Lideranças indígenas criticam Bolsonaro após fala sugerindo convocação na CPI da Pandemia

O áudio do coordenador foi divulgado nesta quinta-feira. (Marcelo Camargo/Agência Brasil)

Bruno Pacheco – Da Revista Cenarium

MANAUS – A sugestão do presidente Jair Messias Bolsonaro (sem partido) de convocar indígenas para falarem, na Comissão Palarmentar de Inquérito (CPI) da Pandemia, sobre o uso de ervas medicinais no tratamento contra Covid-19, foi criticada por representantes indígenas do Amazonas. Para lideranças, quem deve ser convocado é o presidente.

“Quem tem que ir à CPI é ele que nada fez para ajudar a população brasileira e, sobretudo, a nós povos indígenas. O que tivemos de ação foi por meio da pressão do movimento indígena”, afirmou Marivelton Baré, presidente da Federação Indígena do Alto Rio Negro (Foirn).

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A coordenadora da Associação das Mulheres Indígenas do Alto Rio Negro (Amarn), Clarice Tukano, defende que o uso das plantas e das ervas medicinais ajuda a aumentar a imunidade. “O uso de nossas ervas medicinais é um forma de prevenção, isso não contrapõe as orientações da ciência, da medicina. As nossas ervas ajudam aumentar a imunidade. Diferente do que o presidente fala a respeito da cloroquina”, declarou.

O uso de plantas e ervas medicinais da Amazônia no tratamento de enfermidades é uma prática existente há séculos e repassada de gerações em gerações. Com a pandemia da Covid-19, mesmo sem comprovação científica contra a doença, elas se tornaram em grandes aliadas da população na melhora de sintomas.

Para os indígenas, no entanto, o chefe do Executivo ignora o saber milenar dos povos tradicionais ao propor que eles sejam interrogados na CPI. “Não só ignora como desconhece os conhecimentos tradicionais milenares que, culturalmente, nós preservamos”, destacou Marivelton.

À REVISTA CENARIUM, o presidente da Foirn destaca que, além das plantas, o benzimento e as rezas são alternativas dos indígenas para tratarem doenças.

“Ao contrário do presidente, os remédios e plantas são utilizadas e recomendadas pelos conhecedores e conhecedoras tradicionais, não somos irresponsáveis no uso aleatório de qualquer medicamento para tratamento, pois além das plantas também usamos o benzimento. Nosso conhecimento não pode ser usado como uma justificativa para os erros e as indicações do presidente sobre medicamento”, comentou.

Para Juvêncio Baniwa, liderança da Coordenadoria Baniwa e Koripako Nadzoeri da Foirn, o presidente Bolsonaro ilude e confunde indígenas ao colocar em cheque o uso de plantas medicinais, além de tentar se proteger ao propor que indígenas sejam ouvidos na CPI. “Ele tenta confundir a ideia para fugir da responsabilidade do Estado e do governo para tentar se moldar e se proteger da CPI”, declarou.

Plantas

O presidente esteve em São Gabriel da Cachoeira, interior do Amazonas, nessa quinta-feira, 27, onde inaugurou uma ponte de madeira de 18 metros de comprimento e sete de largura na BR-307, que liga a cidade a comunidades Yanomami, em Balaio. Em nota pública, 23 povos indígenas do Rio Negro, representados pela Foirn, mostraram profunda insatisfação com a conduta do Bolsonaro, por não incluir lideranças na agenda e sequer convidados para qualquer diálogo com o presidente.

Em uma live realizada no município, à noite, o presidente propôs que indígenas fossem convocados à CPI para explicar sobre o uso de ervas medicinais no tratamento contra a Covid-19. Bolsonaro cita que indígenas responderam a ele que teriam usado chá de carapanaúba, saracura e jambu para combater a doença.

As plantas são regionais da Amazônia e são utilizadas para tratamento de várias enfermidades. Segundo o professor e biólogo Cadmiel Rafael, a carapanaúba é utilizada como anti-inflamatório pelos povos das florestas, principalmente, aqueles que apresentam dores de estômago ou algum processo inflamatório.

O jambu também é usado como anti-inflamatório, ajudando a a aliviar a dor na garganta e auxiliando no tratamento da tosse. A saracura-mirá é uma espécie de ‘sara-tudo’ e usado no tratamento de cansaço físico, sexual, insônia, nervosismo, falta de memória, além de possuir propriedades de combate à malária.

“A saracura é conhecida como o ‘cura-tudo’ e é empregado para vários distúrbios. O que o nosso presidente e muitas pessoas não entendem é que, para os indígenas, a natureza e a terra têm o poder de curar todos os males, desde físicos até o espiritual e todos os processos deles, todas as medicinas ancestrais, todas as ervas, chás, são tomados em rituais”, explica.

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