Na Semana do Meio Ambiente, cacique Raoni é homenageado em 50 cidades brasileiras

Raoni atua desde meados dos anos 1950 pela defesa e respeito aos direitos de populações tradicionais do País, sendo o único indígena brasileiro já indicado ao Prêmio Nobel da Paz (Projeto Megafone/Divulgação)
Iury Lima – Da Revista Cenarium

VILHENA (RO) — Todas as capitais da Amazônia Legal e outros 41 municípios brasileiros amanheceram nesta quinta-feira, 2, com a imagem do cacique Raoni Metuktire estampada por muros e avenidas. A homenagem feita a uma das maiores lideranças indígenas do País, em vida, é promovida pelo Projeto Megafone, numa parceria entre 20 organizações da sociedade civil, além de pessoas físicas.

A iniciativa marca a semana em que o Dia Mundial do Meio Ambiente, celebrado em 5 de junho, completa 50 anos. A ideia é ‘raonizar’ as cidades, segundo a coordenadora do projeto, Jonaya de Castro. Por isso, os organizadores espalharam lambe-lambes de seis metros quadrados – cartazes populares, especialmente em grandes cidades -, com a imagem de Raoni, feitos pelos artivistas Matsi, neto do líder indígena, e Raul Zito. Eles usam a arte como forma de ativismo.

Já em Manaus, o grafiteiro Raiz Campos deu vida a um enorme mural, no Centro da cidade, inspirado no cacique. O evento conta, também, com projeções previstas para esta quinta-feira, em oito pontos de São Paulo, Recife, Tefé (AM) e Belo Horizonte.

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Mural inspirado em Raoni Metuktire, feito em Manaus pelo grafiteiro Raiz Campos (Projeto Megafone/Divulgação)

Raoni: exemplo vivo

Embora não se saiba ao certo a idade de Raoni, estima-se que ele tenha 91 anos. Ele atua desde muito jovem, a partir de meados dos anos 1950, pela defesa e respeito aos direitos de populações tradicionais do País, além de sustentar o título de ser o único indígena brasileiro já indicado ao Prêmio Nobel da Paz. 

“O objetivo dessa homenagem é mostrar o quanto agradecemos a trajetória e a luta do cacique Raoni pela proteção da mata, dos territórios tradicionais e, também, por ele ser essa figura de convite ao diálogo, por meio das ações de pacificação que geraram muita conversa, debate e atitudes positivas em torno da demarcação de Terras Indígenas, além de um pouco de paz nas florestas do Brasil”, explicou a coordenadora da ação, Jonaya de Castro, em entrevista à CENARIUM.

Para a coordenadora do projeto, Jonaya de Castro, homenagear Raoni é cumprir um papel cidadão (Reprodução/Acervo Pessoal)

Leia também: Raoni e Txai: duas gerações de luta pelos direitos dos povos indígenas e preservação das florestas

“Nós temos essa obrigação de fazer essa homenagem. Internacionalmente, ele é homenageado, por que razão não seria no Brasil? É uma ação de cidadania homenageá-lo e colocá-lo nos muros da cidade”, acrescentou, de Castro.

Jonaya destaca, também, o fato de que Raoni é uma grande inspiração para novas lideranças, como Txai Suruí e outros nomes do ativismo digital em prol do meio ambiente, mas pondera que o cacique deveria inspirar, em primeira escala, os agentes políticos do País. “Ele tinha que ser uma inspiração para os candidatos à Presidência da República, para os candidatos à Câmara Federal (…) a gente quer lideranças como o Raoni nos espaços de lotação de poder”, avaliou.

Identidade ‘amazônida’

Quem percorrer a Rua 10 de Julho, nesta quinta-feira (e pelos próximos dias), no Centro de Manaus, vai encontrar um magnífico grafite, feito pelas mãos de Raiz Campos. “Agora, Manaus está devidamente ‘Raonizada’ (…) Este mural buscou mostrar o Raoni de forma guerreira, utilizando o estilo ‘psicoamazônico’, que permite o uso de técnicas e a abundância de cores para representar a diversidade da mata e as medicinas sagradas da floresta”, escreveu o grafiteiro, ao postar o resultado do trabalho nas redes. 

Raiz Campos, autor do mural em homenagem ao cacique Raoni, em Manaus, diz esperar que a obra leve “boas vibrações, força e luz” ao líder indígena (Projeto Megafone/Divulgação)

Já a coordenadora da homenagem diz “esperar muito” que as pessoas reflitam ao encontrar as imagens espalhadas pelos centros urbanos. “Eu, por exemplo, olho e penso: ele podia ser meu avô. Ele lutou muito e a voz dele ecoa até hoje”, disse. 

Na visão de Jander Manauara, integrante da Associação Intercultural de Hip-Hop Urbanos da Amazônia (AIHHUAM), um dos coletivos participantes do projeto, a iniciativa tem o dever de romper barreiras.

“Tem gente que nem mora na Amazônia, mas se reconhece mais com ela do que muita gente que está aqui, a exemplo de quando a produção do mural estava em execução, aqui, em Manaus: várias pessoas paravam para nos questionar o motivo de um mural com a imagem de Raoni e não de uma ou outra representatividade tal. Então se vê que a Amazônia ainda é muito conservadora e está distante de se reconhecer (…) A luta de Raoni não fala só de uma etnia, fala de todos os povos originários e o que ele representa para todos eles”, declarou à CENARIUM.

A exposição de lambe-lambes pelo Brasil e o mural na capital manauara é, também, uma ótima oportunidade de imersão para quem ainda não conhece a trajetória de Raoni Metuktire.

“Entre os nossos lambe-lambes, tem o lambe grande, com seis metros quadrados, e o lambe menor, ao lado, contando a história dele [Raoni], contextualizando, inclusive, como foi quando ele conheceu os irmãos Villas Bôas, toda a parte de pacificação e diálogo que o líder indígena abriu com várias etnias, até chegar ao momento da  indicação ao Nobel da Paz”, ressaltou Jonaya.

Jander Manauara defende que o cacique Raoni representa não apenas uma etnia, mas todos os povos originários do Brasil (Reprodução/Acervo Pessoal/Instagram)

Artivismo

De Castro deixa claro: “a defesa da natureza e da dignidade de povos que dependem dela – todos nós -, se faz com as “armas” ao alcance”.

“As nossas ferramentas, enquanto coletivos urbanos, são ferramentas artísticas e culturais. Então, nós colamos lambe-lambes, fazemos grafites, projeções, montamos shows e festivais (…) Então, dentro das nossas possibilidades culturais e artísticas, vamos ocupar a cidade com ‘Raonis’ [assim mesmo, no plural], afirmou.  

“A partir do entendimento de mudanças climáticas e do aquecimento global, nós temos que proteger a Amazônia. Todos que estão no Brasil têm o dever de garantir isso. Fazemos lambe-lambes não só para homenagear o cacique, mas também porque estamos preocupados com a Amazônia. Porque queremos participar da defesa da floresta. Porque queremos continuar existindo no planeta. E, para isso, precisamos da floresta em pé”.  

Jonaya de Castro, coordenadora do projeto.
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