ONG aponta retrocesso em lei que reduz áreas de biomas em Mato Grosso
Por: Ana Cláudia Leocádio
13 de janeiro de 2025
BRASÍLIA (DF) – O Observatório Socioambiental de Mato Grosso (Observa-MT) lançou uma nota de repúdio, na última sexta-feira, 10, em que considera um retrocesso significativo na luta contra o desmatamento, a aprovação do Projeto de Lei Complementar 18/2024, aprovado pela Assembleia Legislativa de Mato Grosso (AL-MT) em 8 de janeiro. A proposta reclassifica as áreas compostas pelos biomas Amazônia em Cerrado, reduzindo o percentual de área legal obrigatória aos produtores rurais de 80% para 35%.
O texto final, aprovado por 15 votos favoráveis e oito contrários, é o substitutivo ao projeto original enviado pelo governo do Mato Grosso, em maio de 2024. O novo texto foi apresentado pelo deputado estadual Nininho (PSD).
Para o Observa-MT, além do retrocesso, caso o projeto seja sancionado pelo governador Mauro Mendes (União), significará a “desconstrução de instrumentos nacionais, a Reserva Legal e o Código Florestal, para reduzir as mudanças climáticas”.
O projeto altera dispositivos da Lei Complementar Nº 38, de 21 de novembro de 1995, que criou o Código de Meio Ambiente de Mato Grosso. Além de modificar artigo já consolidado, a nova redação também cria outros artigos, como o que elimina a análise detalhada de fitofisionomia, anteriormente usada como critério técnico.
A organização afirma que a alteração dos biomas de Amazônia para Cerrado “possibilitará o desmatamento de 5,5 milhões de hectares de florestas, área equivalente a 15 vezes o tamanho do município de Cuiabá ou ao tamanho da Croácia”. No total, a mudança impactará 9,6 milhões de hectares, que correspondem a mais de 10% do território de Mato Grosso.

A estimativa de desmatamento a mais em formações florestais no bioma Amazônia com a implementação do projeto de lei é de 3.758.739 hectares, enquanto para o Cerrado chegaria a 1.795.090 hectares, segundo o documento.
Não bastasse a alteração dos mapas de referência para a reclassificação proposta, a Observa-MT chama atenção para a redação do Artigo 62-B, que propõe “utilizar apenas o conceito de bioma, associado a um outro critério exclusivo: altura das árvores para determinar se a vegetação da área é do tipo floresta ou Cerrado”.
“Vale destacar que em Nota Técnica2, o IBGE responde ao questionamento da ALMT sobre o PLC, afirmando que o texto não está adequado ao Mapa/Manual do IBGE ao qual faz menção. A Secretaria de Estado de Meio Ambiente (Sema-MT) também se posicionou contrária ao texto aprovado”, afirma a organização.
Outro aspecto destacado do projeto está relacionado às diferentes fitofisionomias do bioma Cerrado. “Embora o Cerrado seja predominantemente uma savana, ele possui fitofisionomias que podem ser classificadas como “florestas”. Ignorar a existência desse tipo de vegetação em políticas públicas compromete a conservação de áreas de grande relevância ecológica”, ressalta a nota.

Caso a proposta vire lei, seus dispositivos devem alterar a proteção de outros tipos de formações de vegetação, que estão além dos limites dos biomas. “Áreas de floresta dentro do bioma Cerrado, atualmente protegidas por normas mais restritivas devido às suas características ecológicas, passarão a estar mais vulneráveis (cerca de 4 milhões de hectares)”, alerta.
Para a Observa-MT, um dos impactos mais importantes está nas formações florestais e de transição, chamada de ecótono, existentes dentro dos limites do bioma Amazônia. “A definição do que é floresta dentro do bioma, baseada somente na altura das árvores é questionável, pois, deixa de considerar outras métricas relevantes (ex: densidade da vegetação e estrutura de dossel), que estão associadas à definição do IBGE, e despreza a diversidade de florestas da própria região amazônica”, explica a nota.
“Esse desmonte acontece em um contexto de agravamento da crise climática. Em 2023, Mato Grosso foi o segundo estado com a maior emissão bruta de gases de efeito estufa, responsável por 11,4% das emissões totais do Brasil”, conclui a organização, que pede ao governador que vete o projeto.

Em nota enviada à CENARIUM, a Secretaria de Comunicação do Governo do Mato Grosso informou que “a proposta aprovada não tem nada a ver com o que foi encaminhado pelo Executivo. E após seu retorno, será submetida à análise técnica e jurídica”.
Aprovado em primeiro turno, a previsão é de que a proposta passe pela segunda votação na próxima semana.
Autor justifica proposta
Em sua justificativa, o deputado Nininho afirma que seu Substitutivo vem para adequar o Projeto de Lei Complementar 18/2024 à decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), no julgamento de Ações Diretas de Constitucionalidade (ADC) e de Inconstitucionalidade (ADIs) contra dispositivos do Código Florestal Brasileiro. Com isso, a nova classificação dos biomas terá como base o Manual Técnico de Vegetação do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), na edição de 2012.
Ainda segundo o novo texto, os proprietários de imóveis terão mais facilidade para compensar a reserva legal, podendo adquirir áreas excedentes de outras propriedades para regularizar a situação. Poderão, ainda, solicitar a reanálise de pareceres indeferidos sob a regra anterior, conforme os novos critérios estabelecidos na nova lei.
“O Projeto de Lei Complementar 18/2024 passa a observar os três biomas que descrevem a totalidade da classificação vegetal no Brasil, não havendo se falar em ‘Transição’, ‘Fitofisionomia’ ou ‘abrangência e ocorrência de espécies’”, afirma o deputado. O parlamentar também defende que essa adequação proposta, e que promove a alteração no sistema ambiental, busca arranjos mais eficientes ao desenvolvimento sustentável do Estado.