Indígenas Tikuna reavivam esperança em manifestações artísticas após apresentação do edital Zezinho Corrêa

Acesso ao edital Zezinho Corrêa levou esperança para os artistas Tikunas (Oliveira Júnior/Manauscult)

Matheus Pereira – Da Revista Cenarium

A Fundação Municipal de Cultura, Turismo e Eventos (Manauscult) apresentou neste domingo, 11, o edital Prêmio Manaus 2021 Zezinho Corrêa aos artistas indígenas da etnia Tikuna. Participaram da apresentação cerca de 10 pessoas, entre elas, o coordenador do grupo Dança Cultural Indígena, Gelson Tikuna, que revelou estar desconfiado por conta de episódios vividos durante as gestões anteriores, mas mantém a esperança de poder manifestar sua cultura e levá-la adiante, desta vez por meio desse edital da prefeitura.

Gelson conta que esteve na Manauscult em 2014, demorou para ser atendido e teve seu projeto negado duas vezes. “Eles vieram aqui na nossa associação e falaram para levarmos nosso projeto e levamos, mas, quando chegamos lá, fomos recebidos às 19h e quando fomos recebidos tivemos o projeto negado. Então é por isso que hoje nós estamos desconfiados com a Manauscult, mas agora com esse novo trabalho eu espero que melhore para podermos criar nosso projeto. Nossa esperança é que por meio da Manauscult e desses projetos, a população indígena que vive aqui em Manaus não seja esquecida”, declarou o indígena.

PUBLICIDADE

Outra indígena que participou da apresentação e que também tem um pé atrás, por conta de situações vividas em outros projetos e editais, é Clotilde Tikuna, coordenadora do Grupo Eware (que na língua tikuna significa encontro sagrado dos povos indígenas). Segundo a artista, ela e seu grupo já chegaram a participar de projetos em que não receberam o que havia sido prometido, seja estruturalmente ou financeiramente.

Clotilde diz que entende a intenção do projeto e vê mais uma oportunidade de representar sua cultura, mas espera que desta vez a história seja diferente. “É muito importante, mas desde que não sejamos explorados. Porque muitas vezes somos convidados, nós apresentamos, mas não somos recompensados. Então, esperamos que desta vez realmente tenhamos uma ajuda”, declarou.

Gratidão pela iniciativa

A esperança mantida viva por esses indígenas em poder levar suas manifestações artísticas e culturais e serem justamente recompensados por isso, se deve pelo fato de que esta é a primeira vez que a Manauscult vai presencialmente a uma associação ou comunidade indígena para apresentar um edital de projeto artístico. O presidente do Conselho Municipal de Cultura (Concultura), Tenório Telles, destacou a importância de levar iniciativas como esses povos. “Oportunizar a participação das populações indígenas no processo cultural de Manaus é mais que uma questão de inclusão, é um ato de reconhecimento e valorização das suas produções artísticas”, declarou.

Como as inscrições são exclusivamente online, a Manauscult vai disponibilizar em sua sede administrativa, localizada no Les Artistes Café Teatro, um espaço com computadores e internet, para a realização das inscrições, que estão abertas até o dia 3 de maio.

O vice-cacique da comunidade, Bernardino Tikuna, agradeceu a iniciativa da Manauscult e destacou a importância de incluir os indígenas e levar essa oportunidade, tendo em vista as dificuldades encontradas pelos comunitários não só de se manifestarem artística e culturalmente, mas de manterem seu sustento, por conta da pandemia de Covid-19. “Essa é uma grande oportunidade para nós. Paramos de vender nosso artesanato, não está saindo nada e estamos tendo dificuldade para comprar nossos alimentos, porque é do artesanato que tiramos nosso sustento. Então, essa oportunidade vai nos ajudar a conseguir esse dinheiro, pelos nossos projetos”, declarou o líder indígena.

O vice-cacique da comunidade, Bernardino Tikuna, destacou a importância de incluir os povos indígenas nas manifestações artísticas

Gelson Tikuna também aproveitou a oportunidade para agradecer a preocupação dos gestores em ter uma atenção especial aos povos indígenas, que vivem em Manaus. “Essa gestão tem um pensamento humanitário de abranger os povos indígenas, então quero agradecer a toda equipe que veio até aqui. E vamos caminhar lá na comunidade, por meio das associações para conseguir chegar e ganhar esse prêmio”, disse.

Para manter a cultura viva

Além da importância financeira, projetos como o Prêmio Manaus 2021 Zezinho Corrêa também são vistos pelos indígenas como forma de manter viva sua cultura e poder levá-la a quem não conhece ou ainda tem preconceito.

Manifestando sua cultura por meio de danças, músicas e rituais com o Grupo Eware desde 2017, Clotilde vê projetos como o Prêmio Zezinho Corrêa como oportunidades de mostrar para sociedade o que vem sendo passado pelas gerações de tikunas há anos. “Nossa etnia realmente vive isso, vivencia ainda os rituais mesmo morando na cidade, para manter viva nossa cultura”, enfatizou.

Grupo Eware leva sua cultura por meio de danças, músicas e rituais, desde 2017 (Reprodução)

Para a artista Elizete Tikuna, tais oportunidades podem servir ainda como uma forma de tentar ser valorizado e respeitado. “O que eu quero por meio do meu projeto de grafismo originário do povo é que as pessoas vejam nossas origens. O povo precisa ver e respeitar nosso grafismo indígena”, afirmou.

Elizete faz pinturas de origem tikuna em roupas, paredes e também na pele. Além disso, a indígena também é artesã e cantora. A tikuna Clotilde conta que na comunidade, a música é explorada além do tradicional, sendo levada por meio de ritmos musicais como o rap. “Meu filho junto com outro jovem canta rap, um rap indígena da etnia. As letras falam sobre a cultura, sobre como é a união dos povos indígenas e como foi desenvolvido o Parque das Tribos”, destacou.

O prêmio

O Prêmio Manaus 2021 Zezinho Corrêa vai contemplar até 325 propostas de projetos artístico-culturais. Tanto os projetos apresentados quanto as suas respectivas contrapartidas deverão ser realizados em um dos seguintes formatos: podcast; vídeo; e-book; live; ou propostas formativas virtuais, como workshops, palestras, debates e oficinas.

O nome do prêmio é uma homenagem ao cantor Zezinho Corrêa, que morreu em fevereiro deste ano, vítima da Covid-19. O músico foi responsável por levar a cultura do Norte do Brasil para os diferentes cantos do mundo, nos anos 90, por meio dos hits ‘Tic, Tic Tac’ e ‘Boi Caprichoso’.

Os projetos selecionados terão um prazo de seis meses para realizar suas atividades, a contar da data do recebimento dos recursos. O edital na íntegra e todos os anexos necessários para a inscrição estão disponíveis no portal Viva Manaus.

Edição: Alessandra Leite

PUBLICIDADE

O que você achou deste conteúdo?

Compartilhe:

Comentários

Os comentários são de responsabilidade exclusiva de seus autores e não representam a opinião deste site. Se achar algo que viole os termos de uso, denuncie. Leia as perguntas mais frequentes para saber o que é impróprio ou ilegal.