Quilombo do Abacatal luta por direitos e políticas públicas no Pará


Por: Fabyo Cruz

22 de novembro de 2024
Quilombo do Abacatal luta por direitos e políticas públicas no Pará
Turi Omonibo em frente à sede da Associação de Moradores e Produtores Quilombolas do Abacatal (Ampqua) (Fabyo Cruz/CENARIUM)

BELÉM (PA) – Com 314 anos de história e resistência, o Quilombo do Abacatal, localizado no município de Ananindeua, na Região Metropolitana de Belém (RMB), no Pará, mantém vivas tradições e heranças culturais. Em meio a desafios contínuos, a comunidade luta por reconhecimento de direitos e pela implementação de políticas públicas que garantam condições dignas e respeito à identidade.

Aos 85 anos, a quilombola Raimunda Seabra, mais conhecida como “Dica”, é uma das mais antigas habitantes do Abacatal. Juntamente com o filho, Edilson Silva, de 58 anos, ela compartilha o valor de viver no local. “Antes eu vendia verduras no Ver-o-Peso, mas, agora, prefiro estar aqui, em contato com a natureza. A gente toma banho no igarapé, planta mandioca e colhe açaí. Vivemos do que a terra oferece”, diz dona Dica, destacando a harmonia com o meio ambiente que marca a vida na comunidade.

Raimunda Seabra, a “Dica”, como é conhecida no Abacatal, ao lado do filho Edilson Silva (Fabyo Cruz/CENARIUM)

Edilson, por sua vez, acrescenta que a sabedoria popular também é um pilar essencial para a sobrevivência no quilombo. “Meu remédio é do mato. Faço chá e sigo a vida”, revela, explicando como alguns moradores fazem uso dos recursos naturais para a saúde e o bem-estar.

Resistência

A história de resistência do Quilombo do Abacatal vem do “Caminho das Pedras”, onde está impregnada nas pedras que foram colocadas por pessoas escravizadas sob a ordem do português Conde Coma Mello. Fátima Silva, de 37 anos, coordenadora de finanças da comunidade, explica com emoção o valor ancestral do local. “Este caminho foi construído por nossos antepassados, como forma de resistir à opressão. Eu sou da sétima geração dos Costa e da sexta dos Barbosa”, conta, ressaltando a importância do tombamento do local pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan).

“Caminho das Pedras”, construído por pessoas escravizadas, sob a ordem do português Conde Coma Mello (Fabyo Cruz/CENARIJM)

As dificuldades enfrentadas pela comunidade, desde a época da escravidão até os dias atuais, não diminuíram a luta pelo direito à dignidade. Fátima afirma que a união e o engajamento são essenciais para a sobrevivência do Quilombo. “Ou você se engaja ou perde seus direitos. Não podemos deixar de estar atentos ao que acontece a nossa volta. Precisamos ter voz e conhecimento para defender nosso território e nossa cultura”, ressalta.

Fátima Silva (Fabyo Cruz/CENARIUM)

Thamiris Teixeira, secretária da Associação de Moradores e Produtores Quilombolas do Abacatal (Ampqua), fala com orgulho da comunidade. “Somos resistência e, acima de tudo, somos pessoas e cultura. Preservamos nossos valores e transmitimos isso para nossas crianças”, diz Thamiris, enfatizando que o respeito das instituições públicas é fundamental para que as políticas públicas cheguem com mais facilidade ao quilombo.

Thamiris Teixeira, secretária da Ampqua (Fabyo Cruz/CENARIUM)
Cidadania

O engajamento da comunidade teve um importante reforço no dia 21 de novembro deste ano, durante a Semana da Consciência Negra, com a visita do Tribunal de Contas do Estado do Pará (TCE-PA), por meio do projeto TCE Cidadão Comunidade. Ao longo do encontro, foram abordados temas como controle social e fiscalização de recursos públicos. A presidente do TCE-PA, Rosa Egídia Crispino C. Lopes, destacou a importância de empoderar a comunidade quilombola para que ela participe ativamente na fiscalização e no controle do uso de recursos públicos. “O tribunal visa ampliar a cidadania e incentivar a participação ativa de todos, incluindo as comunidades quilombolas, no processo de fiscalização”, afirmou.

Rosa Egídia Crispino C. Lopes, presidente do TCE-PA (Fabyo Cruz/CENARIUM)

Para a liderança religiosa do quilombo e membro da sexta geração da comunidade, Turi Omonibo, é fundamental participar de eventos como o promovido pelo TCE, que oferecem informações para reivindicar direitos e cobrar por políticas públicas. “Queremos olhar nos rostos das pessoas que são responsáveis pela fiscalização e fazer chegar essas políticas aos territórios”, afirma.

A comunidade enfrenta desafios significativos, como a falta de saneamento básico e a precariedade das estradas que dão acesso ao quilombo. “Quando chove, a estrada fica praticamente intransitável. Isso afeta principalmente as crianças que precisam ir à escola”, lamenta Turi, que afirma, ainda, que uma das principais demandas do local é a pavimentação da estrada, com a inclusão de iluminação pública adequada, para garantir melhor qualidade de vida à comunidade.

Turi Omonibo, liderança religiosa do Quilombo do Abacatal (Fabyo Cruz/CENARIUM)

Ela comenta que, a partir das instruções obtidas na palestra do projeto TCE Cidadão Comunidade, a população quilombola poderá fiscalizar e cobrar do poder público verbas para minimizar problemas, tais como a ausência de saneamento básico e a má conservação das estradas.

Ainda durante a palestra do TCE, a auditora Olga Benário explicou o funcionamento da ouvidoria do Tribunal de Contas do Estado, disponível para demandas como denúncias e informações sobre irregularidades em recursos estaduais. Já a procuradora Hellen Brancalhão apresentou o Pacto Interinstitucional Pró-Equidade Racial, parceria com a Universidade Federal do Pará (UFPA) para promover cotas raciais, diversidade e inclusão no Estado, além de canais de acolhimento contra discriminação racial e de gênero, reforçando a importância da educação antirracista e da conscientização sobre racismo para uma equidade eficaz em políticas públicas.

Lideranças comunitárias e representantes do TCE-PA (Fabyo Cruz/CENARIUM)
Leia mais: Em Belém, ministro Barroso alerta sobre desigualdade racial e impactos do racismo
Editado por Adrisa De Góes
Revisado por Gustavo Gilona

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