Moraes aponta atuação de Bolsonaro e Eduardo para atacar soberania e Judiciário
Por: Ana Cláudia Leocádio
18 de julho de 2025
BRASÍLIA (DF) – Na decisão de 47 páginas, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes afirma que as provas indicam que o ex-presidente Jair Bolsonaro, aliado ao filho, deputado federal Eduardo Bolsonaro, estão atuando em conjunto nos atentados à soberania nacional com o objetivo claro de inferir no curso da ação penal, que julga o ex-mandatário por tentativa de golpe de Estado e outros quatro crimes. Além disso, a Procuradoria-Geral da República (PGR) pediu medidas cautelares contra Bolsonaro, para “assegurar a aplicação da lei penal e evitar a fuga do réu”.

A Polícia Federal (PF) cumpriu, nesta sexta-feira, 20, uma decisão de Moraes, que determinou mandados de busca e apreensão contra o ex-presidente e na sede do Partido Liberal (PL), em Brasília, assim como seis medidas cautelares, entre elas o uso de tornozeleira eletrônica, recolhimento em casa das 19h às 6h e durante todo o fim de semana e proibição de contato com diplomatas e aproximação a embaixadas.
As determinações fazem parte do Inquérito Policial 4995/2025, instaurado dia 25 de maio deste ano, a pedido da PGR, para apurar a conduta de Eduardo Bolsonaro pelos crimes de coação no curso do processo, previsto no Art. 344 do Código Penal; obstrução de investigação de infração penal que envolva organização criminosa, baseada no Art. 2º, § 1 º, da Lei 12.850/13; e abolição violenta do Estado Democrático de Direito, segundo o Art. 359-L do Código Penal.
No dia 18 de março deste ano, Eduardo Bolsonaro anunciou que se mudou para os Estados Unidos (EUA) e pediu licença do mandato de deputado federal. Na época, ele declarou que ficaria nos EUA para se dedicar em tempo integral a convencer o governo Donald Trump a atuar pela anistia aos envolvidos nos ataques do 8 de janeiro no Brasil e para obter sanções ao ministro Alexandre de Moraes, relator do processo sobre golpe de Estado, no qual o pai é réu.
Segundo despacho de Moraes, no pedido para instauração do inquérito, a PGR sustenta que Eduardo Bolsonaro, desde o início de 2025, vem reiteradamente e publicamente se dedicando a buscar, nos Estados Unidos, a imposição de sanções contra integrantes do STF, da própria PGR e da PF, alegando perseguição política a ele e ao pai, por causa da Ação Penal 2668, que está em fase das alegações finais.
“Essa é a ação penal em que o pai do sr. Eduardo Bolsonaro, foi denunciado como líder de organização criminosa concatenada para atentar contra o Estado de Direito, o regime democrático e o funcionamento dos Poderes”, reproduz Moraes, um trecho do pedido da PGR.

Ainda segundo a PGR, as manifestações têm se intensificado na medida em que o processo avança em seus trâmites e utiliza como prova as publicações nas redes sociais, tanto de Bolsonaro quanto do filho, que mostram a evolução das ameaças e a comemoração quando o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, anunciou as sanções ao Brasil, com a taxação de 50% sobre os produtos brasileiros.
“As graves condutas ilícitas demonstram que JAIR MESSIAS BOLSONARO está atuando em conjunto com seu filho EDUARDO NANTES BOLSONARO nos atentados à Soberania Nacional, com o objetivo claro de interferir no curso de processos judiciais, desestabilizar a economia do Brasil e pressionar o Poder Judiciário, notadamente o SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, através de imposição de sanções em face de autoridades públicas brasileiras”, afirma Moraes na decisão.

Financiamento a Eduardo
A ajuda financeira de R$ 2 milhões a Eduardo, já reveladas por Bolsonaro, segundo Moraes, é outra prova de que ambos estão unidos nesse objetivo de sancionar o Brasil e suas autoridades, em troca da anistia para o pai. Outro indício do objetivo de Eduardo, é o aumento de publicações em inglês para alcançar o público estadunidense também.
Ainda de acordo com Moraes, Eduardo “atuou junto ao governo americano para impor sanções ao Brasil, a fim de gerar instabilidade política e econômica. Por conseguinte, o encerramento da mencionada ação penal beneficiaria diretamente seu genitor e financiador”.
“As ações de JAIR MESSIAS BOLSONARO demonstram que o réu está atuando dolosa e conscientemente de forma ilícita, conjuntamente com o seu filho, EDUARDO NANTES BOLSONARO, com a finalidade de tentar submeter o funcionamento do Supremo Tribunal Federal ao crivo de outro Estado estrangeiro, por meio de atos hostis derivados de negociações espúrias e criminosas com patente obstrução à Justiça e clara finalidade de coagir essa CORTE no julgamento da AP 2.668/DF”, afirma o ministro.
Moraes também escreve que, no dia 6 de maio deste ano, o ex-presidente teve um e encontro com o conselheiro sênior da Embaixada dos Estados Unidos para o Hemisfério Ocidental, Ricardo Pita, cujo teor da conversa foi reservado. “Posteriormente, no dia 9/7/2025, houve a publicação da CARTA/MENSAGEM do Presidente norte-americano atentatória à Soberania Nacional e com claras e expressas ameaças ao Poder Judiciário brasileiro”, pontuou.
Diante das publicações de Eduardo, reconhecendo o sucesso de suas articulações junto aos EUA com o anúncio das sanções, e da mensagem postada por Bolsonaro, no dia, Moraes afirma que não resta dúvidas sobre a atuação de ambos.
“As condutas de EDUARDO NANTES BOLSONARO e JAIR MESSIAS BOLSONARO caracterizam CLAROS e EXPRESSOS ATOS EXECUTÓRIOS e FLAGRANTES CONFISSÕES DA PRÁTICA DOS ATOS CRIMINOSOS, em especial dos crimes de coação no curso do processo (…) e permanecem, sempre no sentido de induzirem, instigarem e auxiliarem governo estrangeiro a prática de atos hostis ao Brasil e à ostensiva tentativa submissão do funcionamento do Supremo Tribunal Federal aos Estados Unidos da América, com a finalidade de ‘arquivamento/extinção’ da AP 2668, em curso nessa SUPREMA CORTE e cujo um dos corréus é JAIR MESSIAS BOLSONARO”, sublinhou o ministro.
‘Ousadia criminosa’ nas redes sociais
O ministro Alexandre de Moraes chama de “ousadia criminosa” parece não ter limites, diante das “diversas postagens nas redes sociais e declarações na imprensa atentatórias à soberania nacional e à independência do Judiciário”, e citou a entrevista concedida por Jair Bolsonaro, na última quinta-feira, 17, na saída do Senado, na qual se colocava a favor da anistia em favor da suspensão das sanções.
“[…] em entrevista coletiva, sem qualquer respeito à Soberania Nacional do Povo brasileiro, à Constituição Federal e à independência do Poder Judiciário, expressamente, confessou sua consciente e voluntária atuação criminosa na extorsão que se pretende contra a Justiça brasileira, CONDICIONANDO O FIM DA “TAXAÇÃO/SANÇÃO” À SUA PRÓPRIA ANISTIA”, destaca Moraes.
Para o ministro, não há qualquer dúvida sobre a materialidade e autoria dos delitos praticados por Bolsonaro no curso do processo que responde no STF, em atuação conjunta com o filho, condicionando a anistia ao fim da taxação de Trump, “com o intuito de conseguir o término das agressões realizadas ao Brasil por meio de medidas econômicas e impedir que as autoridades judiciais, ministeriais e policiais brasileiras sejam apenadas pelo Executivo norte-americano”.
Os pedidos de busca e apreensão foram solicitados pela PF, segundo Moraes, como medida para aprofundar a apuração, para coletar “elementos contemporâneos aos fatos apurados, capazes de reforçar o elo subjetivo Bolsonaro e Eduardo”.
Defesa da Soberania
Antes de determinar as medidas cautelares e busca e apreensão, Alexandre de Moraes ainda ressaltou o papel do STF na defesa da soberania e disse que a “independência judicial, constitui um direito fundamental dos cidadãos, inclusive o direito à todos de uma tutela judicial efetiva e ao processo e julgamento por um Tribunal independente e imparcial”.
“É um PRINCÍPIO INFLEXÍVEL da Constituição brasileira a independência do Poder Judiciário em defesa da Constituição brasileira, e a história desse SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL demonstra que jamais faltou coragem aos seus membros para repudiar as agressões contra os inimigos da Soberania nacional, Democracia e Estado de Direito, sejam inimigos nacionais, sejam inimigos estrangeiros”, reiterou.
Confira as determinações contra Jair Bolsonaro:
1) Proibição de ausentar-se da comarca com uso de tornozeleira eletrônica e recolhimento domiciliar no período noturno, a partir das 19h até as 6h de segunda a sexta feiras e integral nos fins de semana, feriados e dias de folga;
2) Proibição de aproximação e acesso a locais sedes das Embaixadas e Consulados de países estrangeiros;
3) Proibição de manter contatos com embaixadores ou quaisquer autoridades estrangeiras, bem como com os demais réus e investigados das Ações Penais 2.668/DF, AP 2.693/DF, AP 2.694/DF, AP 2.695/DF, Inq. 4.995/DF e Pet 12.100/DF, inclusive por intermédio de terceiros;
4) Proibição de utilização de redes sociais, diretamente ou por intermédio de terceiros;
5) A busca e apreensão domiciliar de aparelhos de telefone celular, computadores, tablets, mídias de armazenamento, documentos, além de valores em espécie, em reais ou moeda estrangeira, de valor igual ou superior a dez mil reais;
6) A busca e apreensão pessoal, inclusive para que, caso não se encontrem no local da realização da busca, proceda-se à apreensão de telefone celular, computadores, tablets, mídias de armazenamento, documentos, além de valores em espécie, em reais ou moeda estrangeira, de valor igual ou superior a dez mil reais, entre outros elementos que permitam esclarecer o esquema criminoso, bem como a busca em quartos de hotéis e outras hospedagens temporárias onde o investigado tenha se instalado, caso esteja ausente de sua residência.
Leia a íntegra da decisão: