Pimenta Baniwa: das mãos das mulheres indígenas do Amazonas para o comércio varejista de São Paulo

A Pimenta Jiquitaia Baniwa é produzida há várias gerações pelos povos indígenas de São Gabriel da Cachoeira (Divulgação/Carol Quintanilha)

Luciana Bezerra Da Revista Cenarium

MANAUS — Cultivada por mulheres indígenas da etnia Baniwa, da comunidade Canadá, localizada no Alto Rio Negro, em São Gabriel da Cachoeira (a 1.109 quilômetros de Manaus), a Pimenta Jiquitaia Baniwa — que transformou a realidade da sua comunidade indígena, por meio de técnicas sustentáveis utilizadas há várias gerações —, agora pode ser encontrada nas prateleiras de sete lojas do grupo varejista Pão de Açúcar, em São Paulo. 

Pimenta Baniwa, produto nobre amazônico, antes desconhecido, vira renda e faturamento para as mulheres da floresta (Divulgação/Carol Quintanilha)

A iniciativa faz parte de uma parceria entre a comunidade Baniwa, por meio do programa Caras do Brasil e da rede Origens Brasil®, que visa valorizar a produção sustentável, a culinária regional e promover relações éticas e transparentes entre empresas e produtores.

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Nesta terça-feira, 22, o gerente comercial da Organização Indígena da Bacia do Içana (Oibi), Alfredo Brazão, falou com a REVISTA CENARIUM sobre como a Pimenta Baniwa transformou a vida da comunidade, antes isolada, no Amazonas. Segundo Brazão, a Pimenta Baniwa integrou a rede varejista paulista em janeiro deste ano e desde então só trouxe benefícios à comunidade. 

“Faz tempo que a gente sonhava em entrar nesse mercado [comercialização do produto para o mercado externo]. Esperamos que gostem da pimenta, continuem comprando e divulgando nosso trabalho, que valoriza o conhecimento das produtoras. Após essa parceria, a nossa comunidade ficou conhecida e passaram a valorizar o trabalho das produtoras”, destaca Brazão, que é responsável pela venda da Pimenta Baniwa, Brasil afora.

Outro ponto destacado pelo gerente comercial da Oibi é que a cadeia produtiva da pimenta foi se estruturando apesar de ter começado pequena. As vendas também foram tímidas no início. Mas o produto final, a Pimenta Jiquitaia Baniwa, um nobre produto amazônico antes desconhecido, ganhou corpo e faturamento. Além de ser reconhecida por renomados restaurantes e chefes de cozinha internacionais.

Segundo o gerente da Oibi, são em torno de 78 variedades de pimentas registradas nas roças e quintais das comunidades Baniwa, entre as quais, as pimentas bico de mutum, bunda de saúva, jaburu, roxa, malagueta, bode, braço de camarão, dente de onça, bico de peixe lápis, branca, fruta de abiu e a jolokia baniwa.

Brazão ressaltou ainda que a marca Pimenta Baniwa foi idealizada e lançada em 2013, durante a inauguração da primeira casa de Pimenta Baniwa Dzoroo. Atualmente o projeto possui quatro Casas de Pimenta em funcionamento, Tsitsiadoa, Takairo e Ukuki, além, da Dzoroo.

O projeto faz parte da parceria entre Oibi, Instituto Socioambiental e Instituto ATÁ. A rede de casas da Pimenta Baniwa fortalece e cria pontes justas com o comércio nacional e internacional. Além do Brasil, a marca é comercializada no Peru e Estados Unidos.

Conheça as produtoras

Ao todo, são 150 produtoras mulheres oriundas de 75 famílias existentes na comunidade do Canadá, onde são elas as responsáveis pelo plantio, colheita, divisão de renda e gerenciamento das quatro Casas da Pimenta Baniwa, que formam uma rede de unidades de beneficiamento em comunidades da bacia do rio Içana, no Amazonas.

As produtoras Ilda Fontes da Silva, Nazária Mandú Lopes e Nazária Trindade Monte Negro carregam pimentas frescas colhidas na roça no caminho de volta para casa, próxima à comunidade Canadá, no rio Ayari (Divulgação/Carol Quintanilha)

O protagonismo dessas mulheres se tornou símbolo de empreendedorismo ao transformar o cultivo sustentável da Pimenta Jiquitaia em negócio que gera renda e contribui com a qualidade de vida da comunidade Baniwa.

De acordo com a coordenadora do Departamento de Mulheres da Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro (Foirn), Elisângela da Silva Costa, após o excelente desempenho das mulheres à frente da produção da pimenta, bem como do artesanato, elas ganharam proeminência nas associações indígenas de base do Rio Negro.

“Por meio da pimenta e do artesanato, as mulheres indígenas passaram a ser presidentes de associações de mulheres. O que antes não era possível, já que as associações eram gerenciadas pelos homens. Mesmo ainda tendo muito a melhorar, essa é uma conquista e vamos continuar unidas nesta causa”, comemora Elisângela. 

Nazária Mandú Lopes, uma das produtoras da comunidade Canadá (Divulgação/Carol Quintanilha)

A produção e a comercialização da Pimenta Jiquitaia foram o caminho encontrado pelas mulheres da comunidade para gerar renda para a comunidade e apresentar ao mundo uma pimenta brasileira e única. “A pimenta sempre foi muito valorizada em nossa cultura desde os tempos dos nossos antepassados. Nós, mulheres Baniwa, ficamos contentes com a valorização da nossa pimenta pelo Pão de Açúcar”, diz Nazária Andrade Montenegro Fontes, produtora da Pimenta Jiquitaia.

Para Selma da Silva Lopes, uma das cogerentes da Casa da Pimenta Takairo uma das unidades responsáveis pela produção da Pimenta —, a ideia é vender o produto para fora da comunidade indígena.

“A pimenta produzida por nós é de excelente qualidade. As pimentas são entregues frescas por nós. Queremos que o nosso produto seja experimentado e aprovado pelo não indígena. Espero que eles gostem e que comprem sempre conosco”, diz Selma.

Ainda de acordo com Selma, a Casa de Pimenta Takairo tem a proposta de entregar em torno de 360 potes de 15 gramas de pimenta a cada três meses. Em maio passado, foram produzidos 509 potinhos a partir de pimentas colhidas nas roças de 19 famílias. Até dezembro, a expectativa é chegar à meta de 2.100 potes envasados, assinala a co-gerente.

Entre 2018 e 2019, foram vendidos 18 mil potinhos de Pimenta Baniwa. A renda é repassada integralmente para as famílias produtoras e os gerentes da Rede de Casas da Pimenta.

Quem são os Baniwa

Os Baniwa são um povo indígena de língua Aruaque com uma população estimada de 15 a 18 mil pessoas. Vivem em cerca de 200 comunidades e sítios, como parte do complexo cultural do noroeste amazônico, nas cabeceiras da bacia do Rio Negro, entre Brasil, Colômbia e Venezuela.

No Brasil, os Baniwa são os ocupantes milenares da bacia do rio Içana, onde estão localizadas 95 comunidades e sítios que abrigam entre 7 a 8 mil pessoas. Saiba mais sobre os Baniwa no site Povos Indígenas do Brasil.

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