Prática de comer placenta não traz benefícios comprovados, segundo profissionais de saúde

Fernanda Lima e Rodrigo Hilbert comeram a placenta da filha caçula logo após o parto (Reprodução/ GNT)
Caroline Viegas – Da Revista Cenarium

MANAUS – No Brasil, o hábito de comer a própria placenta após o parto vem ganhando força nos últimos tempos. Cada vez mais mulheres vêm se interessando por ingerir este órgão que é o responsável, entre outras coisas, por nutrir o bebê durante a gestação. A prática é famosa por supostamente melhorar a produção de leite, repor as quantidades de ferro no organismo e evitar a depressão pós-parto. No entanto, não há comprovação científica dos benefícios e profissionais da área obstetra não recomendam o procedimento.

Conhecida como placentofagia, a prática vem sendo adotada por inúmeros famosos no Brasil. Dentre as formas de consumo, está o encapsulamento e a batida do órgão com complexos vitamínicos. A chef de cozinha Bella Gil foi uma das primeiras celebridades a ingerir a placenta e também compartilhar parte dela com a filha. Em uma entrevista ao apresentador Fábio Porchat, a profissional disse que mesmo não havendo comprovação científica, era um ritual que ela quis muito fazer.

Com a popularização do tema nos últimos anos, cientistas se debruçaram em pesquisas com intuito de se aprofundar mais no assunto e chegar a uma conclusão de fato sobre a possível eficácia dessa prática. Dessa forma, a psicóloga Cynthia Coyle, da Escola de Medicina Feinberg da Universidade Northwestern, nos Estados Unidos, liderou, ainda em 2017, uma análise minuciosa de dez estudos acerca do tema.

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Em afirmativa sobre os estudos, Coyle declarou que “os benefícios são baseados em alegações individuais. Mas, na revisão da literatura científica, não foram encontrados estudos bem controlados sobre a segurança e as vantagens em seres humanos”. A profissional afirma que é necessário mais pesquisas para determinar se a placentofagia faz bem às mulheres. Se há benefícios ou riscos. No entanto, a doutora afirma ter percebido que mães realmente reportam diversas vantagens e isso “já é uma bela justificativa para investigar mais”.

Fernanda Lima e Rodrigo Hilbert comeram a placenta da filha caçula logo após o parto (Reprodução/ GNT)

Estudo prático

Nos Estados Unidos, a pesquisadora Sharon Young, da Universidade de Nevada, junto de outros colegas, entrevistaram 180 mulheres que exerceram a placentofagia. Em resultado, a equipe descobriu que uma das principais motivações dessas mães tinha a ver com a promessa de refazer os estoques de ferro no organismo. Considerando que a placenta é mesmo um órgão cheio de ferro, a equipe decidiu iniciar um estudo prático com um grupo de voluntárias que, ao participarem, não sabiam o que estavam ingerindo para manter a imparcialidade.

Enquanto metade das participantes recebeu suplementos feitos com sua placenta desidratada, a outra parte ganhou cápsulas de bife desidratado que, por sua vez, também concentra muito do mineral (ferro). No entanto, conforme o relatório do estudo, as pílulas de placenta continham aproximadamente sete vezes mais ferro do que as de carne. Apesar disso, ao compararem a quantidade do mineral no sangue das mães, os pesquisadores não encontraram diferenças significativas entre os grupos.

“E, mesmo em quantidades altas, a cápsula feita com o órgão só ofertou 24% da dose diária de ferro recomendada para quem está amamentando”, revelou Sharon. Em contrapartida, a pesquisadora ressalta que esses resultados não encerram a discussão considerando que a análise foi feita em mulheres saudáveis e com ingestão adequada de ferro. Quanto aos riscos, Young não encontrou riscos associados ao consumo da placenta, mas esse é um ponto que ainda gera polêmicas visto que o órgão também funciona como uma espécie de filtro e pode acabar concentrando toxinas, como mercúrio, cádmio, arsênio e chumbo.

Efeito placebo

De acordo com a enfermeira obstetra Ester Serdeira, toda essa sensação de benefícios em torno da prática de ingerir a placenta pode ser resultado de um efeito placebo – quando a fé na melhora acaba resultando em uma conclusão de benefício por meio do método adotado.

“A comprovação científica não existe, mas existe toda aquela crença de que faz bem, de que realmente traz benefícios, e isso de alguma forma faz com que essas mães se sintam realmente beneficiadas. É como, por exemplo, quando você passa a tomar um medicamento em forma de tratamento precoce, sendo que não há nenhuma comprovação científica de que aquela determinada doença possa ser prevenida/evitada a partir de medicamentos. E então, a pessoa apresenta melhoras e acredita fielmente que foi o medicamento quando na verdade não se sabe se foi”, afirmou ela.

Mayra Cardi foi uma das celebridades brasileiras que fez placentofagia e defendeu a prática em suas redes sociais. A profissional encapsulou a placenta para consumir diariamente (Reprodução/ Internet)

Em breve análise, a enfermeira diz que as mães precisam ter cuidado ao induzir outras pessoas próximas a ingerir suas placentas, como foi o caso de Bella Gil, que dividiu com a filha mais velha. “Principalmente quando essa placenta é ingerida crua. É preciso ter muita confiança de sua saúde para compartilhar uma parte desse órgão com outras pessoas, sejam filhos, parentes ou maridos/esposas. Visto que, se essa mãe apresenta alguma doença, é bem provável que ela ofereça risco a outra pessoa”, afirma a profissional.

“Eu, como profissional, não indico a placentofagia a nenhuma das minhas pacientes, uma vez que a placenta foi feita para nutrição do feto durante a gestação e não para substituição hormonal ou sanguínea para a mãe. Nosso aconselhamento tem que ser baseado na ciência e se não há comprovações científicas, não tem porquê um profissional da área obstetra indicar a prática”, disse a enfermeira que, no entanto, ressaltou não ir contra o procedimento. “Eu não aconselho, mas nosso papel também é honrar os direitos dos pacientes e fazer a experiência do nascimento ser única, da maneira que eles desejarem”, encerrou.

Famosos e a placentofagia

A prática aderida no Brasil nos últimos tempos já é popularizada em outros países a alguns anos. Grande nomes como Kourtney Kardashian, Kim Kardashian, Chrissy Teigen e Hilary Duff, estão na lista de mamães que aderiram à prática. Nos EUA, inclusive, já existe uma empresa que vende cápsulas de placenta.

No Brasil, a coach Mayra Cardi foi uma das celebridades que fez questão de compartilhar sua experiência nas redes sociais alegando que é um processo natural assim como os animais consomem suas placentas. A profissional encapsulou o órgão e consumiu ao decorrer dos dias que sucederam o parto. A profissional e influencer disse não ser evoluída o suficiente para comer crua.

Já Fernanda Lima e Rodrigo Hilbert comeram a placenta ainda crua logo após o nascimento da filha caçula. No programa “Bem Juntinhos”, do GNT, exibido no último dia 9, o casal exibiu um vídeo que mostra o momento da placentofagia.

Veja o vídeo:

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