Paralisação: em RO, residentes em saúde cobram presença de instrutores nas unidades e pagamento de bolsas atrasadas

A principal reclamação é a falta de instrutores para atuar em conjunto nas unidades de saúde (Iury Lima/Cenarium)

Iury Lima – Da Revista Cenarium

VILHENA (RO) – Com cartazes estampando frases potentes e expondo as mazelas da saúde pública de Vilhena, município do interior de Rondônia, profissionais residentes em saúde tomaram a frente do Hospital Regional (HRV) da cidade, para reivindicar a valorização e o reconhecimento de suas categorias. São psicólogos, enfermeiros, fisioterapeutas e dentistas, dentre vários outros. Todos integrantes do Programa de Residência Multiprofissional; uma parceria entre o governo federal e prefeituras Brasil afora, por meio dos Ministérios da Saúde (MS) e da Educação (MEC).

A principal reclamação deles é a falta de instrutores (preceptores e tutores) para atuar em conjunto nas unidades de saúde, tendo em vista que o programa é uma espécie de pós-graduação, unindo prática e teoria para profissionais formados e já registrados junto aos conselhos regionais de cada categoria, exigindo dedicação exclusiva – com exceção para médicos, que podem ter outros vínculos.

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Só em Vilhena, são cerca de 160 residentes e, de acordo com os denunciantes, parte deles assumem plantões sozinhos, quando deveriam ser supervisionados por um superior. Já outra boa parte do grupo, está com as bolsas-salários atrasadas. Quando há pagamento, o agendamento é feito, geralmente, muito além do prazo e sem data fixa. Um desafio, sendo que os profissionais precisam pagar aluguel, transporte e custear outras despesas improrrogáveis como a alimentação, visto que quase todos eles deixaram suas antigas cidades para trás em busca da especialização.

Saúde Pública de Vilhena conta com cerca de 160 profissionais residentes lotados no Hospital Regional, Unidades Básicas de Saúde (UBSs) e demais centros especializados (Iury Lima/Cenarium)

Exigências

A convocação para a paralisação aconteceu nessa última terça-feira, 12, e foi exposta em uma carta aberta às autoridades e à sociedade vilhenense. “Expomos nossa indignação diante do descompromisso persistente, colocado para milhares de profissionais da Saúde, devido ao não pagamento da bolsa-salário, falta de tutores/preceptores, Centro Acadêmico, etc. “, denuncia um trecho do documento. 

Os Residentes pedem:

  • Data fixa para o pagamento das bolsas-salários;
  • Pagamento das bolsas já atrasadas;
  • Impedimento para novos atrasos;
  • Tutores e preceptores em todos os postos de trabalho, e
  • Criação de um Centro Acadêmico 

“Hoje é dia 13 de abril de 2022 e a gente tem colegas que ainda não receberam suas bolsas. E eles precisam pagar aluguel porque vêm de fora, precisam comer, precisam vir até ao cenário de prática, seja de carro de aplicativo, de moto, enfim, mas eles precisam ter condições para vir até aqui”, apontou a psicóloga residente em Intensivismo, Vera Lúcia Alves Corsino.

“Não é um abandono do local do trabalho. Não é um dia de folga. Não é má-vontade de fazer e desempenhar a nossa função, mas é um grito para que as coisas mudem”, acrescentou a profissional que atua na ala de UTI do HRV.

Para a psicóloga residente em Intensivismo, Vera Lúcia Alves Corsino, a paralisação é “um grito para que as coisas mudem” (Iury LIma/Cenarium)

“A gente tem que programar as nossas contas para o dia 15 ou para o dia 20, porque a gente recebe em dias indeterminados”, reclamou a enfermeira residente que também atua na UTI do Hospital Regional de Vilhena, Ariadne Vargas.

Vargas revela que com a falta de um preceptor, quem acaba cumprindo esse papel são os Residentes chamados de R2, ou seja, aqueles que estão no segundo e último ano do programa multiprofissional. Por isso, eles acabam orientando os R1, aqueles que acabaram de ingressar, quando, na verdade, um instrutor era quem deveria orientar a todos os profissionais.

“Então, é uma responsabilidade muito grande, principalmente, porque, no setor em que eu estou, nós lidamos com pacientes mais graves, portanto é preciso uma atenção ainda maior”, disse a enfermeira.

A enfermeira de UTI, Ariadne Vargas denuncia que com a falta de um preceptor, são os residentes mais experientes quem acabam assumindo a função (Iury Lima/Cenarium)

Residência põe o SUS em movimento

Os usuários do Sistema Único de Saúde (SUS) podem até não saber, mas boa parte dos serviços oferecidos pela administração pública funcionam graças aos Residentes lotados nas unidades. 

“Hoje, a existência de uma equipe multiprofissional com dentistas, assistentes sociais, psicólogos, farmacêuticos e fisioterapeutas, por exemplo, para o atendimento ao público, é algo que não se encontra em qualquer lugar. Então, isso tem que ser valorizado. Nós não somos mão-de-obra barata (…) Quase todo hospital é composto por profissionais residentes nas mais diversas áreas”, desabafou Vera Lúcia.

Ela defende que “a residência é importante para o SUS, para o município e, também, para o profissional que quer atuar na Saúde”. No entanto, a psicóloga pondera: “da maneira que ela [residência] é gerida hoje, em Vilhena, a situação é insustentável”.

Quem paga a conta?

De iniciativa do Ministério da Saúde em conjunto com o Ministério da Educação, as residências em áreas profissionais estão previstas na Lei nº 11.129/2005, orientadas, justamente, pelos princípios e bases do SUS, como modalidade de pós-graduação latu sensu, ou seja, ensino e serviço. A carga horária é de 60 horas semanais, sendo que parte desse tempo deveria ser destinada apenas aos estudos, com análises de caso, pesquisas científicas e eixos teóricos. A duração mínima do programa é de dois anos.

Apesar da parceria firmada com as prefeituras, quem paga as bolsas de R$ 3.654,43 (já com todos os recolhimentos) é o governo federal por meio do MS. A cargo do Executivo Municipal fica apenas o intermediário por meio da Coordenação de Residência em Saúde (Coremu) em atuação, no caso específico de Vilhena, com a faculdade privada UNESC.

O que diz a prefeitura

Após o movimento, que ocorreu simultaneamente em outras cidades e estados brasileiros, nesta quarta, motivado por irregularidades semelhantes, a Prefeitura de Vilhena informou, por meio de nota, no fim da tarde, que as bolsas-salário “estão na conta após solicitação de urgência”.

Segundo a nota, o Ministério da Saúde “informou que a ordem de pagamento foi emitida e que as bolsas atrasadas foram pagas”. “Assim, conforme acordado nesta manhã, a paralisação dos serviços será encerrada e os residentes voltam às suas atividades nesta quinta-feira, normalmente”, diz o posicionamento. 

Ainda, de acordo com a resposta, a solicitação de contratação de preceptores e instalação de um Centro Acadêmico “já têm solução em andamento”. “A reforma do Hospital Regional já inclui sala preparada para o Centro Acadêmico, com previsão de entrega para as próximas semanas, enquanto as contratações de mais preceptores estão sendo feitas já em parte pelo Centro Especializado em Reabilitação (CER). Para os demais locais, o levantamento já está pronto e, na próxima semana, assim que a secretária municipal de Saúde, Weslaine Amorim, retornar de Porto Velho, faremos nova reunião para delimitar o andamento dessas ações”, esclarece a nota. 

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