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Primeira crise de fome por mudanças climáticas preocupa pesquisadores da Amazônia
Crianças catam peixe na margem do rio, durante a vazante em Manaquiri, interior do Amazonas (Ricardo Oliveira/Revista Cenarium)
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04 de novembro de 2021
Bruno Pacheco – Da Revista Cenarium
MANAUS – A primeira crise de fome no mundo relacionada ao aquecimento global ocorre em Madagascar, País do Sudoeste da África, segundo alerta divulgado na terça-feira, 2, pelo Programa Mundial de Alimentos (PMA), fundado pela Organização das Nações Unidas (ONU). Para pesquisadores da Amazônia, essa crise pode não ser a última causada pelas atividades humanas contra o meio ambiente, principalmente, em meio à maior incidência de eventos climáticos observados na região.
“Sobre ser o último, infelizmente, é provável que não. As secas estão se tornando mais frequentes – veja, por exemplo, que aqui na Amazônia tivemos secas muito fortes em 1997, 2005, 2009; 2010, bem como 2015 e 2016. Ou seja, uma frequência de aproximadamente cinco anos, enquanto que no século passado a frequência era menor do que 1 em 10 anos”, comentou a bióloga Flávia Costa, especialista em Ecologia e pesquisadora do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa).
À CENARIUM, a pesquisadora disse nesta quinta-feira, 4, que esse padrão de secas mais frequentes está acontecendo também em várias partes do mundo, enquanto que em outras regiões há a maior incidência de enchentes. “Este fenômeno é conhecido como intensificação do ciclo hidrológico, ou seja, maior frequência de eventos extremos de dois lados – seco demais ou chuvoso demais. Em ambos os casos, há prejuízos para a agricultura e as populações mais pobres ficam especialmente vulneráveis, pois quase não há tempo para se recuperar entre um evento extremo e outro”, explicou Flávia Costa.
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Região tropical
O ambientalista mestre em Ecologia Carlos Durigan, diretor da Wildlife Conservation Society (WCS Brasil), afirmou que qualquer região do planeta está sujeita a viver períodos extremos que leve à escassez de recursos e a Amazônia, para ele, pode sofrer fortes provações por ser uma região tropical que já convive com altas temperaturas.
“Por exemplo, é comum em verões extremos testemunharmos fortes secas nos rios que levam à mortandade de grande quantidade de peixes, principal fonte proteica dos povos Amazônidas. Assim um cenário de extremos climáticos pode levar a uma crescente escassez de recursos pesqueiros. O mesmo pode também acontecer com a produção e fornecimento de produtos agrícolas, que dependem dos períodos de chuvas para manter sua produção estável e extremos de secas podem reduzir gradativamente a produtividade de muitas culturas regionais”, declarou à CENARIUM.
Durigan lembra também que os eventos climáticos extremos pelos quais a Amazônia tem passado podem se acentuar e, ainda, serem cada vez mais frequentes. Para ele, é preciso de mais investimento em estrutura e planejamento de ações de adaptação a possíveis novos cenários similares e até piores.
“Temos vivenciado provas importantes de extremos em anos recentes. Em 2015, tivemos um período de verão extremo na Amazônia Central que levou a uma alta recorde de queimadas, assim como redução drástica dos níveis de algumas bacias hidrográficas. Este cenário levou a um aumento de problemas de saúde na população de muitas cidades, assim como grande mortandade de peixes em algumas regiões. Também, nos últimos 2 anos, tivemos períodos de chuvas mais intensos e prolongados, causando problemas logísticos e mesmo de produção nas áreas ocupadas pela agricultura familiar na várzea, gerando fortes prejuízos e demanda por atenção”, pontuou Durigan.
Sem preparo
Um estudo lançado pelo projeto Achados e Perdidos, desenvolvido pela Transparência Brasil e Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), em parceria com a agência de dados Fiquem Sabendo, nenhum dos nove Estados da Amazônia Legal têm sistemas de alertas ou planos de contingência permanentes para eventos extremos, como inundações, secas, incêndios florestais e ondas de calor.
Apenas quatro, dos nove Estados da Amazônia, possuem metas que citam diretamente mudanças climáticas nos Planos Plurianuais (PPAs) 2020-2023, que são o Amazonas, Amapá, Maranhão e Mato Grosso, segundo mostra o levantamento. Desses, só os PPAs do Amapá e Maranhão são os instrumentos legais que definem ações específicas sobre mudanças climáticas; no restante, há leis que criam políticas públicas perenes para a área.
A pesquisa analisou a implementação de políticas subnacionais para a gestão das mudanças climáticas na Amazônia Legal, a partir de dados obtidos por meio da Lei de Acesso à Informação (LAI) e do cruzamento com dez indicadores desejáveis para controle da situação de emergência climática na região, divididos em três grupos: governança, mitigação e adaptação.
Madagascar
De acordo com o Programa Mundial de Alimentos (PMA) da ONU, a metade do Sul da ilha de Madagascar tem sido afetada por uma seca histórica, cuja temporada, geralmente, costuma ir maio a outubro e a de cheias começam em novembro. Por conta das mudanças climáticas que alteraram esse ciclo, no entanto, pequenos agricultores têm sofrido os primeiros impactos e quase 30 mil pessoas da região enfrentam uma crise de fome, já que não há como colher.
Além disso, o País convive com mais de 1,3 milhão de pessoas que sofrem de desnutrição aguda. Como a próxima colheita só será em seis meses, o PMA está colaborando com parceiros humanitários e o governo de Madagascar para fornecer ajuda alimentar à população visando o combate emergencial da crise. A agência da ONU busca também US$ 69 milhões prestar a assistência necessária.
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