Operação da Polícia de SP em associação de cannabis medicinal afeta nove mil pacientes


Por: Ana Cláudia Leocádio

20 de outubro de 2025
Operação da Polícia de SP em associação de cannabis medicinal afeta nove mil pacientes
Imagens da associação após operação da PC-SP (Reprodução)

BRASÍLIA (DF) – A ação da Polícia Civil do Estado de São Paulo que apreendeu mais de 500 pés de maconha e produtos medicinais da Associação Santa Gaia, que trabalha com óleo de cannabis medicinal, na cidade de Lins (SP), gerou uma onda de revolta, no último fim de semana. A operação policial ocorreu na manhã da última quinta-feira, 16, em cumprimento a mandado de busca e apreensão e prendeu, em flagrante, o fundador e presidente da entidade, Guilherme Viel. A falta do medicamento pode afetar cerca de nove mil associados da entidade que atende pacientes em todo o País.

Imagens que circulam na internet mostram a ação dos policiais e como ficou o local, após o cumprimento da decisão da Justiça de São Paulo. Segundo informações da Secretaria de Segurança Pública de São Paulo (SSP-SP), divulgadas no dia da operação, o caso foi registrado como “localização/apreensão de objeto, falsificação e adulteração de produtos terapêuticos/medicinais, fabricação e tráfico de drogas”. Foram apreendidos 466 pés de maconha e outros 96 em fase de produção de óleo em uma estufa.

Imagens da associação após operação da PC-SP (Reprodução)

Informações do Portal Sechat, plataforma de informação, educação e negócios voltada ao mercado de cannabis medicinal e industrial, em setembro deste ano, aponta que a Santa Gaia, localizada no bairro Garcia, na cidade de Lins, interior de São Paulo, foi alvo de fiscalização da Vigilância Sanitária. O motivo foi denúncias de vizinhos devido ao “cheiro de maconha”. Semanas depois, a Polícia Civil chegou à associação para cumprir o mandado judicial.

Em nota divulgada em seu site, a Santa Gaia informou que diretores, colaboradores e pacientes foram pegos de surpresa com a ação, que resultou na apreensão de todo o material de cultivo, laboratório e produtos medicinais destinados ao atendimento de milhares de pessoas.

A entidade acrescentou que possui dois processos em curso que reconhecem e garantem a sua atividade: um habeas corpus em andamento e uma ação cível no Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1), em Brasília (DF), com agravo de instrumento aguardando decisão.

Portanto, não existe qualquer determinação judicial que obrigue a interrupção das atividades da associação. O que ocorreu hoje (dia 16) representa um grave descompasso de informações entre a Justiça Estadual, a Polícia Civil e a própria Justiça Federal, que tem ciência das ações em curso e da relevância social do trabalho realizado pela Santa Gaia”, reiterou.

A associação informou que, atualmente, mantém nove mil associados e atende a 170 famílias que recebem medicação gratuitamente, 97 pacientes atendidos sem custo pela clínica social e 53 colaboradores que “dedicam-se diariamente a garantir que cada pessoa tenha acesso digno ao seu tratamento”.

O receio, agora, é deixar os pacientes desassistidos, uma vez que tudo foi destruído ou apreendido. A Santa Gaia sustenta que tem “uma trajetória reconhecida em Lins e em todo o País“, atuando no acolhimento e tratamento de mais de nove mil pacientes, entre eles crianças, idosos e pessoas com condições graves como epilepsia, Parkinson, Alzheimer, câncer e dores crônicas.

Conforme o Portal Sechat, o delegado responsável pela operação, Artur Franco, explicou que a apuração, solicitada pelo Ministério Público Estadual, constatou que a associação operava sem a devida documentação da Vigilância Sanitária e da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para cultivar cannabis em solo nacional.

Sobre os processos judiciais justificados pela entidade, Franco confirmou ter conhecimento da ação, mas ressaltou que, “enquanto eles não obtiverem a decisão oficial autorizando a atividade, estão irregulares e continuam na ilegalidade”.

Revolta contra a operação

A líder do PSOL na Câmara dos Deputados, deputada Erika Hilton (SP), informou que entrou com uma denúncia junto ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ) contra a operação da Polícia Civil de São Paulo, a quem acusou de “roubar” os medicamentos à base de maconha medicinal.

A parlamentar questiona toda a operação, que levou cerca de 40 litros de óleo de canabidiol, com valor de mercado que pode chegar a R$ 2 milhões. Além disso, segundo Hilton, o responsável pela associação teria sido forçado a assinar uma “admissão de culpa” sem a presença de seu advogado e com defesa sem acesso ao processo. “Tudo isso é vil, nojento e ilegal. Todas as autoridades envolvidas nessa ‘apreensão’ precisam ser devidamente responsabilizadas”, afirmou a deputada em suas redes sociais, no sábado, 18.

Outros políticos, como o deputado estadual por São Paulo Eduardo Suplicy (PT) e o ministro do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar, Paulo Teixeira, foram às redes sociais fazer um apelo à Justiça do Estado para que reforme a decisão, que pode prejudicar milhares de pessoas dependentes do tratamento terapêutico com o canabidiol, e que agora terão seus tratamentos interrompidos.

Conclamo os movimentos sociais e parlamentares a se unirem na reivindicação desse direito a todos os brasileiros, e não apenas aos mais ricos”, afirmou Suplicy. Ele disser beneficiário do tratamento pela cannabis medicinal e pediu ao governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) que regulamente o uso terapêutico da planta. Médicos, especialistas e pacientes da Santa Gaia também têm feito apelos pela regulamentação e na defesa da entidade.

Uso medicinal da cannabis

O uso medicinal da cannabis é regulamentado no Brasil, mas ainda de forma restrita, mediante prescrição médica. O acesso a produtos autorizados pela Anvisa ocorre pela importação dos medicamentos, o cultivo associativo (em grupos com autorização judicial) e o autocultivo (também mediante decisão judicial). Quatro projetos de lei, que tramitam no Senado Federal, apresentados de 2019 a 2023, propõem a criação de um marco legal ampliado que inclua o cultivo nacional para fins medicinais.

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