Obras de artistas indígenas Yanomami são exibidas em Xangai, na China

Joseca e outros dois artistas Yanomami têm obras expostas em Xangai, China (Daniel Tandredi/Platô Filmes/ISA)

Com informações da assessoria

MANAUS -“Não estudei na cidade para aprender a desenhar, eu estudava só na floresta, onde eu caçava no mato. Eu desenhava nas árvores, nas praias, desenhava nos coqueiros e nas folhas novas, com carvão. Eu descascava a árvore e fazia os desenhos nos troncos”, conta o artista Joseca Yanomami, ao comentar as evidências deixadas na floresta de suas primeiras ilustrações, ainda na adolescência.

Agora, as obras de Joseca e de outros dois artistas Yanomami, Ehuana Yaira Yanomami e Kalepi Amarildo Isaac Sanöma, estão sendo apreciadas a milhares de quilômetros de distância da Terra Yanomami, em Xangai, na China. A cidade foi escolhida para sediar a continuidade da mostra “Árvores”, exposta pela primeira vez em 2019, em Paris. A visitação da etapa chinesa começou em 9 de julho e segue até 10 de outubro de 2021.

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A exposição, promovida pela Fundação Cartier para Arte Contemporânea e realizada pelo museu chinês Central de Arte, apresenta mais de 200 obras de quase 30 artistas da China e de países latino-americanos, europeus e asiáticos. O evento celebra as árvores como fonte de inspiração para a sociedade humana. Pinturas, fotografias, vídeos, desenhos e instalações reúnem os testemunhos, tanto artísticos como científicos, daqueles capazes de olhar o mundo vegetal em suas diferentes manifestações.

“Desenho os parentes, os animais, árvores, os passarinhos, araras, macacos, antas, peixes”, conta Joseca. “Quando eu aprendi a desenhar eu ouvia os pajés cantando e eu gravava na minha cabeça para desenhar depois. Eu desenho os espíritos. E quando eu sonho, eu estudo muito, penso muito e faço muitos desenhos do meu sonho. Eu sonho com vários animais, espíritos, doenças, inimigos, sonho de chuvas, araras, caçador”, relata.

O artista, nascido na década de 1970 na região do Demini, Terra Indígena Yanomami, localizada entre os estados do Amazonas e Roraima, se tornou o primeiro estudioso de línguas e professor da comunidade Watorikɨ, no início dos anos 1990. No começo dos anos 2000, Joseca foi o primeiro Yanomami a trabalhar na área da saúde. Nessa época, ele também começou a esculpir animais notáveis ​​em madeira e a desenhar.

Essa não é a primeira vez que seus trabalhos participam de uma importante exposição. As obras estrearam na França, na Fundação Cartier para Arte Contemporânea na exposição Yanomami intitulada “Espírito da Floresta, Histórias para ver: mostrar e contar”, em 2012, e em 2019, quando a exposição “Árvores” foi inaugurada em Paris. Na ocasião, Joseca viajou com o líder e xamã Yanomami Davi Kopenawa e seu filho, Dário Kopenawa para a abertura.

Desde 2014, o artista também ilustra vários livros sobre as tradições de seu povo publicados pela Hutukara Associação Yanomami. Em 2020, uma intervenção artística no Congresso Nacional com desenhos de Joseca, marcou o encerramento da campanha #ForaGarimpoForaCovid, com a entrega de uma petição de mais de 400 mil assinaturas a deputados federais e outras autoridades. Os desenhos ilustram meticulosamente entidades, lugares e eventos evocados pelos mitos e cantos xamânicos que ele ouviu desde a infância, mas também por cenas da vida cotidiana na floresta.

Ehuana Yanomami

Uma obra artística da primeira mulher Yanomami a escrever um livro em sua própria língua, Ehuana Yaira Yanomami, também faz parte da exposição “Árvores”, em Xangai. “Na hora que eu faço os meus desenhos eu penso em fazer uma mulher. Primeiro, eu penso quando estou na floresta, depois, eu sonho”, explica a artista em sua língua materna.

Ehuana Yaira, de 37 anos, é professora, artista, artesã, pesquisadora e liderança feminina na comunidade Watorikɨ, onde nasceu e cresceu, mesma aldeia de Davi. Formada na década de 1990 na escola da comunidade, foi a primeira mulher da região a ocupar o cargo de professora.

Em 2010, ela participou de uma pesquisa sobre o conhecimento das mulheres Yanomami, conduzida por anciãs de Watorikɨ. Ao longo de suas investigações, Ehuana Yaira se familiarizou com o uso de computadores e a edição de textos e ilustrações para publicações escolares locais. Assim, ela começou a desenvolver o amor pelo desenho e pela representação das atividades, conhecimentos e rituais femininos.

Em 2017, em parceria com a antropóloga Ana Maria Machado, lançou seu primeiro livro “Yɨpɨmuwi thëã oni: Palavras escritas sobre menstruação”. Em 2019, Ehuana foi uma das pesquisadoras do projeto “Línguas Yanomami: diversidade e vitalidade”. A liderança também contribuiu com uma investigação sobre as plantas medicinais usadas pelos Yanomami, um conhecimento de domínio feminino.

Nesse processo de pesquisa sobre as plantas medicinais Ehuana produziu seus primeiros desenhos.

Os trabalhos artísticos foram publicados no livro “Hwërɨmamotima thë pë ã oni: Manual dos remédios tradicionais yanomami”.

Suas ilustrações retratam cenas do cotidiano, como a coleta de alimentos, a pesca e o cuidado com os filhos, e também vivências como partos e a primeira menstruação, algo que torna seu trabalho singular.

A artista yanomami apresentou seus desenhos pela primeira vez na primeira edição da exposição “Árvores”, em 2019.

Ela é a protagonista do curta-metragem “Um filme para Ehuana”, dirigido por Louise Botkay em 2018, e uma das atrizes do filme “A Última Floresta”, do cineasta Luiz Bolognesi, lançado neste ano.

“Primeiro eu treino, faço os rascunhos e desenho. Faço uma mulher e depois desenho uma árvore grande. Também faço desenho das casas, das frutas, do beiju, da macaxeira”, conta Ehuana.

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