‘Querem transformar em mercado aquilo que para gente é sagrado’, diz indígena Munduruku sobre garimpo ilegal
12 de novembro de 2021
Sobrevoo registra áreas de garimpos ilegais dentro da Terra Indígena Munduruku, no Pará, em setembro de 2019 (Greenpeace)
Victória Sales – Da Revista Cenarium
MANAUS – Um seminário realizado nesta sexta-feira, 12, pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), trouxe um debate sobre os “Impactos do garimpo ilegal de ouro na Amazônia: efeitos na saúde e no bem-viver do povo indígena Munduruku”. De acordo com a ativista indígena, Alessandra Korap, do povo Munduruku, o governo federal, por meio de leis, quer regularizar a mineração em TI. “Querem transformar em mercado aquilo que para gente é sagrado: nossos rios e nossas florestas”, destacou.
Um levantamento do Instituto Socioambiental (ISA), divulgado em junho deste ano, mostrou que em dois anos e meio, o garimpo ilegal devastou mais de 2.260 hectares de Terras Indígenas (TI) Munduruku, localizada entre os Estados do Amazonas, Pará e Mato Grosso. A pesquisa foi realizada entre os meses de janeiro de 2019 e maio de 2021.
Garimpo ilegal em terras Munduruku. (Vinicius Mendonça/ Ibama)
Como um pedido de socorro, Alessandra conta que se acabarem com o rio, acaba com todo povo Munduruku, seja aquele em forma de gente ou seja em forma de animais. “Nossa terra é alvo de interesses gananciosos dos Pariwat*, pois nela há muitos minérios, ouro e diamante, coisas que para a gente não tem valor, e para eles é motivo de tirar o sangue indígena. Nossas vidas e nossa floresta parecem valer menos diante da ganância deles”, relatou.
A ativista afirma também que o garimpo é uma das grandes ameaças do rio Tapajós e do povo Munduruku. “Nós sabemos o quão mal pode fazer o mercúrio em nosso corpo, pois ele vai para a água e entra na nossa cadeia alimentar. Já ficamos sabendo que na região pessoas estão com níveis elevados de mercúrio, e queremos muito que isso seja investigado com profundidade. Não é apenas nosso rio que está sofrendo com isso”, declarou.
As terras Munduruku são reconhecidas pela Fundação Nacional do Índio (Funai) e que deveria ser preservado, garantido a segurança e o modo de vida desses indígenas. Mas, com as constantes ameaças e invasões de terras causadas pelo garimpo, essa garantia está cada vez mais longe de se obter. De acordo com a antropóloga Luísa Molina, que estuda os impactos da degradação socioambiental causada pelo garimpo no Tapajós, apontou ainda que o desmatamento aumentou muito na região do Alto Tapajós. “A terra indígena dos Munduruku esteve no ano de 2020 entre as áreas mais desmatadas do País. E sabemos que lá no alto do Tapajós não tem outra atividade expressiva que possa ter provocado um desmatamento como esse a não ser o garimpo ilegal dentro dos territórios tradicionais”, ressalta ao site WWF.
Segundo um estudo feito pela Universidade Federal de Minas Gerais e o Ministério Público Federal (MPF), 28% da produção nacional de ouro tem alguma evidência de irregularidades. No entorno do território Munduruku, o Pará é líder em irregularidades. Com mais de cinco toneladas de ouro de origem ilegal, o Estado produziu quase 18% desse produto, somente no município de Itaituba, Jacareacanga e Novo Progresso, onde estão as Terras Indígenas Munduruku e Kayapó.
(Reprodução/InfoAmazônia)
(*) Pariwat – nome dado para se referir aos não-indígenas pelos Munduruku
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