Mulheres negras enfrentam ‘duplo fardo’ da fome e da obesidade, diz estudo


Por: Fred Santana*

04 de novembro de 2025
Mulheres negras enfrentam ‘duplo fardo’ da fome e da obesidade, diz estudo
Entre as pessoas que vivem em insegurança alimentar, o estudo mostra que mulheres negras apresentaram 42% mais chance de obesidade (Gerado por IA | Composição: Paulo Dutra/CENARIUM)

MANAUS (AM) – As mulheres negras em situação de insegurança alimentar são o grupo mais exposto ao chamado duplo fardo da má nutrição – quando baixo peso e obesidade coexistem nos índices populacionais. A conclusão é de um estudo publicado na revista científica Food Security, assinado por pesquisadores das universidades federais da Paraíba (UFPB) e do Rio Grande do Norte (UFRN) e da Universidade de São Paulo (USP).

O levantamento utilizou dados de mais de 46 mil brasileiros participantes do Inquérito Nacional de Alimentação (INA), parte da Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF) 2017-2018, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Esses dados são os mais amplos disponíveis para entender a distribuição da má nutrição no País.

Entre as pessoas que vivem em insegurança alimentar, o estudo mostra que mulheres negras apresentaram 42% mais chance de obesidade e 41% mais chance de baixo peso em comparação a homens brancos em segurança alimentar, grupo de referência da pesquisa. Já as mulheres brancas em insegurança alimentar mostraram 40% mais chance de obesidade.

Esses dados são os mais amplos disponíveis para entender a distribuição da má nutrição no País (Reprodução/Agência Brasil)

Os resultados apontam que, entre pessoas negras com restrição de acesso à comida, a obesidade atinge 15,95% das mulheres e 10,84% dos homens.

O pesquisador Sávio Marcelino Gomes, da UFPB e autor principal do artigo, explica que o grupo decidiu aplicar uma abordagem interseccional – que analisa raça, gênero e condições sociais de forma combinada. “Em vez de estudar gênero, raça e insegurança alimentar separadamente, buscamos observar as nuances que essas características produzem juntas”, afirma Gomes.

Segundo ele, o objetivo foi revelar como desigualdades sociais e estruturais influenciam o acesso à alimentação adequada. “O que o nosso artigo traz é que essa sindemia afeta grupos de forma desproporcional. Portanto, qualquer medida deve considerar obrigatoriamente as desigualdades sociais, já que a exposição à má nutrição não é a mesma para todos”, destaca o pesquisador.

Sindemia global e impacto das desigualdades

O estudo se apoia na teoria da sindemia global, que analisa a interação entre obesidade, desnutrição e mudanças climáticas. Para os autores, as transformações ambientais e sociais intensificam vulnerabilidades já existentes, especialmente entre grupos marcados por racismo e desigualdade de gênero.

“As desigualdades sociais devem integrar os estudos sobre a sindemia global”, reforça Gomes. “A insegurança alimentar não atinge todos da mesma maneira; ela é atravessada por condições de gênero, raça e renda que moldam o tipo e o grau de impacto sobre cada grupo”, alerta.

Os pesquisadores argumentam que políticas públicas de combate à fome e à obesidade precisam ser integradas e desenhadas sob essa perspectiva interseccional. “Qualquer política que busque reduzir a má nutrição precisa entender que a fome e o excesso de peso não são fenômenos isolados”, completa o autor.

Novas frentes de pesquisa

O grupo pretende avançar na agenda interseccional para ampliar o retrato das desigualdades alimentares no Brasil. Um dos próximos estudos investigará a insegurança alimentar entre pessoas trans na Paraíba, apontando como a identidade de gênero também influencia o acesso à alimentação.

“O grupo está disponível para conversar com os gestores e produzir relatórios técnicos. A ideia é que essas informações circulem ativamente para informar o poder público e ajudar a traçar novos caminhos”, conclui Gomes.

Leia mais: Racismo digital cresce e têm mulheres negras como principais vítimas
(*) Com informações da Agência Bori
Editado por Jadson Lima

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