Mineração ilegal avançou 625% em TIs da Amazônia na última década
Por: Ana Cláudia Leocádio
31 de maio de 2025
BRASÍLIA (DF) – As áreas de mineração ilegal em Terras Indígenas (TIs) em toda a região amazônica, incluindo Brasil, Venezuela, Colômbia, Equador, Peru e Bolívia, registraram um aumento de 625% nos últimos dez anos. Os dados constam em uma série de estudos conduzidos pelo Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (Unodc), divulgados nesta semana. O levantamento também indica que dois terços do ouro extraído na Bacia do Tapajós, no Pará, são de origem ilegal.
Em outro estudo intitulado “Crimes Minerais: Mineração Ilegal de Ouro”, divulgado na última quarta-feira, 28, o Unodoc constata que a corrida pelo ouro atrai cada vez mais os grupos criminosos e ameaça a Amazônia, além de intensificar o tráfico de pessoas para dar suporte a esta cadeia ilegal e servir para a lavagem de dinheiro para o tráfico de drogas.
“Por exemplo, um relatório do Unodoc de 2023, sobre o tráfico de drogas na Amazônia, destaca que as organizações do narcotráfico estão diversificando suas atividades, usando suas habilidades técnicas e redes para comercializar e transportar outras matérias-primas, incluindo metais (preciosos) e minerais”, destaca o estudo.

A agência da ONU apontou que, na região amazônica, os povos indígenas também são afetados pela poluição causada pela fumaça dos incêndios florestais em suas terras, o que pode estar parcialmente ligado à mineração ilegal.
Em relação à Bacia do Rio Tapajós, no Estado do Pará, estudos de 2023, em parceria com instituições de pesquisa no Brasil e nos Estados Unidos, examinaram atividades de mineração de ouro em pequena escala nessa região da Amazônia, que abriga diversas espécies e áreas protegidas.
Além de constatar que dois terços do ouro explorado no Tapajós tem origem ilegal, a mineração é facilitada por mecanismos complexos de lavagem de dinheiro e leva a uma grave destruição socioambiental.

“No setor de mineração ilegal, especialmente na mineração de ouro, foram documentadas fortes ligações entre a mineração ilegal e outras atividades criminosas, como tráfico de pessoas, violações de direitos humanos, crimes financeiros, tráfico de drogas e crimes que afetam o meio ambiente”, diz trecho do estudo.
Os autores citam que, em 2022, a Polícia Federal (PF) lançou três operações (Ganância, Ganância Dourada e Comando) com foco no combate à mineração ilegal de ouro e outros crimes associados, como corrupção, lavagem de dinheiro e crime organizado.
“A investigação revelou que um grupo criminoso havia criado sua própria criptomoeda para lavar dinheiro de operações ilegais de mineração de ouro, demonstrando a evolução dos métodos técnicos usados para ocultar lucros. Além disso, a operação revelou graves danos ambientais causados pela mineração ilegal. Essas investigações resultaram em múltiplas prisões, apreensões de ativos e bloqueio de contas vinculadas ao grupo”, revela o documento.
A pesquisa também destaca a convergência de outros crimes com a mineração ilegal de ouro, como crimes que afetam o meio ambiente e crimes contra os direitos dos povos indígenas, envolvendo invasão de Unidades de Conservação e TIs.
Tráfico de pessoas
Outro quadro identificado no estudo é a mobilização para abastecer a cadeia de mineração ilegal de mão de obra, que resulta no crime de tráfico de pessoas. Com base em mais de 800 entrevistas com garimpeiros, no início de 2023, foi constatado que 40% deles são vítimas potenciais de tráfico para trabalho forçado.

“Entre os trabalhadores, 44% relataram recrutamento fraudulento e más condições de trabalho, com média de 12,5 horas por dia e 6,5 dias por semana. Problemas de saúde são generalizados, com 71% sofrendo de condições como ansiedade e depressão, e 44% tendo sofrido acidentes graves”, ressalta trecho do estudo. A maioria desconhece seus direitos trabalhistas e humanos.
Outra situação alarmante envolve as mulheres, segundo o estudo, porque há um tráfico significativo de mulheres e meninas para exploração sexual, juntamente com relatos de violência sexual e de gênero. “Mortes violentas também aumentaram nos últimos anos. Além disso, há uma interseção notável entre a mineração ilegal de ouro e o tráfico de drogas, evidenciada pelo uso compartilhado de pistas e pontos de abastecimento privados e operações de lavagem de dinheiro”, revela o Unodoc.
Fiscalização deficiente
De acordo com o estudo, a expansão da mineração ilegal é frequentemente impulsionada pela deficiência na fiscalização por parte dos governos em regiões ricas em metais e minerais. “Em áreas como a Amazônia, muitos locais de mineração são remotos e de difícil acesso, tornando difícil para os governos manter uma fiscalização eficaz e, portanto, permitindo que grupos criminosos assumam o controle”, constata a pesquisa.
O Unodoc aponta a América do Sul como um ponto crítico para a mineração ilegal, principalmente do ouro. O continente é rico em depósitos de lítio, cobre, prata e ouro, com o ouro de aluvião sendo amplamente distribuído na Amazônia. Em 2016, a estimativa era de que, entre 28% e 90% do ouro produzido em algumas áreas da América do Sul, era proveniente da mineração ilegal.
Rede de apoio
Conforme o estudo, as operações de mineração ilegal necessitam de uma rede de apoio que envolve maquinário pesado (retroescavadeiras, bicos de jato, dragas, balsas), combustível e, em alguns casos, substâncias tóxicas, como mercúrio e cianeto.
“O mercúrio representa sérios riscos aos trabalhadores, ao meio ambiente local e às comunidades cujos meios de subsistência dependem de recursos naturais”, destaca o estudo, que cita como “a mineração ilegal incessante na Amazônia viola o direito dos Yanomami à vida porque suas vidas, cultura e religião estão intrinsicamente ligadas à Amazônia e seus recursos naturais”.