Pesquisa revela quais sentimentos Lula e Bolsonaro provocam nos eleitores

Levantamento “A cara da democracia” mostra rumos e táticas emocionais dos pré-candidatos (Reprodução/Editoria de Arte)
Com informações do Infoglobo

SÃO PAULO – As pesquisas eleitorais destacam, prioritariamente, o sobe e desce das intenções de voto e seus cruzamentos, mas um componente ainda pouco explorado nos questionários entrega importantes pistas sobre o comportamento dos eleitores, mesmo sem apontar com clareza a posição de cada competidor na corrida.

Neste ano, a pesquisa “A cara da democracia” inaugurou uma bateria de perguntas sobre sentimentos relacionados aos pré-candidatos Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Jair Bolsonaro (PL), concluindo que o petista agrega mais emoções positivas e com relativo equilíbrio em emoções negativas. No entanto, após uma década política turbulenta, com denúncias de corrupção, Lula e Bolsonaro empatam no quesito “honestidade”: embora a maioria desconfie dos dois, o petista é honesto para 34% dos entrevistados; e o presidente, para 35%. Um empate técnico que estará no centro das atenções nos próximos três meses de campanha.

Desconfiança sobre os líderes das pesquisas, por outro lado, não pressupõe desconsideração sobre a inteligência deles: Bolsonaro e Lula são vistos como inteligentes pela maioria dos eleitores. Lula tem vantagem (70%), ante Bolsonaro (53%). Independentemente das atitudes, teorias conspiratórias e acusações, brasileiros também veem Bolsonaro (53%) e Lula (64%) como trabalhadores, mas nem de longe confiáveis: 54% não confiam em Lula, ante 65% em relação a Bolsonaro. Lula também tem resultados melhores no quesito decepção (42% dizem sim, estão decepcionados, contra o “não” de 56%), diferentemente de Bolsonaro (52% a 46%).

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Investigar níveis emocionais de um País, diante da política, especialmente, em anos eleitorais, passou a ser tarefa mais comum para pesquisadores de um ramo específico da opinião pública, principalmente, nos Estados Unidos, embora ainda existam reservas de acadêmicos, uma vez que sentimentos não entregam resultados precisos e livres de questionamentos metodológicos. A área, no entanto, vem crescendo nos EUA e no Brasil.

Nesse tipo de estudo, ansiedade e medo podem ser considerados sinônimos. Diante de políticos, as duas emoções ativam o sistema de vigilância do cérebro, que passa a ser conectado às opiniões políticas. Pesquisadores americanos que criaram a teoria da inteligência afetiva (Markus, Neuman e Mackuen, 2000) investigam esse assunto em detalhes. Se o medo é disparado a partir, por exemplo, de um discurso político, a vigilância é detonada em nome da autoproteção de cada um.

Para eleitores, essa ativação resulta em duas consequências distintas: com medo/ansiedade, um pode tanto observar com mais detalhes ao redor em busca de ameaças e, assim, formar opinião e tomar atitudes com mais informações; ou, de forma totalmente oposta, concentrar todos os seus esforços para apenas um lado do acontecimento ou ameaça política que se apresenta, reduzindo o horizonte de análise e aderindo a versões únicas da realidade, as tais “narrativas”. Aos números: 37% dos entrevistados disseram ter medo de Bolsonaro, ante 62% sem temores. Já em relação a Lula, 21% dizem ter medo, contra 78% sem. O que cada um faz com seu medo declarado (muitos escondem diante de entrevistadores para não revelar fraquezas) — e se vai transformá-lo em atitude política — é alvo de estudos, principalmente, qualitativos, bancados em larga escala pelas campanhas políticas.

Solidariedade

Sentimentos positivos, como esperança, também têm consequências no campo da neurociência e psicologia experimental exploradas por pesquisadores de opinião. Enquanto Lula detém esperança de 54% dos entrevistados contra 44%; Bolsonaro marca 36% de esperança contra 62%, uma desvantagem considerável para o atual presidente.

Professor titular de Ciência Política da UFMG e um dos responsáveis pelo levantamento, Leonardo Avrtizer explica que o Brasil não tem tradição de adicionar perguntas sobre sentimentos em questionários de pesquisas de opinião, embora a importância desse tipo de investigação seja crescente.

“A sociedade está polarizada e também muito emotiva. Isso está afetando a visão dos eleitores diante dos candidatos. E não só no Brasil. Veja as emoções nos EUA a partir das últimas decisões da Suprema Corte sobre aborto. Na política contemporânea, os sentimentos estão à flor da pele, e isso influencia os eleitores”, analisa Avritzer, acrescentando: “É uma situação que ganha contornos até dramáticos. Não é comum, no Brasil, pessoas jogarem fezes em eventos políticos, por exemplo, como vimos na última quinta-feira, 7, no Rio de Janeiro”.

Após os piores momentos da pandemia e em meio à inflação alta, um dado chama a atenção pró-Lula. Para 65% dos entrevistados, ele é solidário (contra 32% que disseram não). Bolsonaro tem resultados sensivelmente piores: 34% dos eleitores o consideram solidário, contra 62%. Após três governos e meio do PT e escândalos de corrupção, e três anos e meio de Bolsonaro e seu governo de extremos, o orgulho passa longe de ambos: 65% dizem não ter orgulho de Lula, enquanto 74% dizem o mesmo de Bolsonaro.

A pesquisa “A cara da democracia” foi feita pelo Instituto da Democracia (INCT/IDDC), com 2.538 entrevistas presenciais em 201 cidades. A margem de erro total é de 1,9 ponto percentual, e o índice de confiança é de 95%. A pesquisa reúne as universidades UFMG, Unicamp, UnB e UERJ, com financiamento de CNPq e Fapemig, e está registrada no TSE (BR-08051/2022).

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