O apagamento das mulheres através da invisibilidade de suas ideias durante os séculos

Durante muitos séculos as mulheres foram impedidas de estudar. Me pergunto, que medo é esse que o mundo tinha de ver mulheres adquirindo os mesmos conhecimentos que os homens. Por que nos impediram do saber? A estruturação do poder masculino se deu pela apropriação ou usurpação do poder feminino, e isso foi naturalizado.

Muitas mulheres deixaram seus sonhos para trás, abriram mão de colocar seu nome na história para que os homens cravassem seu marco nos livros como únicos protagonitas, isso só foi possível com o silenciamento e apagamento das mulheres.

A figura feminina foi construída como um modelo de submissão e impotência, sendo tratada como um objeto que deveria atuar no campus do privado, para que assim fosse construída a visão que privilegia a masculinade como modelo ideal a ser reverenciado.

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Você sabia que de 1500 a 1827 a educação brasileira era permitida somente a homens? O papel da mulher na educação era inexistente. A invisibilidade feminina tem sido uma constante na sociedade patriarcal.

Vivemos em um mundo onde não existem igualdades de oportunidades para mulheres e homens. Mesmo assim, muitas mulheres passaram por cima desses muros invisíveis e deixaram sua marca na história. No início do século passado as meninas ouviam que estudar era desperdício de tempo, que conhecimento não serviria para nada, pois o mais importante para se aprender era como ser uma boa mãe e esposa, afinal essa era a sua principal função na sociedade. A única alternativa para mulheres escaparem do analfabetismo eram os conventos.

Quando relato esses fatos eles nos parecem tão distantes, mas infelizmente ainda estão muito presentes na atualidade. Essa mesma feminista que vos fala e escreve, já foi impedida de estudar pelo seu ex-marido. Sim, eu fui. Ele me fez trancar a faculdade três vezes e chegou a estudar junto comigo mesmo já tendo um nível superior.

Não me perguntem o porquê dele ter feito tal loucura, não saberia responder, acho que nem ele próprio o sabe. Os homens ainda trazem essa masculinidade frágil, essa insegurança, esse medo de ter alguém ao lado que saiba pensar e agir por vontade própria. É o machismo estrutural tão impregnado e vigente na educação de muitos homens. Eles acabam reproduzindo o comportamento de seus pais. E acreditem, isso independe de classe social.

Quis mostrar meu exemplo para provar o quanto essa pauta machista
ainda acontece nos dias atuais com muitas de nós, infelizmente. A história da mulher brasileira, como de tantas no mundo, é marcada pela ordem patriarcal familiar que, legitimada pela religião e pelo Estado, transmitiu o silenciamento do feminino em todas as esferas sociais. Apenas em 1880 as mulheres puderam ingressar no sistema de ensino público, com a exclusão dos negros e da maioria da população.

As mulheres até podiam frequentar as aulas, mas sua educação era
opressora e segregada. As escolas apresentavam currículos diferentes para homens e mulheres e também o ensino superior era proibido para elas.
A história ocidental é principalmente de autoridade masculina, a partir do século dezoito as mulheres começaram a usar nomes ambíguos ou diretamente masculinos para autenticar seus escritos. Mulheres que desejavam se tornar escritoras de romances publicavam com pseudônimos ou mesmo anonimamente.

Por muito tempo na história anônimo foi uma mulher. Apesar de tantos obstáculos, muitas mulheres, enquanto cuidavam dos filhos e da casa, foram capazes de escrever poesias e livros, mesmo que não pudessem assinar como autoras. Nos dias atuais, em pleno 2020, 104 países ainda
impedem que as mulheres realizem certas atividades simplesmente por serem mulheres.

Historicamente, mulheres são empurradas para segundo plano quando falamos sobre acontecimentos que marcaram a História. É verdade que durante muito tempo as mulheres foram impedidas de diversas formas de ocupar esses espaços, mas mesmo assim muitas persistiram e prosperaram em suas áreas, apesar dos pesares. Em 1980, a norte-americana Maria Beasley inventou o bote salva-vidas, ainda há outras 15 patentes em seu nome.

Ela observou o grande número de pessoas que morriam em acidentes marítimos e inventou o bote, uma criação que a deixou muito rica. Em 1947, a física Maria Telkes, em parceria com a arquiteta Eleanor Raymond, inventou a primeira casa com sistema de aquecimento solar. Em 1965, na busca por um material com a resistência térmica do amianto e com a rigidez da fibra de vidro, a química Stéphane Kwolek inventou o Kevlar, principal elemento utilizado na fabricação de coletes à prova
de bala.

A primeira máquina de lavar louças automática foi desenvolvida pela norte-americana Josephine Cochrane, que apresentou sua invenção na Feira Mundial de Chicago, em 1893, atraindo a atenção de restaurantes e hotéis. Eizabeth J. Magie foi a criadora do banco imobiliário no início do século dezenove, um famoso jogo de tabuleiro. A ideia do jogo era transmitir noções de economia e demonstrar como o sistema capitalista era prejudicial.

O limpador de para-brisas, esse utensílio tão indispensável para garantir a boa visibilidade dos motoristas em dias de chuva, foi criado por Mary Anderson em 1903. Ela teve a ideia depois de enfrentar uma viagem com muita neve pelo caminho e perceber a dificuldade que era manter os vidros limpos. A brasileira e dona de casa Therezinha Beatriz Alves inventou o escorredor de arroz, cansada de ver sua pia entupida toda vez que lavava arroz, criou o utensílio em 1959.

Ainda há muitas outras invenções realizadas por mulheres, apenas listei algumas. Com tantos avanços e direitos conquistados, mulheres ainda ganham menos que homens mesmo sendo maioria com ensino superior. Mulher estuda mais, trabalha mais e ganha menos. Mesmo obtendo a maioria dos diplomas de curso superior no Brasil, a população feminina ainda ganha menos, ocupa menos cargos de chefia e passa mais tempo cuidando de pessoas ou de afazeres doméstcos do que os homens.

Enquanto a educação não se tornar libertadora, emancipatória e não sexista continuará existindo a hierarquização entre o masculino e o feminino, as desigualdades de gêneros e a violência do Estado, é preciso que esse ciclo seja quebrado e somente a educação possui essa força transformadora. Ainda há muita luta meninas. Mulheres que estão lendo esse artigo eu lhes peço, por favor, não deixe de estudar nunca, jamais.

Não permita que homem nenhum roube de vocês esse sonho. Você pode ser uma boa mãe, uma boa esposa e continuar seus estudos, sim, é possível. Não permitem que homens decidam isso por vocês. Não é preciso escolher entre um e outro.

Acredite em você, siga sua vontade, você é capaz do que quiser. Uma mulher estudiosa é uma mulher perigosa. Faz a menina querer ganhar o mundo. Faz a mulher ter certeza que pode ganhá-lo. Estudar perturba a mente e não há nada mais maravilhoso que isso. Não percam a identidade de vocês por nada e nem por ninguém. Lembrem-se, conhecimento também é resistência.

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(*)Regiane Pimentel é bacharel em direito, ativista social e feminista amazônida.

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