Professores e reitores de instituições federais da Amazônia lamentam bloqueio e corte bilionário na Educação; ‘prejuízo à sociedade’

Educadores chamam de "dramático" o corte de R$ 3,23 bilhões na Educação, promovido pelo Governo de Jair Bolsonaro (Marcelo Camargo/Agência Brasil)
Bruno Pacheco – Da Revista Cenarium

MANAUS — O bloqueio de R$ 3,23 bilhões no orçamento do Ministério da Educação (MEC), em 2022, promovido pelo Governo Bolsonaro nessa sexta-feira, 27, atinge diretamente universidades e instituições federais do País. A medida, tomada para o ‘teto de gastos’, mecanismo que liga o crescimento das despesas à inflação, foi repudiada e criticada por professores e reitores da Amazônia.

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Ao todo, o governo promoveu um bloqueio que deve ficar próximo a R$ 14 bilhões em todo o funcionalismo. O corte da Educação, em R$ 3,23 bilhões, se refere a 14,5% do orçamento discricionário do MEC e unidades vinculadas, que somavam R$ 22,2 bilhões. À REVISTA CENARIUM, a reitora do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Acre (Ifac), Rosana Cavalcante dos Santos, afirmou que a perda do recurso é dramático e elencou os impactos que devem ser sentidos.

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“Desde 2014, as instituições de Educação no Brasil têm uma perda de orçamento, na média, de 60%. No caso do Ifac, o orçamento de hoje é praticamente o mesmo de 2012. Em 2012, no entanto, tínhamos 2 mil alunos e agora temos 7 mil anos. Então, esse anúncio de um bloqueio de 14,5% é dramático”, afirmou Rosana dos Santos.

Rosana Cavalcante dos Santos disse que o corte é dramático e que vai prejudicar todos os serviços do Ifac (Reprodução)

Para a educadora, todos os serviços da instituição acabam sendo prejudicados. “No Instituto Federal do Acre, iremos nos reunir na semana que vem para tentar entender [os prejuízos]. A gente já sabe que vai ser traumático as perdas orçamentárias em todas as ações do Ifac, seja no ensino, na pesquisa ou na extensão e assistência estudantil, no orçamento para investimento e manutenção da estrutura, segurança e limpeza da instituição”, continuou a reitora.

Rosana dos Santos salienta que as instituições públicas federais têm seu orçamento dividido basicamente em despesas discricionárias e obrigatórias, sendo as primeiras aquelas em que a administração detém o poder de alocar recursos de acordo com o seu planejamento e suas prioridades. “As despesas obrigatórias são, em geral, com pessoal e encargos e não estão englobadas no bloqueio. As despesas discricionárias são aquelas em que a Administração Pública despende para pagamento de despesas com custeio e investimento e, no caso do Ifac”, ressaltou.

Repúdio ao bloqueio

Em nota oficial, o reitor da Universidade Federal do Pará (UFPA), Emmanuel Zagury Tourinho, repudiou o corte do governo federal na Educação e destacou que o bloqueio compromete todas as atividades da instituição. “As medidas anunciadas comprometem todas as atividades de uma universidade do porte e da importância da UFPA, e merecem o nosso mais veemente repúdio. É indispensável que sejam suspensas e que os orçamentos das instituições públicas de ensino e pesquisa sejam recompostos”, declarou o reitor, em trecho da nota.

Para Emmanuel Tourinho, a educação e a ciência, que já foram severamente atingidas nos últimos anos por cortes orçamentários, recebem mais um “duro golpe” do governo federal. No documento, o reitor destaca que o bloqueio de 14,54% equivaleria, na UFPA, à perda de R$ 28 milhões de um orçamento que vem diminuindo.

“Na Universidade Federal do Pará (UFPA), isso equivaleria à perda de R$ 28 milhões de um orçamento que já é R$ 10 milhões menor do que o de 2019, contra uma inflação de 18,89% no período. Uma condição de financiamento que já era crítica torna-se, neste momento, absolutamente insustentável”, pontuou o professor.

Reitor Emmanuel Tourinho disse que a UFPA recebe mais um ‘duro golpe’ (Alexandre de Moraes)

Ainda em nota, o reitor lembra que UFPA gerencia as restrições orçamentárias buscando parcerias e priorizando a manutenção das atividades de ensino, pesquisa e extensão, além da assistência estudantil. Segundo Emmanuel, é isso que garante os avanços conquistados em áreas estratégicas e possibilitado a permanência do corpo discente mais vulnerável.

“A UFPA não abre mão de continuar funcionando, com educação e ciência de qualidade, com ensino gratuito, com inclusão e respeito à diversidade, com o protagonismo que sempre teve no desenvolvimento do Pará e de toda a Amazônia”, salientou o reitor Emmanuel Tourinho.

Insuficiente

O presidente do Conselho Nacional das Instituições da Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica (Conif) e reitor do Instituto Federal do Pará, Claudio Alex da Rocha, se posicionou contrário ao bloqueio e disse ao Metrópoles que o impacto é grande.

“Considerando principalmente dois aspectos: a gente já vem sofrendo a diminuição do nosso orçamento, que já é insuficiente para darmos conta das nossas ações; e afeta também nossa retomada presencial”, citou.

O Conif afirmou que vai buscar abrir um diálogo com o ministério, “a fim de reverter esse bloqueio e ter a dimensão de quando é possível a reversão”. “Pois, caso isso não ocorra, vai fragilizar muito e inviabilizar nossas ações programadas para a execução orçamentária até o fim do ano”, diz a instituição.

Projetos

O reitor do Instituto Federal do Amazonas (Ifam), professor Jaime Cavalcante Alves, descreveu à CENARIUM que o corte do orçamento da Educação pode levar a suspensão de projetos de pesquisa e extensão. No Estado, o Ifam conta com 22 unidades, 2 mil servidores e mais 26 mil alunos, matriculados em cursos que vão do ensino médio à pós-graduação.

“O Instituto Federal do Amazonas (Ifam), assim como todo a Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica, vem sofrendo cortes ano após ano em seu orçamento. Assim, faz-se necessário repensar, reprogramar e, em alguns casos, suspender ações de projetos de pesquisa e extensão que têm como objetivo promover a educação e a sustentabilidade na Amazônia.

Professor Jaime Cavalcante Alves destacou ser necessário suspender ações de projetos com o bloqueio do orçamento (Divulgação)

Alves reiterou sobre o replanejamento de gastos após o bloqueio do recurso federal. “O instituto está em plena expansão, e os bloqueios comprometem o planejamento do instituto que terá que fazer uma reengenharia de seus gastos, replanejar algumas ações e ou até mesmo adiar projetos até que a situação orçamentária permita que as ações possam ser realizadas”.

Prejuízo

O antropólogo e professor Alvatir Carolino, do Instituto Federal do Amazonas (Ifam), chama atenção para a falta de incentivo no segmento educacional no País. Para o especialista, enquanto a educação continuar não sendo vista como investimento pelo Governo Bolsonaro, a tendência é que os cortes vão continuar permanecendo, impactando negativamente no funcionamento da unidade e dos polos.

À REVISTA CENARIUM, Carolino lembrou que desde o Governo Temer, quando foi aprovada em 2016 a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 55/2016, que limita o aumento dos gastos públicos, o País vem sofrendo sucessivos cortes de recursos, tanto de custeios quanto de investimentos.

“Nós já vínhamos sofrendo com estes cortes e, agora, mais uma vez, a projeção para o próximo ano é de cortes ainda maiores. O prejuízo não é somente quem é servidor ou estudante de uma instituição de ensino, como uma universidade ou um instituto federal, mas de toda a sociedade. Sem a condição de formação com qualidade, pública e gratuita, a sociedade padece”, destacou o professor do Ifam.

Alvatir Carolino reforça, ainda, que os cortes podem fazer com que sejam suspensas as atividades voltadas a construção de laboratórios de tecnologia, arquitetura, entre outros, além da interrupção de projetos dentro das instituições de ensino. O professor salienta também que o Estado não pode se distanciar do investimento à Educação, Ciência e Tecnologia.

Professor e antropólogo Alvatir Carolino afirma que o Estado não pode se distanciar do investimento à Educação, Ciência e Tecnologia (Arquivo Pessoal/Reprodução)

“Investimento em Educação, Ciência e Tecnologia trata-se de uma ação estratégica do Estado para o desenvolvimento econômico, social, cultural da sociedade. Portanto, governo nenhum pode se distanciar dessa percepção, porque o governo que se distancia de tomar o investimento em Educação como estratégia de desenvolvimento nacional, está condenando a sociedade à condição de subjugada perante o cenário internacional e ao subdesenvolvimento”, elencou o professor.

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