Militar ligado ao AM propôs caos para forçar Estado de Sítio, diz Cid


Por: Jadson Lima

19 de fevereiro de 2025
O tenente-coronel do Exército Brasileiro (EB) Hélio Ferreira Lima ficou encarregado em trazer ambiente de caos, diz Cid (Composição Paulo Dutra/CENARIUM)
O tenente-coronel do Exército Brasileiro (EB) Hélio Ferreira Lima ficou encarregado em trazer ambiente de caos, diz Cid (Composição Paulo Dutra/CENARIUM)

MANAUS (AM) – O tenente-coronel do Exército Brasileiro (EB) Hélio Ferreira Lima, se encontrou pessoalmente com o então ajudante de ordens de Jair Bolsonaro (PL), Mauro Cid, entre os dias 9 e 11 de novembro de 2022, com a proposta de instaurar o caos no País para forçar a decretação de Estado de Defesa ou Estado de Sítio. Os detalhes dessa informação estão nos documentos que a CENARIUM teve acesso e foram revelados nesta terça-feira, 19, após o ministro do STF Alexandre de Moraes levantar o sigilo da colaboração premiada do militar.

Hélio Ferreira Lima foi denunciado nessa segunda-feira, 18, pela Procuradoria Geral da República (PGR) por participação na trama para manter Jair Bolsonaro (PL) no poder, após a derrota do então presidente nas eleições de outubro de 2022. Além do militar, outros integrantes das Forças Armadas e Bolsonaro foram implicados pelo Ministério Público Federal (MPF).

Alexandre de Moraes levantou o sigilo da colaboração premiada de Mauro Cid (Reprodução)

O encontro dos militares ocorreu no Hotel de Trânsito de Oficiais de Goiânia durante a noite. Em depoimento prestado no dia 21 de novembro de 2024, o tenente-coronel Mauro Cid menciona que foi procurado pelos também tenentes-coronéis Hélio Ferreira Lima e Rafael de Oliveira, e consta que eles teriam demostrado “indignação com o resultado das eleições e que algo precisaria ser feito”, como uma mobilização de massa que pudesse instaurar um caos institucional. O militar estava na capital de Goiás porque iria assumir o comando das Tropas de Forças Especiais, com sede na cidade.

“Eles expressavam a indignação com o que estava acontecendo no País, que alguma coisa tinha que ser feita, [porque] tinha uma mobilização de massa muito grande, que o Exército tinha que fazer alguma coisa […] e que eles estavam propostos a fazer alguma ação que gerasse alguma mobilização de massa, né, que pudesse causar um caos institucional”, disse Mauro Cid em um trecho da delação.

A informação da delação de Cid se confirma com a multidão de pessoas que se mobilizaram em frente ao Comando Militar da Amazônia (CMA), Zona Oeste de Manaus, após as eleições de 2022, quando o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) foi eleito presidente da República. Na época, a multidão fechou as ruas e trouxe transtornos aos moradores das redondezas por conta do alto volume de sons automotivos.

Mauro Cid disse que encontrou militares em 12 de novembro de 2022 (Lula Marques/Agência Brasil)

A primeira discussão presencial dos três militares para encontrar formas de reverter o resultado da eleição que elegeu Luiz Inácio Lula da Silva (PT) foi registrada dias antes de um outro encontro, que ocorreu na residência do general Walter Braga Netto, em 12 de novembro de 2022, em Brasília. A reunião na casa do candidato a vice-presidente derrotado foi sugerida pelos militares, porque, segundo os “kids pretos”, era ele quem mantinha a interlocução entre os manifestantes acampados na frente dos quartéis e Jair Bolsonaro.

“O colaborador [Mauro Cid] entrou em contato com o general Braga Netto, agendando uma reunião. Na reunião se discutiu novamente a necessidade de ações que mobilizassem as massas populares e gerassem caos social, permitindo, assim, que o Presidente assinasse o estado de defesa, estado de sítio ou algo semelhante”, diz trecho do depoimento. Veja:

Mauro Cid prestou depoimento ao ministro Alexandre de Moraes em 21 de novembro de 2024 (Reprodução)

A Procuradoria Geral da República (PGR) apontou no oferecimento da denúncia contra os militares, que a reunião na casa de Braga Netto tinha o objetivo de discutir as ações clandestinas para neutralizar o ministro Alexandre de Moraes, conforme estava previsto no plano “Punhal Verde Amarelo”. O depoimento de Mauro Cid também destacou que encontro discutiu formas de promover uma ação de forte impacto social, para justificar a assinatura de um decreto por Jair Bolsonaro.

“E aí a conversa foi nesse nível: nós temos que fazer alguma coisa para que haja uma mobilização de massa, que haja alguma ação que tenha repercussão, que faça que o Exército tenha que fazer uma coisa, tenha que decretar um estado de sítio, os generais entendam a necessidade, que o presidente aceite assinar alguma coisa ou não, né?”, disse Cid ao ministro Alexandre de Moraes.

Quem é Ferreira Lima

Preso preventivamente desde 21 de novembro do ano passado, o tenente-coronel Helio Ferreira Lima é um dos “kids pretos”, militares que são são treinados para ações de sabotagem e insurgência popular, conhecidas como “operações de guerra irregular”. A carreira militar dele incluiu o comando da 3ª Companhia de Forças Especiais do Comando Militar da Amazônia (CMA), unidade com sede em Manaus. Ele assumiu a chefia em 19 de dezembro de 2023, um ano após as discussões que visavam romper com a ordem democrática.

Ele foi afastado da função em fevereiro de 2024, por determinação do STF, no âmbito da operação Tempus Veritatis, da qual o militar também foi alvo de busca e apreensão. Cerca de nove meses depois, em novembro do mesmo ano, Helio Ferreira Lima foi preso preventivamente depois que as investigações encontraram elementos robustos que indicavam a participação do militar na trama para reverter o resultado da eleição.

Monitoramento ilegal

A decisão do ministro Alexandre de Moraes, em novembro do ano passado, revelou uma “cronologia as atividades identificadas”, na qual o próprio magistrado foi monitorado, segundo a PF. A investigação policial apontou que os levantamentos iniciais em “‘pontos de interesse’, relacionados ao ministro do STF Alexandre de Moraes” pode “ter contado com levantamentos realizados por Hélio Ferreira Lima e Rafael Martins de Oliveira”.

O magistrado era alvo um dos alvos do plano que previa a execução dele “com uso de artefato explosivo ou por envenenamento ou por envenenamento em evento oficial público”. “[O investigado] possui indícios de que teria participado, de atividades relacionadas ao monitoramento para prisão/execução do ministro Alexandre de Moraes no mês de novembro de 2022”, diz a decisão que ordenou a prisão de Hélio Ferreira Lima. Veja:

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Editado por Izaías Godinho

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