Olga Praguer, uma amazonense universal

Olga gravou dezenas de discos e alcançou uma vitoriosa carreira internacional (Divulgação/Museu Vila-Lobos)

Da Revista Cenarium*

MANAUS – Para o “Le Fígaro”, ela possuía “uma bela voz, uma extraordinária musicalidade a serviço de um repertório único”. no “New York Times” recebeu crítica do famoso musicólogo americano Olin Downes, dizendo que “cantando Villa-Lobos, o legendário pássaro uirapuru brasileiro, Olga também toca seus acompanhamentos de guitarra com a maestria que aprendeu de Segóvia. Um alcance extraordinário de voz e de repertório. A maior folclorista que este crítico já encontrou”.

A soprano e violonista amazonense, Olga Praguer Coelho, casada com o grande ícone do violão clássico o espanhol Andrés Segóvia, nasceu em Manaus, no dia 12 de agosto de 1909, onde viveu parte da sua infância. Com incentivo da mãe, dona Edelvira Praguer, vivenciou sua arte acima de tudo.

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Andrés Segóvia e Olga Praguer Coelho, década de 1950 (Arquivo Pessoal)

No ano de 1923, após uma temporada morando em Salvador, na Bahia, estabeleceu residência no Rio de Janeiro, onde estudou violão com os melhores professores da época. É considerada uma das importantes pesquisadoras e cantoras do folclore, a arte a qual abraçou e difundiu mundo afora. Olga foi uma das maiores violonista e intérprete de Villa-Lobos.

Andrés Segóvia e Olga Praguer Coelho, década de 1950 (Arquivo Pessoal/Roger Hauert)

Após as aulas de violão com o professor Patrício Teixeira, ele reconhecendo o potencial da aluna, resolveu, em 1928, levá-la para a Rádio Clube do Brasil. No ano seguinte, realizou sua primeira gravação para a Odeon, registrando a embolada “A mosca na moça”, de motivo popular e o samba do norte “Sá querida”, de Celeste Leal Borges.

Nessas gravações foi acompanhada pelos violões do próprio Teixeira e de Rogério Guimarães. Em 1930, lançou mais três discos pela Odeon dos quais se destacam os motivos populares “Puntinho branco”, com versos de Olegário Mariano, “Morena”, com versos de Guerra Junqueiro e a canção “Vestidinho novo”, de Joubert de Carvalho.

Olga gravou dezenas de discos, alcançou uma vitoriosa carreira internacional e teve o privilégio de ter como arranjador pessoal o maestro Heitor Villa-Lobos o qual dedicou a ela as ‘Bachianas n. 5 para voz e violão.

Sem dúvidas, uma grande artista que levou o Brasil e se tornar conhecida mundialmente. No ano de 1956, no auge do seu reconhecimento, o mundo se rendeu à sua arte e Olga estampou diversos jornais .

Gravação de 22 de abril de 1936, lançada em julho do mesmo ano, disco 34071-B. (Reprodução/Youtube)

Para o pesquisador de música popular brasileira, Ricardo Cravo Albin, a voz e o repertório de violonista tinham um alcance extraordinário. Ele descreu Olga como “a maior folclorista que eu já existiu”.

Amizade com Villa-Lobos

Disse que ao contrário do que muitas pessoas acham, ela foi apresentada ao maestro, através de uma intérprete argentina que estudava composições com ele. E na ocasião ele a presenteou com melodias que ela interpretou a vida toda. ‘Xangó Ponto de Macumba’’ e ‘Estrela do Céu’’ foram  o começo da grande amizade e parceria de trabalho.

Casada com o violonista Andrés Ségovia e morando nos Estados Unidos por 32 anos, ela convivia diariamente com o maestro Villa Lobos, afinal ele foi amigo de seu marido e após anos de amizade em um belo dia ela o surpreendeu com um pedido inusitado. Solicitou ao maestro que  fizesse a ela um arranjo das Bachianas n⁰ 5’ para violão.

Villa-Lobos ao piano, Arminda e Olga Praguer Coelho no Hotel Waldorf Astoria. Nova York, janeiro de 1945 (Acervo pessoal)

Muito surpreso ele disse: ‘Mas justo as Bachianas n⁰ 5 a qual foi composta para oito violoncelos, como você vai querer que eu coloque oito violoncelos em um violão? Não tem condições, você teria que estudar muito para conseguir executar está obra’’,  negando-se  a atender o pedido da amiga.

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Segundo Olga, o maestro estava duvidando da sua  capacidade como violonista de   tocar no violão os arranjos da tão famosa melodia. O jeito foi apelar ao marido, pois talvez ele conseguisse realizar o grande sonho da violonista, que era ter a famosa melodias transcrita com arranjos para violão. Mas o marido também se negou e argumentou com a esposa dizendo que se o próprio compositor se negou a fazer a transcrição, não seria ele que as faria.

Como Olga era muito determinada e insistente, esse sonho ela teria que realizar, e achou outra forma concretizá-lo. Muito amiga de Dona Mindinha esposa de Villa Lobos, encontrou na amiga a forma mais fácil de conseguir seu desejo.

As amigas arquitetaram um plano que dificilmente falharia, pois Villa Lobos era um homem muito apaixonado pela esposa, e as chances de negar um pedido de dona Mindinha, seriam quase que nulas.

O plano para as Bachianas n 5  

Um tempo depois de volta ao Brasil, já na cidade  Rio de Janeiro dona Mindinha cumprira o plano arquitetado ainda nos Estados Unidos. Ofereceu um jantar para Olga e Segóvia  e nessa oportunidade, pediu ao marido para que transcrevesse a tal melodia para a amiga. Atendendo ao pedido da amada esposa e com a insistência de Olga, ele rabiscou a partitura em papel vegetal e presenteou à amiga. Para ela, foi a maior alegria de sua vida, seu melhor presente.

A tão desejada obra foi estreada com enorme sucesso em concerto no Town Hall em Nova York, contando com a presença do marido Segóvia e dos grandes amigos Villa-Lobos e Mindinha na platéia.

Falar de Olga Praguer Coelho, é uma viagem por um mundo fantástico da arte, da cultura e da inspiração. Uma mulher privilegiada, não foi somente uma espectadora, mas também uma participante ativa  e divulgadora da cultura brasileira e do folclore popular.  Com sua voz perfeita de soprano, cantou e encantou platéia mundo afora, violonista por quem o concertista Segóvia se apaixonou

Olga Praguer Coelho e Marcelo Bonavides, Rio de Janeiro, 2005. (Marcelo Bonavides/Arquivo)

A artista amazonense faleceu no dia 25 de fevereiro de 2008, meses antes de completar 99 anos, no Rio de Janeiro, vítima de complicações médicas. Em 2009, foi comemorado o seu centenário. Que o Brasil, e principalmente o Amazonas, conheça, valorize e se orgulhe dessa amazonense universal, cuja voz encantou o mundo.

Fonte de pesquisa: Acervo HBC; Museu Villa Lobos, Marcelo Bonavides  e
Cravo Albin

(*) Colaborou Ricardo Oliveira

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