Profissionais apontam desafios e oportunidades em tempos de IA
Por: Bianca Diniz
16 de fevereiro de 2025
MANAUS (AM) – O Dia do Repórter, celebrado em 16 de fevereiro, é uma data que homenageia aqueles que dedicam a vida a investigar, apurar e transmitir informações de interesse público. A profissão que vive constantes desafios, muitos deles resultantes de ameaças a democracia, atravessa gerações e se reinventa diante dos avanços tecnológicos, como a Inteligência Artificial (IA).
De acordo com o escritor e jornalista Gabriel García Márquez, o jornalismo exige valores fundamentais, como ética e integridade, que não podem ser negociados. “A ética deve acompanhar sempre o jornalismo, como o zumbido acompanha o besouro” destaca sobre a necessidade de uma integridade que deve ser essencial da profissão.
Nesta data, vale falar sobre os profissionais que exercem o ofício sob desafios e que mesmo assim, diariamente trabalham com responsabilidade para transmitir informações à sociedade.
Este texto diante do leitor seja em um smartphone, computador ou qualquer outro dispositivo, existe porque uma repórter se dedicou a apurar, organizar e conectar fato. Sou, ao mesmo tempo, autora e personagem deste texto, pois assim, o jornalismo se constrói: na conexão entre quem escreve e o que é contado.
Tecnologia e desafios
Em um mundo sobrecarregado de informações e novidades tecnológicas, linguagens se misturam, formam novos cenário. A Inteligência Artificial amplia as possibilidades de de novidades na comunicação, mas também impõem novos desafios.
O relatório “Tendências e Previsões para o Jornalismo, Mídia e Tecnologia 2025” divulgado pelo ‘Reuters Institute’ para estudo de jornalismo com a Universidade Oxford, aponta desafios para as organizações de notícias, com a Inteligência Artificial, como o ChatGPT e outras ferramentas, que geram impactos na produção e consumo de informações.
O estudo aponta que as mudanças nos mecanismos de busca e a geração de respostas automáticas para o consumo de notícias podem impactar a visibilidade e a audiência dos veículos de comunicação.
“Mudanças na busca, em particular, se tornarão uma grande queixa para a indústria de notícias, que já perdeu tráfego social e teme um novo declínio na visibilidade à medida que as interfaces de IA começam a gerar respostas ‘semelhantes a histórias’ para consultas de notícias”, aponta.
Ao mesmo tempo, a utilização de IA cresce em redações, como a automação de tarefas e a personalização de conteúdos. Os autores Nic Newman e Federica Cherubini relatam no levantamento que o “grande desafio” deve ser a integração da IA sem comprometer os valores do jornalismo, como imparcialidade, precisão e responsabilidade.
“A maioria afirmou que estaria explorando ativamente recursos que transformam artigos em áudio, fornecem resumos de IA no topo das matérias ou traduzem artigos de notícias para diferentes idiomas”, destacam.
Repórteres
Já a repórter Ana Cláudia Leocadio descreve a IA como “uma incógnita para muitos” e “útil” ao jornalista para otimizar o trabalho, sem esquecer dos princípios da profissão. “Isso não nos tira a responsabilidade de checar a informação, principalmente numa época em que reina a desinformação”, declarou.

Leocadio, que completa 25 anos de carreira no jornalismo neste ano, conta que vivenciou muitas transformações na profissão de repórter e, por isso, alerta para os riscos de “apostar todas as fichas” no uso da IA no trabalho jornalístico.
Segundo a jornalista, as ferramentas podem viciar e desestimular a criatividade, além de acostumar os leitores a consumir menos informações e depender de notícias resumidas por IA. “Como toda nova tecnologia que chega, temos que ter equilíbrio e aprender a usá-las ao nosso favor”, complementa.
Equilíbrio
A jornalista e coordenadora de Redação da CENARIUM, Adrisa De Góes, considera a Inteligência Artificial como uma ferramenta positiva para aprimorar o processo de trabalho dos repórteres. Ela ressalta que, para isso, é necessário que os profissionais a utilizem com o objetivo de complemento. “O uso excessivo pode formar repórteres cada vez menos críticos e dependentes dessa tecnologia”, destaca.

Para Adrisa, os profissionais devem respeitar os limites de uso no dia a dia, mantendo o equilíbrio entre o trabalho humano e as ferramentas tecnológicas. “É ideal que o uso da IA esteja equilibrado com a intervenção humana e com outras formas de pesquisa e apuração da informação” declara.
Missão
O repórter da CENARIUM, Fabyo Cruz, enxerga a reportagem como uma missão de levar informações à sociedade. Ele destaca que o público não consegue acompanhar todos os acontecimentos devido às obrigações diárias, e é o repórter quem tem a responsabilidade de trazer esses assuntos à tona.
Ele compartilha que, em sua carreira, a cobertura da revogação da Lei 10.820/2024, que alterava a carreira do magistério no Pará, foi uma das pautas mais marcantes. A lei, que gerou forte resistência de movimentos sociais, educadores e lideranças indígenas, principalmente pela ameaça ao ensino nas comunidades dos Povos Indígenas, motivou uma série de manifestações e ocupação na Secretaria de Educação do Pará (Seduc-PA).

Cruz foi um dos primeiros a noticiar o impacto da lei e sua revogação pela CENARIUM, acompanhando em Belém, a mobilização dos professores e líderes indígenas que, após quase um mês de protestos, conseguiram a revogação da medida pela Assembleia Legislativa do Pará (Alepa).
Ele enfatiza com satisfação o trabalho de cobertura como um dos momentos marcantes da carreira de repórter. “Fui um dos primeiros a cobrir, e isso me marcou muito”, afirmou.
No que diz respeito ao impacto da Inteligência Artificial no jornalismo, Fabyo vê a tecnologia como uma aliada do repórter para agilizar processos como a busca de dados em documentos e planilhas. Ele também destaca a facilidade que a IA proporciona em tarefas que, de outra forma, exigiriam mais tempo, como a decupagem de entrevistas. Porém, ressalta que a checagem e a supervisão humana continuam sendo fundamentais. “Nunca a máquina vai fazer tudo sozinha; sempre é bom ter a nossa checagem para garantir que tudo foi feito corretamente”, opina.
Ferramentas aliadas
O repórter da Cenarium, Jadson Lima, destaca a importância de manter a responsabilidade com a informação, ressaltando que, historicamente, as ameaças enfrentadas no exercício do jornalismo sempre foram um dos principais desafios da profissão.

Para ele, os avanços tecnológicos representam oportunidades, e ferramentas de IA podem se tornar aliadas no trabalho jornalístico. “Eu não acredito que haverá mudanças na forma de fazer jornalismo, uma vez que as ferramentas podem se tornar aliadas dos profissionais”, declara.
Lima destaca que, apesar dos desafios, a motivação e as realizações no exercício da profissão são impulsionadoras. Desde o início da graduação em Jornalismo, há cinco anos, o desejo de ser repórter o levou a superar inúmeros obstáculos. “Sou movido pela vontade de dar visibilidade a questões que frequentemente passam despercebidas ou são negligenciadas”, afirma.