Relatório aponta avanço de conflitos ambientais no Pará
Por: Fabyo Cruz
17 de junho de 2025
BELÉM (PA) – O Pará está entre os Estados mais afetados por conflitos socioambientais e crimes ambientais na Amazônia Legal, segundo o relatório “Além da Floresta: Conflitos Socioambientais e Deserto de Informações”, elaborado pela Rede de Observatórios da Segurança (ROS). Divulgado nesta terça-feira, 17, o documento, que monitora nove Estados brasileiros (AM, BA, CE, MA, PA, PE, PI, RJ e SP), revela que o Pará respondeu por 22,2% das 495 ocorrências registradas entre 2023 e 2024, ficando atrás apenas do Maranhão.
Com um total de 6.252 crimes ambientais computados no período, o Pará está entre os Estados com maior número absoluto de registros, sendo superado apenas por São Paulo. Os crimes mais frequentes envolvem fauna (2.873 ocorrências) e flora (2.524), seguidos de casos de poluição (675), exploração mineral (101) e outras infrações ambientais (79). Os dados foram fornecidos pela Secretaria de Segurança Pública e Defesa Social (Segup) e incluíram informações detalhadas sobre o tipo de crime, local, delegacia responsável e perfil das vítimas.
Diferentemente de outros Estados que não forneceram dados sobre povos e comunidades tradicionais, o Pará apresentou informações que possibilitam uma análise mais aprofundada da violência ambiental. Os registros também incluíram crimes motivados por conflitos fundiários, uma tipificação ainda sem definição legal, mas considerada relevante pelo estudo. Nessas ocorrências, a motivação agrária é identificada como causa de delitos como homicídio, invasão de território e coação.
Mineração ou garimpo ilegais
O relatório destaca ainda o protagonismo negativo do Pará nos registros de mineração ou garimpo ilegais, com 48 dos 71 casos documentados nacionalmente. A exploração mineral, inclusive, representa 72% das exportações do Estado, o que evidencia a dimensão da atividade sobre os territórios e comunidades locais. Essa sobreposição de interesses econômicos, muitas vezes legais, com práticas ilegais, tem acirrado os conflitos em áreas tradicionalmente ocupadas por indígenas, quilombolas e ribeirinhos.

Em entrevista à CENARIUM, o pesquisador Lucas Moraes, da Rede de Observatórios de Segurança no Pará, afirmou que a abundância de recursos naturais atrai organizações criminosas e empresas que exploram ilegalmente o território. Segundo ele, a ausência do poder público e o envolvimento de agentes políticos e membros das forças de segurança facilitam essas práticas. “A conivência institucional compromete a sobrevivência das comunidades tradicionais, com impactos como poluição dos rios, desmatamento e aumento da violência”, explicou.

Abordagem punitivista
A região do arquipélago do Marajó é citada como exemplo de abordagem punitivista na gestão da segurança pública. Segundo a Rede de Observatórios, as operações policiais ocorridas nos três primeiros meses de 2025 resultaram na detenção de 56 pessoas e na apreensão de apenas 4,6 kg de entorpecentes. O levantamento aponta que a repressão, desproporcional e pouco dialogada com as comunidades locais, gera medo, estigmatização e reforça desigualdades históricas.

Lucas Moraes observa que a presença do Estado no Marajó se manifesta mais pela repressão do que pela proteção. “A polícia adota abordagens truculentas, que geram medo e desconfiança entre os moradores, agravando a sensação de insegurança”, disse.
Falta de dados precisos
Em termos de variação, o Pará apresentou estabilidade entre 2023 e 2024, com um aumento de apenas 0,26% nos registros de crimes ambientais. No entanto, o relatório alerta que esse número não reflete a realidade das violações contra populações tradicionais, já que a maioria dos dados oficiais está enquadrada dentro da Lei nº 9.605/1998, que não contempla, por exemplo, conflitos por terra ou invasões de territórios.
‘Deserto de informações’
Além da produção de dados oficiais, o relatório ressalta a importância de iniciativas como o Observatório do Marajó, que analisa a cobertura midiática local e denuncia a falta de contextualização nas notícias sobre segurança pública na região. A predominância de narrativas que reforçam a criminalização de populações vulneráveis é apontada como um dos fatores que alimenta o chamado “deserto de informações” na Amazônia.
Para o pesquisador, a baixa cobertura jornalística sobre crimes ambientais na região é agravada pela influência de políticos e empresários envolvidos em atividades ilegais. “Muitos casos deixam de ser noticiados porque os autores são figuras poderosas, o que dificulta a responsabilização. É preciso que o Estado fortaleça a presença institucional, com serviços públicos e políticas de desenvolvimento que garantam justiça ambiental e visibilidade às comunidades afetadas”, afirmou.