Mulheres e suas batalhas contra duas guerras: vírus e o feminicídio

Hoje o meu artigo falará novamente sobre um tema muito triste para mim, mas que é necessário que falemos nele, feminicídio. Nesse artigo vou focar na estrutura e não nas leis.

Com certeza, ao longo de sua vida, você já ouviu a expressão “o machismo mata”. Mas a verdade é que poucas vezes paramos e nos perguntamos o que está por trás da morte violenta de uma mulher. A violência do feminicídio é estrutural e não apenas individual ou patológica, pois o que move esse ódio é acima de tudo a manutenção da dominação masculina.

Essas mortes não são casos isolados ou episódicos, mas estão inseridas em uma cultura na qual a sociedade neutraliza e normaliza a violência de gênero, além de limitar o desenvolvimento livre e saudável de mulheres e meninas. O protagonismo do machismo é latente, paira sobre os homens um sentimento de posse sobre a mulher e seu corpo. Os efeitos são diversos. Além dos gravíssimos episódios de feminicídio, os reflexos são sentidos economicamente, no campo profissional, entre outros.

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A gente tenta entender o porquê de tanta crueldade contra as mulheres, podemos encontrar respostas em nossa cultura patriarcal e misógina, mas não devemos esquecer a negligência do Estado.

O Estado pode ser responsabilizado pelas vidas interrompidas sim. Fatores como a não efetivação dos direitos previstos nos marcos legais, não implementação de serviços de atendimento especializados, a aceitação e naturalização de hierarquias de gênero e raça e a banalização de uma série de violências anteriores pelas próprias instituições do Estado concorrem para a continuidade de violências que estão nas raízes do feminicídio.

Antigamente se falava dos crimes de honra, passionais, o comportamento da mulher era utilizado para justificar o comportamento abusivo e agressivo do homem. Hoje, a mulher tem uma gama de ações que antigamente não tinha, ela sai para trabalhar, tem mais espaço na sociedade. E, com isso, os homens não conseguem aceitar e acabam tendo atitudes que as punem por essa liberdade maior.

A palavra “feminicídio” se refere ao assassinato de mulheres e meninas por questões de gênero, ou seja, em função do menosprezo ou discriminação da condição feminina.

Feminicídio é a mais grave forma de violência contra a mulher, tendo esse termo sido usado pela primeira vez por Russell em 1976, com o objetivo de chamar atenção e retirar a invisibilidade de assassinato de mulheres.

Segundo levantamento realizado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, os casos de feminicídio aumentou em 22 por cento no país. O Estado onde a situação mais se agravou foi no Acre, com um crescimento de 300 por cento. No Pará teve um aumento de 100 por cento, mesmo com a violência em alta, o Tribunal de Justiça negou a renovação automática de medidas protetivas durante o isolamento social.

Quando vemos esses dados percebemos o quão é difícil ser mulher neste país e o quanto estamos abandonadas pelo Estado. Quando eu lembro da nossa representante na pasta da mulher no governo federal tenho um misto de revolta e vergonha. A senhora Damares, Ministra da Mulher, não tem capacidade técnica de ocupar esse posto e isso já foi mostrado. Não apresentou politicas públicas voltadas para a nossa classe, já chegou a afirmar que as meninas do Marajó era estupradas porque não usavam calcinhas, entre outras sandices que me nego a escrever. Isso é lamentável, estamos em quinto em taxa de feminicídio no mundo e somos o país na América Latina que mais mata mulheres. Colocar uma mulher desse nível pra nos representar só mostra o quanto temos um presidente misógino e que nos odeia. Ressalto que a cada 11 minutos uma mulher é estuprada no Brasil, mais de 500 sofrem agressões a cada hora e 13 mulheres são assassinadas por dia.

A violência doméstica está mais privada do que nunca. A mulher que vive com um agressor já vivia isolada, agora ela está praticamente em cárcere privado. Durante a crise sanitária muitas mulheres estão confinadas com o agressor, sem poder sair de casa e, além disso, muitas vezes em condições precárias e desempregadas.

Além disso, a nossa cultura, infelizmente, ainda se conforma com a discriminação da mulher por meio da prática, expressa ou velada, de misoginia. Isso causa a objetificação da mulher, resultando em casos cada vez mais graves de violência.

É importante que todos e todas nós possamos falar de gênero, pensar sobre as opressões de raça e classe. Assim como nós aprendemos por conta dessas estruturas que estão aí, a produzir práticas machistas, racistas e classistas, nós podemos também desaprender, para que a gente possa construir um mundo onde todas as pessoas possam viver com dignidade. É preciso que a gente fale de vida, ao invés de falar somente de morte.

Outra forma de propor mudança é incutir na sociedade o pensamento de que não há justificativa para os crimes de feminicídio. Os agressores não podem encontrar o apoio na sociedade para o que fizeram, porque não existe justificativa para agredir ou matar alguém. Não se muda a cultura de uma sociedade de um momento para outro. Mas a conscientização precisa ser difundida.

É importante e urgente que a sociedade, a escola e a igreja debatam sobre esses temas. A violência de gênero, típica da cultura patriarcalista, tem por base a divisão sexual do trabalho, que tolera que o homem use de violência para corrigir comportamentos femininos contrários aos papéis esperados de mulher submissa. A vítima é vista como culpada pela agressão que sofre por seu comportamento inadequado. A sociedade não pode mais tolerar esse tipo de coisa.

É urgente a efetivação de políticas públicas para as mulheres, a prevenção, debater machismo nas escolas, lutar contra o preconceito e todas as opressões raciais e sexuais para prevenir a violência de gênero. Ainda sonho com uma sociedade onde as mulheres viverão em paz e terão suas escolhas respeitadas e que não precisem morrer por isso

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(*)Regiane Pimentel é bacharel em direito, ativista social e feminista amazônida.

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