‘Muita força para vocês’, diz Boulos em apoio à ocupação na Seduc-PA
Por: Jadson Lima
23 de janeiro de 2025
MANAUS (AM) – O deputado federal Guilherme Boulos (Psol-SP) prestou solidariedade, em vídeo publicado nesta quinta-feira, 23, ao movimento indígena de diferentes etnias que ocupa parte da sede da Secretaria de Educação do Pará (Seduc-PA) desde o dia 14 de janeiro deste ano. A ocupação ocorre após mudanças no sistema de educação do Estado, por meio da Lei 10.820/2024, sancionada pelo governador Helder Barbalho (MDB).
“Quero deixar a minha solidariedade ao movimento indígena que ocupa a Secretaria de Educação do Pará contra a Lei 10.820/2024, que ataca os direitos da educação indígena [em todo o Estado do Pará], e também de uma forma geral a educação no campo e na cidade. É muito importante essa luta, muita força para vocês”, disse Boulos.
A declaração foi repercutida pela deputada estadual Lívia Duarte (Psol-PA), em suas redes sociais, um dia após o governo de Barbalho conseguir na Justiça Federal uma decisão, na qual ordena a retirada dos ocupantes indígenas das instalações administrativas da pasta. Nessa quarta-feira, 22, a juíza Lucyana Said Daibes Pereira determinou que os ocupantes podem permanecer em outros locais na sede da Seduc-PA, desde que não dificultem o acesso dos servidores ao prédio.
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No vídeo, o deputado federal Guilherme Boulos também manifestou solidariedade à parlamentar Lívia Duarte que, segundo ele, é a única deputada estadual que “tem ido lá [no local da ocupação] fazer o enfrentamento para poder apoiar os indígenas”. “[Ela] tem sofrido com isso, todo tipo de ataque, ameaça e fake news. Estamos contigo, muita força para você. Não recue. E todo apoio à luta dos povos indígenas”, concluiu.
Ocupação
Os indígenas realizam o protesto na sede da Seduc-PA contra a Lei 10.820/2024, sancionada pelo governador Helder Barbalho, após aprovação pela Assembleia Legislativa do Pará (Alepa) do Projeto de Lei (PL) 729/2024 da Nova Carreira do Magistério, elaborado pela pasta da educação. A nova legislação alterou a estrutura do Sistema de Organização Modular de Ensino (Some), criado na década de 1980 para levar educação à comunidades remotas, como ribeirinhas, quilombolas e indígenas.

Um dos pontos mais polêmicos da lei sancionada por Barbalho é a revogação da legislação que regulava o Some e sua modalidade voltada para comunidades indígenas (Somei), que transferiu a gestão do sistema para a Seduc-PA, submetendo o sistema a condições de trabalho a portarias. Entre as alterações mais contestadas está a criação de níveis de complexidade que definem os valores das gratificações recebidas pelos professores.
Parlamentar criticou governador
Em entrevista à CENARIUM no dia 15 de janeiro, a deputada Lívia Duarte (Psol) criticou o governador paraense Helder Barbalho e o secretário de Educação do Pará, Rossieli Soares. Entre as principais críticas está a sanção do governador à Lei 10.820/2024, que extinguiu cinco dispositivos, entre eles, a lei que regulamentava o Some, transferindo a gestão integral para a Seduc e condicionando gratificações e incentivos a critérios administrativos.
“O que mais me revolta é a aprovação, de forma apressada, de uma lei que retira direitos de trabalhadores, alunos e comunidades. Essa lei reduz gratificações e incentivos para professores que se deslocam para áreas de difícil acesso, como aldeias indígenas. Isso desmotiva profissionais que precisam enfrentar grandes desafios para exercer sua função”.

Para a parlamentar do Psol, a nova legislação é uma tentativa velada de extinguir o Some, enfraquecendo o sistema com a redução de incentivos e salários. Ela declarou que os trabalhadores do Some frequentemente acabam gastando mais recursos do que recebem para acessar as comunidades. Além disso, destacou a elevada insatisfação em relação ao secretário Rossieli Soares, que tem demonstrado uma postura bastante autoritária, e que os movimentos sociais estão solicitando sua demissão.
Mudança de sistema
A CENARIUM foi o primeiro veículo de comunicação a noticiar, após receber uma denúncia anônima em novembro do ano passado, que o Sistema Modular de Ensino (Some), implementado na década de 1980, vinha sendo gradualmente substituído por uma “central de mídia”, que transmite aulas via satélite. Na época, os denunciantes informaram que a mudança desconsiderava a realidade de infraestrutura das comunidades atendidas, muitas das quais sofrem com fornecimento precário de energia elétrica e condições de vida desafiadoras.
O plano para substituir o Some, conforme a denúncia, consistia em manter os alunos em salas de aula acompanhados por um “professor mediador”, que iria assistir à transmissão de aulas gravadas pela Seduc-PA, com sede em Belém.
“Na localidade em que estou, na Vila Menino Deus (Igarapé-Miri), passamos vários dias sem energia elétrica […] é precário”, relatou o denunciante. Em decorrência da falta de luz, as aulas presenciais foram suspensas e os professores organizam atividades impressas para minimizar a perda de conteúdo. “Estamos usando nossos próprios recursos para imprimir atividades, que são distribuídas uma vez por semana, com os alunos atravessando o rio em embarcações para buscá-las”, explicou um dos denunciantes.

A denúncia também ressaltou a importância social do Some, que, em mais de 40 anos de funcionamento, formou profissionais locais que retornaram às comunidades como professores, enfermeiros e gestores. Para o denunciante, o modelo de ensino remoto proposto pelo governo desconsidera o impacto positivo gerado pelo contato direto entre alunos e professores, algo fundamental nas comunidades ribeirinhas e quilombolas atendidas pelo programa.
“A presença de um professor qualificado faz toda a diferença, especialmente para alunos de comunidades isoladas”, afirmou o denunciante. Ele destacou que muitos alunos oriundos do Some já ingressaram em universidades e contribuíram para melhorar as condições de suas famílias e localidades. Em contrapartida, o modelo de ensino por televisão é visto com descrédito. “O professor mediador que assistirá às aulas pela TV com os alunos é de uma disciplina aleatória e repassa dúvidas aos professores responsáveis pelo WhatsApp”, pontuou na época.