Sacerdote realiza casamentos gays e defende decisão: ‘o que vale é o amor’

Religioso já realizou dois casamentos de casais homoafetivos, sendo que um deles foi de dois senhores (Arquivo pessoal)

Da Revista Cenarium*

SANTOS, SP – “Se os dois se amam e vem pedir a benção de Deus, mais direito tem eles de receber do que eu de dar”. Essa é a opinião do reverendo Sergio Ferreira sobre o casamento religioso para casais homoafetivos. Ele compõe a diocese da Igreja Anglicana de Santos, no litoral de São Paulo, e defende que o amor deve ser o fator principal na realização de um casamento, e não o gênero.

O reverendo na religião anglicana equivale a um padre na região católica, mas a expressão não é utilizada por ele. Sergio, ordenado sacerdote da Igreja em que atua em 2017, explica que o preconceito dentro do âmbito religioso ainda impede que a comunidade LGBT se aproxime da igreja.

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“No passado, a igreja cristã já permitiu o extermínio dos índios, dos negros [com a escravidão] e agora permite o extermínio dos homossexuais. É preciso ter uma real conversão a Jesus Cristo, porque ele não prega o ódio. Por isso, não acreditamos que ser gay seja um pecado. Essa é a pessoa e temos que aceitá-la. Isso não te faz pior do que ninguém”, destaca.

Para ele, o casamento deve ser realizado independente do gênero, mas baseado no amor do casal e da fé que ambos tenham. “Primeiro porque sempre existiram casais homoafetivos e porque acredito ser importante ressaltarmos qualquer manifestação de amor, uma vez que essa é a mensagem principal de Jesus Cristo e estamos vivendo um momento de muito ódio”, diz.

O religioso ainda explica que, pelo peso moral da igreja, acredita que a realização de um casamento religioso entre pessoas do mesmo gênero ajuda a reforçar os direitos civis dessas pessoas. Além do preconceito, o reverendo explica que outra coisa que impede a aceitação de toda a sociedade religiosa com relação a comunidade LGBT são os trechos bíblicos que permanecem em discussão.

“Há trechos que podem ser considerados advertência contra a homossexualidade. Mas, acreditamos que toda tradução é sempre uma traição e esses livros não foram traduzidos corretamente. Além disso, o antigo testamento é superado pelo novo. E no novo testamento, Jesus Cristo fala a todos ‘amai- vos uns aos outros’ e destaca que todos os mandamentos introduzem a um só, ‘amar a Deus e amar ao próximo como a ti mesmo’ “, destaca.

Sergio conta que já realizou dois casamentos homoafetivos. Um deles, foi a cerimônia religiosa entre dois idosos, que estavam há 25 anos juntos, casados com o reconhecimento da Justiça, mas que ainda não tinham tido o direito de casar na igreja. O outro foi de duas mulheres, em Guarujá, no litoral paulista.

De acordo com ele, o anglicanismo já aceita e tem reverendos homossexuais, assim como também já ocorreu a nomeação de um bispo gay nos Estados Unidos. “Essas mudanças que estamos realizando para incluir as diferenças ainda não são completamente aceitas por todos os religiosos. Há dioceses que aceitam e outras que não. Há padres com a sua comunidade que aceitam e outras que também não. Então ainda está tendo um acomodamento dessas questões”, explica.

Acreditando na importância da igualdade, ele também realiza um trabalho social com jovens homossexuais em situação de risco, que estão sendo expulsos de casa ou em situações de conflito. “É importante que eles entendam que não são uma abominação. A maior dificuldade que temos é de trazê-los para a igreja, porque já apanharam e sofreram muito por ela. Então busco orientá-los”, relata.

O casamento que o reverendo realiza é anglicano, então é preciso que haja toda um preparação de acordo com a religião. “Não é necessário se converter, mas é preciso ter o acompanhamento religioso e é preciso ter uma adesão a religião. Pretendo fazer mais casamentos, claro, afinal, Deus é amor”, finaliza.

Sonho realizado

Uma das mulheres casadas pelo reverendo, em Guarujá, que prefere não se identificar, relata que o casamento religioso foi a realização de um sonho. “Somos todos seres humanos e temos nossos direitos. Então as igrejas precisam entender isso”, disse.

A cerimônia, de acordo com ela, foi emocionante para toda a família. “O que deve ser levado em conta com relação ao homossexual, assim como para qualquer pessoa, é nosso carácter, é o que fazemos de bom perante a sociedade e principalmente ao próximo”, destaca.

Direitos iguais

O anglicanismo é um seguimento do cristianismo e tem origem na Inglaterra, no século 16. Seu surgimento, assim como a Reforma Protestante na Alemanha, ajudou a levar ao rompimento da coroa inglesa com a Igreja Católica Romana. A religião se tornou oficial no Reino Unido e hoje reúne fiéis por todo o mundo.

Em junho de 2018, após mais de 20 anos de discussões, uma assembleia realizada em Brasília por bispos e clérigos das dez dioceses da Igreja Episcopal Anglicana do Brasil, uma província da Comunhão Anglicana no país, aprovou a união entre duas pessoas, independentemente do gênero, por 57 votos a 3.https://tpc.googlesyndication.com/safeframe/1-0-37/html/container.html

Isso, segundo o reverendo Sergio, guiou a Igreja Anglicana de Santos, única da cidade e centenária, a seguir o mesmo caminho. Para ele, há três fatores principais que fizeram com que o anglicanismo caminhasse junto com a modernidade.

“O primeiro deles é permitir que os padres se casem. O segundo foi ordenar as mulheres, ou seja, dar direito de poder eclesial a elas dentro da Igreja, dessa forma elas podem ter o cargo de diácono, exercer a função de um padre e pode ser bispo também. Isso não é uma modinha de agora, porque a Inglaterra tem tradição de ter fortes mulheres no poder. E o terceiro fator, dialogar com os direitos dos homossexuais”, explica.

A Igreja Anglicana, conforme explica o religioso, é muito diferente da Igreja Romana. “Ela não tem um governo central. Ela tem princípios básicos e uma comunhão anglicana, que é uma administração totalmente independente. Nós não somos, aqui em São Paulo, subordinados ao arcebispo de Londres, nós apenas o reconhecemos como líder da primeira diocese, mas ele não tem poder administrativo e ideológico”, relata.

Ainda conforme explica Sergio, o primeiro bispo assumidamente gay dos Estados Unidos é anglicano. Como um sacerdote gay, ele defende que Deus ama as pessoas do jeito que elas são e que elas não são uma abominação, tendo direitos como qualquer outra pessoa.

(*) Com informações do Portal G1

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