MPF investiga uso de ‘Kit Covid’ em população indígena do Amazonas

Na sede do MPF, em Manaus, iniciou-se a apuração sobre o uso ilegal da cloroquina no Amazonas (Reprodução/Internet)
Ana Carolina Barbosa e Paula Litaiff – Da Revista Cenarium

Irregularidades associadas ao uso indiscriminado de medicamentos sem eficácia comprovada para o combate à Covid-19, a exemplo da hidroxicloroquina, por índios que habitam aldeias situadas no Amazonas, estão sendo investigadas pelo Ministério Público Federal (MPF), por meio de inquérito civil instaurado via portaria nº 8, de 14 de maio de 2021.

O resumo do documento foi publicado na última sexta-feira, 21, no diário eletrônico do órgão, e tomou como base, entre as considerações, o estímulo de órgãos do governo federal ao uso das drogas, bem como, os estudos que apontaram para a ineficácia das mesmas.

O inquérito, assinado pelo procurador da República, Fernando Merloto Soave, estipula um prazo de 15 dias para que os DSEIs (Distritos Sanitários Especiais Indígenas) apresentem cópia dos relatórios ou espelhos do sistema Hórus ou do sistema utilizado para gestão farmacêutica, referentes ao período de abril de 2020 a abril de 2021.

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Além disso, determinou o envio de cópia do inquérito a entidades como Apib (Associação dos Povos Indígenas do Brasil), Coiab (Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira), Foirn (Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro), Focimp (Federação das Organizações e Comunidades Indígenas do Médio Purus) e associações representativas dos povos indígenas do Amazonas, para que apresentem informações sobre possíveis relatos e casos de uso de cloroquina e medicamentos do “kit covid” em comunidades indígenas por prescrição ou fornecimento dos DSEIs.

Embasamento

O MPF também citou, entre as considerações, a declaração emitida em 11 de março de 2020, pela Organização Mundial da Saúde (OMS), de situação de pandemia em razão da rápida disseminação geográfica do novo coronavírus (Sars-Cov-2), reconhecida pelo Ministério da Saúde como Emergência de Saúde Pública de Importância Internacional em 3 de fevereiro de 2020, por meio da Portaria MS nº. 188/2020.

O posicionamento da Sociedade Brasileira de Infectologia sobre o uso do Kit Covid no caso de infecção pelo coronavírus também foi usado como justificativa para o inquérito. Segundo a entidade, “a hidroxicloroquina pode inibir o Sars-CoV-2, vírus causador da Covid- 19, in vitro, ou seja, estudos feitos em laboratório, não em seres humanos. Até o presente momento, não há evidências científicas de que a hidroxicloroquina seja eficaz e segura nem na prevenção nem no tratamento de pacientes com a doença”.

Além disso, em 17 de junho de 2020, a OMS anunciou que o braço de hidroxicloroquina do Estudo Solidarity, que buscava encontrar um tratamento eficaz para Covid-19, foi interrompido diante da ineficácia do medicamento, comprovada também, a partir do estudo A living Who guideline on drugs to prevent Covid-19, publicado no dia 2 de março deste ano, no qual 32 pesquisadores vinculados à OMS e pertencentes a instituições de ensino e pesquisa do mundo inteiro, chegaram a mesma conclusão. O estudo também alertou para os efeitos colaterais decorrentes da utilização da droga de forma indiscriminada.

Há, ainda, evidências científicas e observações de profissionais da saúde que apontam para o incremento do risco de morte causado pelo uso dos medicamentos indicados no “kit covid”, notadamente a hidroxicloroquina.

A distribuição de mais de 60 mil comprimidos dos medicamentos do kit a índios de Roraima, Estado vizinho ao Amazonas, pelo MS, também levantou a suspeita de que há a necessidade de se aprofundar a investigação no Estado. O fato virou objeto de investigação da CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito da Pandemia), instaurada pelo Senado Federal, em abril deste ano, para investigar possíveis irregularidades na gestão da pandemia no âmbito do governo federal.

Veja o documento abaixo:

Prefeitura de Manaus

O prefeito de Manaus, David Almeida (Avante), também, deve ser alvo de investigação no âmbito da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Pandemia no Congresso Nacional após orientar os médicos a fazerem “tratamento precoce” para combater o novo coronavírus nas Unidades Básicas de Saúde (UBSs) na capital amazonense.

Em janeiro deste ano, no ápice do segundo pico da Covid-19 em Manaus, David Almeida, que se autodenomina evangélico e com 13 dias no cargo, confirmou, em entrevista à CNN Brasil, faz citação do procedimento, condenado pela Organização Mundial de Saúde (OMS).

“Estamos oferecendo à população da cidade de Manaus a informação que nos passaram de que, quando a pessoa sentir os primeiros sintomas, procure logo uma Unidade Básica de Saúde para que possa iniciar o tratamento de forma precoce”, declarou no vídeo.

E continuou a defesa de medicamentos para prevenir e combater a Covid-19, sem explicar a origem científica, prometendo ainda a sua “distribuição”. “Nós temos as medicações receitadas pelos médicos e esse tratamento é exatamente para que a doença não agrave. Porém, nós temos profiláticos e também vamos estar indicando a prescrição médica nos próximos dias e fazendo a distribuição”, afirmou.

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