Representatividade na mídia como direito

Os direitos à liberdade de manifestação de pensamento e de expressão dada pela Constituição Federal brasileira são as mais eficientes introjeções de norma jurídica no inconsciente coletivo nacional e reivindicada pelas entidades mais democráticas as mais reacionárias.

Esse argumento passou a ser tão amplamente difundido que exigiu do Supremo Tribunal Federal uma interpretação sistêmica do texto constitucional para impedir expressões de desprezo ou intolerância originadas por preconceito contra grupos sociais de etnia, gênero, orientação sexual, religião, deficiência física ou mental entre outras, adotando um sentido amplo do conceito de “racismo”, a partir do Caso Ellwanger de 2003 (HC 82424/RS) e consolidado com a aplicação de Lei do Racismo (Lei 7.716/1989) aos atos atentatórios a direitos fundamentais dos integrantes da comunidade LGBT em 2019 (ADO 26).

Trata-se de uma atuação do Poder Judiciário na implementação de uma concepção de justiça enquanto “reconhecimento”, garantindo como legítimos os vários projetos de vida nas mais diferenciadas perspectivas de minorias étnicas, raciais, de gênero e de orientação sexual.

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Mas a Constituição Federal não se restringe a isso, ela impôs também aos veículos de comunicação o respeito ao princípio da promoção da cultura nacional e regional e estímulo à produção independente que objetive sua divulgação, dentro da produção e programação das emissoras de rádio e televisão e meios eletrônicos.

Há aqui um direito constitucional dos diversos grupos minoritários de se fazerem representar dentro do quadro de programação dos veículos de mídia. Não de uma forma caricata ou estereotipada, mas a partir das suas próprias construções independentes.

A norma simplesmente quer garantir que todos possam se ver e serem vistos nos veículos de comunicação, como decorrência do direito fundamental à isonomia e à igualdade de oportunidades, já que a representação dentro de um canal pode garantir a segurança interior de assumir suas identidades éticas, religiosas e de orientação sexual, além de reprimir as manifestação reacionárias e os discursos de ódio que as acompanham.

Portanto, não basta apenas pautar as diversidades culturais regionais e os grupos minoritários, mas, sobretudo, deve-se garantir que eles próprios sejam autores da sua representação midiática, sem mediadores que ocupem seus espaços de fala. Ou seja, quando a Constituição fala em produção independente, ela está impondo aos veículos de comunicação que estabeleçam parcerias e cooperações para a autorrepresentação da diversidade.

Contudo, esse direito constitucional ainda é tão pouco introjetado no consciente coletivo dos detentores dos meios de comunicação, que são raras as aparições de lideranças indígenas, representantes dos movimentos LGBTQIA+, de pessoas com deficiência, que, além de serem representadas de maneira ridicularizadas, não têm espaço para o seu exercício criativo de produção.

Eis que, a justiça como um direito à “representação”, não precisa apenas dos poderes públicos para acontecer, precisa também de um maior engajamento dos donos dos meios de comunicação na construção de um País mais acolhedor e justo.

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(*)Daniel Pinheiro Viegas é advogado, procurador do Estado do Amazonas e doutor em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais.

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