Na Hungria, Bolsonaro nega destruição da Amazônia e chama país de ‘pequeno grande irmão’

Bolsonaro com o premier Orbán, em Budapeste; brasileiro disse que ambos defendem 'Deus, pátria, família e liberdade' (Foto: BERNADETT SZABO / REUTERS)

Com informações do Infoglobo

BRASÍLIA – Em visita à Hungria nessa quinta-feira, 18, o presidente Jair Bolsonaro negou que haja destruição da Amazônia, mesmo com dados oficiais apontando o aumento do desmatamento da região durante seu governo. Ao lado do primeiro-ministro húngaro, Viktor Orbán, ele chamou o país europeu de “pequeno grande irmão” e destacou os “valores” que ambos compartilham. Orbán é um dos principais expoentes da direita ultranacionalista europeia, e seu governo corre o risco de sofrer punições da União Europeia (UE) por medidas que corroeram as instituições democráticas da Hungria.

Bolsonaro, que foi de Moscou diretamente para Budapeste, disse que ele e Orbán estão afinados em “praticamente todos os aspectos”, com a possibilidade de ampliação das relações comerciais entre os dois países.

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“É uma satisfação muito grande a gente estar na Hungria. Considero seu país o nosso pequeno grande irmão. Pequeno se consideramos nossas diferenças pelas extensões territoriais. E grande pelos valores que nós representamos, que podem ser resumidos em quatro palavras: Deus, pátria, família e liberdade. Comungamos também da defesa da família com muita ênfase. Uma família bem estruturada faz com que a sua respectiva sociedade seja sadia. E não devemos perder esse foco — disse Bolsonaro em declaração conjunta à imprensa.

Orbán aproveitou a oportunidade para voltar a falar de imigração, da qual é um notório opositor, e defendeu o que chamou de família tradicional.

“Eu gostaria de esclarecer que, em nível europeu, estamos pedindo que haja leis mais severas. No mundo, em qualquer âmbito, se fizerem algum documento sobre imigração que a gente não concorde, o Brasil vai nos ajudar a reagir e trabalharemos juntos. Os cristãos são a religião mais perseguida no mundo. Em primeiro lugar, a União Europeia faz muito pouca coisa para proteger o cristianismo, os [cristãos] que moram na África. Às minorias cristãs, nós vamos mandar ajuda”, disse Orbán, segundo a tradução feita pelo canal GloboNews.

O primeiro-ministro se referiu ao referendo convocado por seu partido, o Fidesz (União Cívica Húngara), em que os húngaros vão dizer se apoiam uma lei que rege a divulgação de conteúdos sexuais para menores de idade e que foi considerada homofóbica pela oposição e pela UE, mas que seu governo defende como uma medida de “proteção às crianças”.

“O mundo quer aprovar como família aquilo que a gente pensa que é família. A mãe que é mãe é uma mulher. O pai é homem. Isso tem a ver com a tradição, e gostaríamos de manter isso. É um país democrático. Por isso é um desafio, mas vai haver uma escolha para proteger as crianças”, disse.

Desde que chegou ao poder, em 2010, com ampla maioria parlamentar, Orbán adotou iniciativas que mudaram as leis eleitorais para beneficiar seu partido, reduziram a independência do Judiciário e discriminam a população LGBT+, incluindo a proibição do casamento homossexual. Ele, assim como o governo ultranacionalista da Polônia, está na mira da Comissão Europeia, que ameaça cortar fundos da UE para a Hungria em represália a violações do Estado de direito.

A cada dois anos, Orbán realiza em Budapeste uma Cúpula Demográfica, evento no qual promove medidas de incentivo à natalidade e apregoa os supostos riscos que a imigração representaria para a identidade cristã da Hungria. A ministra  da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, Damares Alves, esteve no evento em 2019. O premier enfrentará eleições gerais em 3 de abril, em que pela primeira vez a oposição se uniu em uma frente única. O referendo será realizado na mesma data.

Assim como o Brasil e a Rússia de Vladimir Putin, a Hungria pertence ao fórum chamado Consenso de Genebra, formado por iniciativa do ex-presidente americano Donald Trump, e do qual o atual presidente, Joe Biden, retirou os EUA. O grupo é formado por 36 países que se posicionam em fóruns internacionais contra resoluções e programas relacionados à saúde reprodutiva da mulher e aos direitos sexuais, alegando que eles abririam caminho para a descriminalização ou a legalização do aborto.

Bolsonaro nega destruição da Amazônia

Antes de Orbán, Bolsonaro se reuniu com o presidente da Hungria, János Áder, que pertence ao mesmo partido do premier, o Fidesz. Segundo o brasileiro, os dois conversaram sobre meio ambiente e Amazônia. Dados do Instituto de Pesquisas Espaciais (Inpe), divulgados em dezembro de 2021, mostraram, por exemplo, que o desmatamento na região atingiu em abril o pior índice para o mês já registrado na série histórica desde 2015. Na Hungria, Bolsonaro associou as críticas à política ambiental a uma tentativa de prejudicar o agronegócio brasileiro.

“Ele (Áder) focou muito mais na questão ambiental. Eu tive oportunidade de falar para ele o que representa a Amazônia para o Brasil e para o mundo. Muitas vezes as informações sobre essa região chegam fora do Brasil bastante distorcidas, como se fôssemos os grandes vilões no que se leva em conta a preservação da floresta e sua destruição, coisa que não existe. Preservamos 63% do nosso território. E não se encontra isso em praticamente nenhum outro país do mundo. Nos preocupamos até mesmo com o reflorestamento, coisa que não vejo nos países da Europa como um todo. Então essa desinformação passa para ataque à nossa economia, que vem em grande parte do agronegócio”, afirmou Bolsonaro.

Ao lado de Orbán, Bolsonaro comentou a passagem pela Rússia. O primeiro-ministro, que é próximo de Putin e esteve em Moscou na semana passada, destacou que a Hungria está tentando evitar uma guerra entre a Rússia e a Ucrânia, e afirmou que todos os esforços, inclusive do Brasil, são bem-vindos para evitar a guerra.

“Trocamos informações sobre a possibilidade ou não de uma guerra entre a Rússia e a Ucrânia. Passei a ele meu sentimento que tive sobre essa viagem, até pela coincidência de ainda estarmos em voo para Moscou quando parte das tropas russas foram desmobilizadas da fronteira. Entendemos, sendo coincidência ou não, ser um gesto de que a guerra não interessa a ninguém. Todos perdem com isso, em especial a vizinhança, que é uma preocupação de Orbán”, disse Bolsonaro.

Memes disseminados por grupos bolsonaristas na internet associam a visita de Bolsonaro às indicações de um recuo russo. Desde a semana passada, Putin, que sempre negou a intenção de invadir a Ucrânia, recebeu também a visita do presidente francês, Emmanual Macron, e do chanceler alemão, Olaf Scholz.

Aviões da Embraer

Orbán disse que há 2.500 alunos brasileiros estudando na Hungria com bolsas de estudo e destacou os laços comerciais e econômicos com o Brasil.

“Nós compramos dois aviões da Embraer, cargueiros. E vamos incluir no nosso Exército. E vamos ampliar nosso Exército com ajuda do Brasil. Vamos considerar o Brasil como um país amigo e como um parceiro comercial”, afirmou o primeiro-ministro.

Também foram assinados três memorando de entendimento entre os dois países, para cooperação em defesa, em gestão de recursos hídricos e saneamento, e em questões humanitárias.

Na visita à Hungria, Bolsonaro estava acompanhado do filho, o vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ), que participou de diversas agendas ao lado do pai na Rússia. Os ministros Carlos França (Relações Exteriores), Walter Braga Netto (Defesa), Augusto Heleno (Gabinete de Segurança Institucional) e Luiz Eduardo Ramos (Secretaria-Geral da Presidência) também integraram a comitiva.

A visita estava programada para 2020, mas foi adiada por causa da pandemia do coronavírus. A viagem havia sido planejada pelo ex-chanceler Ernesto Araújo, que deixou o governo no ano passado e passou a fazer críticas abertas a Bolsonaro. Desde a saída de Araújo do Itamaraty, a condução da política externa tem desagradado à militância conservadora.

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