Mulheres negras são apenas 7% do total de magistrados no Judiciário brasileiro, segundo dados do CNJ

Karen Luise, juíza na 1ª Vara do Júri de Porto Alegre, formadora da Escola Nacional de Formação de Magistrados (Arquivo pessoal)

Com informações da Folhapress

SÃO PAULO – Mulheres negras são mais que minoria no Judiciário brasileiro. Elas são a menor parcela dentro de dois grupos minoritários: o das mulheres e o das pessoas pretas e pardas.

Em alguns espaços do Judiciário, nem isso. O STF (Supremo Tribunal Federal), criado em 1891 como órgão máximo da Justiça nacional, teve 3 ministros negros em toda a sua história. Também teve 3 ministras, das quais 2 integram a corte atualmente. Mas nunca teve uma mulher negra em sua composição.

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O tema ganha destaque porque o presidente dos EUA, Joe Biden, reafirmou recentemente sua promessa de indicar a primeira mulher negra para a Suprema Corte de seu país. De acordo com ele, já passou muito tempo sem que o tribunal tivesse alguém com esse perfil.

Karen Luise Souza Pinheiro, 52, única mulher negra entre juízes e juízas de Porto Alegre, lembra que, no Brasil, a questão entrou em pauta em governos anteriores, quando se abriram vagas no STF. “Mas, nos últimos tempos, embora existam bandeiras levantadas nesse sentido, parece que essa discussão se enfraqueceu bastante”, diz.

Titular da 1ª Vara do Júri de Porto Alegre, ela diz ser evidente a necessidade de problematizar a ausência de representatividade nos tribunais superiores. Segundo um estudo de 2021 do CNJ (Conselho Nacional de Justiça), há registro de apenas 1 mulher negra num total de 88 ministros e ministras dessas cortes.

“[Temos no Brasil] uma construção de política judiciária, de gestão e de jurisdição propriamente dita a partir de um olhar de homens brancos, na sua maioria”, afirma.

“Uma mulher negra no poder é sempre uma esperança de igualdade de gênero e raça. Uma mulher negra no STF, com representatividade crítica e argumentativa, será propulsora de igualdade racial”, diz Karen.

A desigualdade é grande no Judiciário. Numa sociedade com equilíbrio racial, a proporção de homens e mulheres na Justiça seria parecida com a proporção de homens e mulheres na população como um todo. A mesma coisa aconteceria com pessoas brancas e negras.

No caso do Brasil, isso significaria que, entre todos os magistrados, haveria um pouco mais de mulheres do que homens e um pouco mais de pessoas negras do que brancas.

De acordo com outra pesquisa do CNJ, a realidade é bem outra. Uma pesquisa sobre o perfil sociodemográfico dos magistrados brasileiros publicada em 2018 mostra que as mulheres são 38%, e os negros, 18%.

Na intersecção desses dois grupos, as mulheres negras são 7% do total de magistrados. Se houvesse alguma correspondência com seu peso populacional, essa fatia saltaria para perto de 29%.

Os dados do CNJ também indicam que a proporção de mulheres negras é ainda menor na segunda instância. Entre desembargadores e desembargadoras, responsáveis por julgar a maioria dos recursos judiciais, elas são apenas 2%.

As explicações para essa discrepância remontam ao legado da escravidão e passam por fatores como a falta de acesso à educação (que afeta negros mais do que brancos) e a jornada extra do trabalho doméstico (que afeta mais as mulheres do que os homens).

Nos tribunais superiores, porém, esses fatores não entram em jogo, porque as vagas são ocupadas por meio de indicação da Presidência da República.

“Aí existe um histórico de racismo que não [permite] ver mulheres negras como sujeitos de direito capazes de estarem nesses lugares. Embora sejam um espelho de parcela substancial da nossa sociedade, elas não são vistas como uma possibilidade de serem a Justiça encarnada”, afirma Karen.

O problema não está apenas nos tribunais. A juíza Adriana Cruz, 51, titular da 5ª Vara Federal Criminal do Rio de Janeiro, diz que o Judiciário reflete uma realidade presente em todos os segmentos da sociedade brasileira.

Adriana Cruz, juíza federal no Rio de Janeiro (Zo Guimaraes/Folhapress)

“Se for olhar o setor privado, a gente vai encontrar o mesmo desenho. Há uma ausência de mulheres negras em espaços de decisão, em espaços de poder, e uma sobrerrepresentação nos estratos mais baixos das carreiras.”

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