Lula veta dispositivo que dispensava licenciamento de rodovias como a BR-319


Por: Ana Cláudia Leocádio

08 de agosto de 2025
Lula veta dispositivo que dispensava licenciamento de rodovias como a BR-319
BR-319 é uma rodovia que liga Manaus (AM) a Porto Velho (Ana Jaguatirica/CENARIUM)

BRASÍLIA (DF) – O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) vetou o dispositivo do Projeto de Lei Geral do Licenciamento Ambiental, que dispensava de licenciamento rodovias anteriormente pavimentadas, que beneficiaria as obras de repavimentação da BR-319, que liga Manaus (AM) a Porto Velho (RO). A emenda foi apresentada pelo senador Eduardo Braga (MDB), durante a votação no Senado Federal, e mantida pela Câmara dos Deputados. A vedação integra o conjunto de 63 vetos dos 400 dispositivos do PL 2159/2021, anunciados nesta sexta-feira, 8, durante coletiva de imprensa, no Palácio do Planalto, pelos ministros de Lula, que está em viagem aos Estados do Acre e Rondônia.

Além do veto parcial ao PL do Licenciamento, apelidado pelos ambientalistas de “PL da Devastação”, o governo federal anunciou que os dispositivos vetados serão objeto de um Projeto de Lei (PL) com texto alternativo, para ser analisado em regime de urgência pelo Congresso Nacional. Segundo o governo, os ajustes do novo PL foram elaborados para evitar lacunas regulatórias e insegurança jurídica, além de unificar normas dispersas em um marco regulatório único.

BR-319, rodovia federal que liga o Estado do Amazonas a Rondônia (Ana Jaguatirica/CENARIUM)

Outra medida, é a edição de uma Medida Provisória (MP) para colocar em vigor, de imediato, os dispositivos da Licença Ambiental Especial (LAE), uma novidade aprovada pelo Congresso, que dá ao Conselho de República a responsabilidade para definir os empreendimentos estratégicos para o País, que terão um regime especial de licenciamento, com limite de prazo de 12 meses. A LAE foi uma emenda proposta pelo presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP).

A amenda apresentada por Braga, no dia 21 de maio, inseriu as rodovias anteriormente pavimentadas entre os empreendimentos não sujeitos a licenciamento ambiental, previstos no inciso VII, do artigo 8º do PL do Licenciamento. Segundo o secretário especial para Assuntos Jurídicos da Casa Civil, Marcos Rogério, explicou que o dispositivo foi objeto de veto com um texto alternativo no novo PL, que será enviado ao Congresso Nacional.

Secretário especial para Assuntos Jurídicos da Casa Civil, Marcos Rogério participou de entrevista coletiva (Rogério Cassimiro/ MMA)

“Houve o veto com texto alternativo, mas a LAE tem essa lógica. A LAE procura priorizar empreendimentos estratégicos estabelecendo procedimentos mais céleres e prazos para que haja a decisão. Exatamente para que empreendimentos com essa complexidade eventualmente possam sofrer a priorização. Até por isso a MP foi editada agora, já com efeito imediato”, explicou.

O secretário-executivo do Ministério do Meio Ambiente e da Mudança do Clima (MMA), João Paulo Capobianco, disse que houve ao veto, mas com a inclusão da obrigatoriedade de licença prévia (LP), considerado importante para esse trecho da lei.

Secretário-executivo do MMA, João Paulo Capobianco (Rogério Cassimiro/ MMA)

Marcos Rogério ressaltou que a decisão de vetar os 63 dispositivos, dos 400 aprovados na lei, “mantém avanços relevantes para a celeridade e eficiência de processos de licenciamento ambiental e assegura que o novo marco legal esteja alinhado à Política Nacional de Meio Ambiente, à Constituição Federal e à Lei Complementar 140″.

Além disso, é a primeira vez que o Brasil terá uma Lei Geral de Licenciamento Ambiental, que unificará as normas que deverão ser seguidas pelos três entes federados: União, Estados e Municípios.

‘Integridade mantida’

Para a ministra do MMA, Marina Silva, os vetos são resultado de um trabalho conjunto que contou com a participação dos técnicos de vários ministérios, da sociedade civil, científica e de juristas, que conseguiram chegar a um resultado que preserva o licenciamento como espinha dorsal de proteção ambiental.

Isso era fulcral como todo tempo nós sinalizávamos, que o governo iria se voltar para questões estratégicas que preservassem a integridade do licenciamento ambiental. Questões muito importante, de mérito e do ponto de vista político e simbólico, cultural, social, como direito dos povos indígenas e quilombolas”, disse Marina, que está otimista com o diálogo com o Congresso Nacional para aprovar o novo texto proposto.

A ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, ao lado do ministro das Comunicações, Sidônio Palmeira (Rogério Cassimiro/ MMA)

Além de Marina, Capobianco e Marcos Rogério, participaram da coletiva de imprensa para anunciar a decisão de Lula, o ministro da Comunicação, Sidônio Palmeira; a ministra-substituta da Casa Civil, Míriam Belchior; e o secretário-executivo da Secretaria de Relações Institucionais, Gustavo Ponce de Leon.

Ao anunciar o veto parcial aos 63 dispositivos, os ministros disseram que as decisões foram tomadas baseadas em quatro diretrizes:

  • garantir a integridade do processo de licenciamento, que proteja o meio ambiente e promova o desenvolvimento sustentável;
  • assegurar os direitos de povos indígenas e comunidades quilombolas;
  • dar segurança jurídica a empreendimentos e investidores;
  • e incorporar inovações que tornem o licenciamento
    mais ágil, sem comprometer sua qualidade.

Belchior ressaltou que, além das quatro diretrizes, o presidente Lula dedicou mais de cinco horas com os ministros e técnicos do governo para analisar o projeto, porque também é importante preservar os avanços aprovados pelo Congresso, que deverão dar celeridade ao processo de licenciamento ambiental no País.

Os vetos de Lula agora deverão ser analisados pelos deputados e senadores, que podem mantê-los ou derrubá-los. A MP e o PL do Licenciamento serão publicados ainda nesta sexta-feira, no Diário Oficial da União (DOU), segundo anunciaram os ministros.

Dispositivos vetados

Dentre os pontos vetados, está a ampliação da Licença de Adesão por Compromisso (LAC) para empreendimentos de médio potencial poluidor, mantendo-a apenas para os de baixo impacto. A medida evita que empreendimentos de risco relevante, como barragens de rejeitos, realizem licenciamento simplificado sem análise técnica adequada. O PL do Executivo também acrescenta limites ao procedimento autodeclaratório previsto na LAC.

Barragem que rompeu em Brumadinho, em Minas Gerais (Reprodução)

Também foi vetado o dispositivo que dispensava de serem ouvidos os órgãos ambientais para autorização de supressão de floresta nativa da Mata Atlântica, bioma que hoje detém apenas 24% de vegetação nativa remanescente.

Lula também vetou dispositivos que restringiam a consulta aos órgãos responsáveis pela proteção de povos indígenas e comunidades quilombolas, limitando ouvir apenas os indígenas e quilombolas de terras demarcadas e regularizadas. O governo incluiu no novo texto, o reconhecimento das terras através de relatórios pela Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) e Fundação Palmares, no caso dos quilombos, como marcos para consulta.

Moradores da Comunidade Santo Antônio, no Rio Anebá (Ricardo Oliveira/CENARIUM)

Outro ponto vetado foi a dispensa do licenciamento ambiental para produtores rurais com Cadastro Ambiental Rural (CAR) ainda pendente de análise pelos órgãos ambientais estaduais. A nova proposta do governo é de que se tenha um outro instrumento de compromisso a ser assumido pelo produtor, que está com o CAR pendente.

O presidente também vetou parte do texto que limitava a aplicação de condicionantes ambientais e medidas compensatórias apenas aos impactos diretos, excluindo os impactos indiretos ou os efeitos sobre serviços públicos agravados pela implantação do empreendimento. No PL a ser enviado ao Congresso, as medidas precisam ter nexo de causalidade com o empreendimento.

O PL do Licenciamento também retirava o caráter vinculante de manifestação de órgãos gestores de Unidades de Conservação (UCs) no licenciamento de empreendimentos que afetem diretamente a unidade ou sua zona de amortecimento. Com o veto, volta a necessidade vinculante, pela importância de avaliação técnica especializada na proteção de áreas sensíveis.

Unidades de Conservação (UCs) são áreas protegidas por lei (Tânia Rêgo/Agência Brasil)

Mesmo com a manutenção da Licença Ambiental Especial na MP, Lula vetou o dispositivo que estabelecia um procedimento monofásico, que autorizaria a expedição de todas as licenças ao mesmo tempo. Conforme Rogério Marinho, os técnicos do governo avaliaram que isso traria um alto custo para os empreendedores, que teriam que providenciar todos os estudos, podendo, ao final nem ter o empreendimento autorizado, além de gerar insegurança jurídica. Com o veto, volta a necessidade do modelo trifásico do licenciamento.

Foram vetados, ainda, dispositivos que transferiam de forma ampla a cada ente federado, sem padronização, a responsabilidade por estabelecer critérios e procedimentos de licenciamento – como porte, potencial poluidor, tipologias sujeitas a licenciamento, modalidades específicas de licenças e atividades passíveis de LAC. O veto assegura que os entes federativos respeitem padrões nacionais de critérios e procedimentos.

O conjunto de vetos manteve as responsabilidades de instituições financeiras na concessão de crédito, ao vetar o dispositivo que enfraquecia a responsabilidade delas em casos de danos ambientais de projetos por elas financiados. O novo PL do governo estabelece que o financiador deve exigir do empreendedor o licenciamento ambiental antes de conceder crédito.

Leia mais: Ibama quer pelo menos 40 vetos a PL que flexibiliza licenciamento
Editado por Jadson Lima

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