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Órgãos ignoram povo Karipuna após denúncia de grilagem e roubo de madeira, em Rondônia
O maior receio da comunidade, que já ‘flertou’ com o genocídio, quando foi reduzida a um grupo de apenas oito pessoas, décadas atrás, é, agora, a extinção completa da etnia. (Reprodução/ Greenpeace)
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21 de dezembro de 2021
Iury Lima – Da Revista Cenarium
VILHENA (RO) – Há quase duas semanas, o povo indígena Karipuna, formado por 61 pessoas de uma única comunidade, habitantes de um território protegido na região de Porto Velho, em Rondônia, aguardam a chegada de fiscalização contra a grilagem de terras, o roubo e a exploração de madeira. Mesmo após denúncia protocolada junto ao Ministério Público Federal (MPF/RO), Polícia Federal (PF/RO) e Fundação Nacional do Índio (Funai), não houve nenhuma vistoria ou assistência prestada à Terra Indígena (TI) que carrega o mesmo nome de seus integrantes.
“Até agora, não teve uma fiscalização depois dessa denúncia”, garantiu o cacique André Karipuna à reportagem da CENARIUM, durante entrevista. De acordo com a liderança indígena, os episódios se repetem, pelo menos, há cinco anos, e, por isso, os indígenas temem a perda de autonomia dentro da própria casa. “Nós estamos muito preocupados de perder o nosso espaço, de perder a nossa terra. Para nós, a terra é vida. Além disso, nós somos um povo bem pequeno”, lamentou o líder.
Denúncia
A queixa foi feita pela Associação do Povo Indígena Karipuna (Apoika) relatando que invasores têm adentrado uma região muito próxima à aldeia, nas proximidades do rio Formoso, para realizar os ilícitos. Segundo o cacique André Karipuna, os pontos de invasão e de exploração ficam a cerca de 1 quilômetro da moradia dos indígenas. Por isso, os aldeões estão impossibilitados de continuar com as atividades de sustento, como a coleta de castanhas, a mais afetada até então.
Os crimes foram identificados justamente quando um grupo de Karipunas realizava a colheita. “Isso afetou muito a gente, pois, para nós nos mantermos, a gente vive do dia a dia, como plantar mandioca, milho, banana, que é culturalmente uma prática nossa. Então, não estamos seguros, porque a gente não tem a liberdade que tinha antes, de andar e circular livremente. Sofremos ameaças, inclusive eu, que faço a denúncia”, declarou o cacique.
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Além disso, há ainda a construção de pontes improvisadas sobre o rio, facilitando o acesso aos recursos naturais da reserva de proteção integral. Segundo o Conselho Indigenista Missionário (Cimi), que se posicionou sobre os episódios, o MPF e a PF têm ciência das construções, mas não viabilizaram a destruição sob a alegação da Funai, aos referidos órgãos, de que as pontes facilitariam o trabalho de fiscalização, o que ainda não ocorreu.
Extinção à espreita
O povo Karipuna espera que as instituições acionadas realizem fiscalização para apurar as irregularidades cometidas dentro do território indígena. “Já fizemos várias denúncias junto ao Ministério Público, tudo protocolado. Sem falar que a gente sofre ameaça, devido a isso. Ameaças dos invasores que estão adentrando a terra, dos madeireiros também”, diz André Karipuna.
O maior receio da comunidade, que já ‘flertou’ com o genocídio, quando foi reduzida a um grupo de apenas oito pessoas, décadas atrás, é, agora, a extinção completa da etnia por conta do avanço predatório dos invasores. “A gente não está aqui querendo que crie uma lei ou nada disso. A gente quer que se cumpra a lei, o que já está escrito na lei. O dever do governo federal é proteger e coibir isso. O dever deles é proteger”, acrescentou a liderança.
“Uma terra como a minha, que já é homologada e registrada, perante a lei, deve estar protegida por esses órgãos, Ibama e Funai. Mas isso, realmente, não está acontecendo. Algumas vezes acontece, sim, mas por meio do Ministério Público”, disse ainda, indignado, André Karipuna.
Abandono
Para o cacique, o governo federal tem alterado os direitos indígenas, invertido valores e negligenciando o trabalho que deveria promover. Por isso, ele avalia que o sentimento do povo Karipuna é de abandono. “O governo deveria olhar mais para o direito dos povos indígenas e não deveria deixar que isso acontecesse novamente. Deveria cobrar o que está na lei, fazendo o serviço de proteção territorial. Não só na minha, mas em outras Terras Indígenas. Com essa ‘politicagem’, o governo enfraqueceu a Funai e o Ibama. Vemos isso com grande preocupação. Com isso, a gente vem sofrendo impacto social e ambiental”, declarou.
“É isso o que nós, povo Karipuna, pedimos: respeite o nosso direito, respeite as leis ambientais que já existem. Façam o trabalho que está escrito na lei, que é de proteger essas terras e esses povos que estão sofrendo as ameaças”, concluiu o líder indígena.
Sem respostas
A CENARIUM questionou a Funai, o Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), o MPF/RO e o Ministério do Meio Ambiente, mas não obteve respostas até a publicação desta matéria. Já a Polícia Federal reconheceu que ainda não realizou nenhuma fiscalização na região após a denúncia da Apoika, mas que pretende avaliar o caso.
Desmatamento também ameaça
A Terra Indígena Karipuna também sofre com a presença do desmatamento acelerado que assola a Amazônia. Em relatório mais recente do Sistema de Monitoramento (SAD) do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon), a TI aparece como a quarta mais devastada entre as dez que estão em situação mais crítica.
Outra importante Unidade de Conservação atingida é a Reserva Extrativista Jaci-Paraná, também na região de Porto Velho, que faz parte de um grande corredor etnoambiental, no Estado. Foi nela onde o desmatamento avançou 2.700% desde maio, segundo o WWF-Brasil, quando houve a aprovação da maior redução de áreas protegidas já autorizada no País por um governo estadual.
Reportagem da Cenarium no Jornal da Cultura detalha a degradação recorde na Amazônia e reforça denúncia dos Karipunas:
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