, publicado em edição extra do Diário Oficial de Manaus (DOM), no dia 19 do mesmo mês.

Transporte coletivo da linha 708 indicando o aumento da tarifa (Paulo Dutra/CENARIUM)

De acordo com a Prefeitura de Manaus, apesar do valor cheio da passagem ser de R$ 6, descontos serão aplicados conforme o perfil do usuário. Passageiros que pagam com dinheiro ou cartão PassaFácil terão desconto e pagarão R$ 5 por viagem. Os estudantes que não possuem gratuidade devem seguir pagando R$ 2,50, mediante apresentação da carteira estudantil válida.

Em fevereiro, o aumento da tarifa do transporte coletivo em Manaus chegou a ser alvo de Ação Civil Pública (ACP), do Ministério Público do Estado do Amazonas (MP-AM) para suspender o aumento da tarifa, que seria reajustado de R$ 4,50 para R$ 5. Na época, o MP apontou que o reajuste foi realizado sem a devida transparência, considerando que o Immu e o Sindicato das Empresas de Transporte de Passageiros do Estado do Amazonas (Sinetram) não apresentaram estudos técnicos que justificassem o novo valor.

A justificativa para o aumento, de acordo com a Prefeitura de Manaus, seria a renovação da frota. Mas, segundo o MP-AM, “a substituição de veículos é uma obrigação contratual das concessionárias e deveria ocorrer regularmente para garantir um transporte de qualidade”.

Parque das Tribos

O bairro Parque das Tribos, primeiro bairro indígena da capital amazonense, segundo a prefeitura municipal, abriga mais de 1 mil famílias, de 35 etnias.

Em 2024, a CENARIUM já havia registrado a dificuldade dos moradores do Parque das Tribos com o acesso ao transporte coletivo no bairro. Na época, o pai de uma estudante do Ensino Médio Raimundo Nonato lamentou que a filha precisasse enfrentar um longo trajeto para ter acesso ao transporte coletivo.

Edição n° 46 da Revista Cenarium em Abril de 2024 (Divulgação)
Leia mais: Revista Cenarium – Ed. 46 – Abril/2024

“Minha filha sai às 4h da tarde para chegar na escola. Só volta às 21h, em um ônibus lotado e com a mochila pesada nas costas. Quando tem mais sorte, chega às 20h, dependendo do trânsito ou se nada acontece com o ônibus no caminho”, afirmou na época.

Samia Gonzaga da Silva, da etnia Kanamari, moradora do Parque das Tribos desde a fundação, afirmou à reportagem na época que muitos indígenas chegaram a perder oportunidades de trabalho devido à demora dos coletivos na região. “A gente passa horas na parada de ônibus e, quando passa, é lotado. A principal situação é que eles demoram. Gostaríamos de mais opções e outras linhas. A situação aqui de transporte é de calamidade“, disse.

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Editado por Adrisa De Góes
Revisado por Gustavo Gilona

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