Saída dos EUA do Acordo de Paris deve impactar projetos na Amazônia
Por: Ana Cláudia Leocádio
21 de janeiro de 2025
A ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA), Marina Silva e o coordenador de Política Internacional do Observatório do Clima, Claudio Angelo (Composição de Paulo Dutra/CENARIUM)
BRASÍLIA (DF) – A saída dos Estados Unidos do Acordo de Paris, confirmada pelo presidente Donald Trump, nessa segunda-feira, 20, deverá impactar mais a cooperação com o Brasil em projetos na Amazônia e também trará prejuízos e desafios para a diplomacia climática e para o multilateralismo climático no mundo. É como avaliam o impacto da medida o coordenador de Política Internacional do Observatório do Clima, Claudio Angelo, e a ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA), Marina Silva.
Aprovado em 2015, na 21ª Conferência das Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP21), realizada na capital da França, o Acordo de Paris foi aceito por 195 países para reduzir as emissões de gases de efeito estufa no contexto do desenvolvimento sustentável. O compromisso assinado foi para manter o aumento da temperatura média global em bem menos de 2°C acima dos níveis pré-industriais e empregar esforços para limitar o aumento da temperatura a 1,5°C acima dos níveis pré-industriais.
Para Claudio Angelo, em termos de recursos financeiros, a saída dos Estados Unidos terá pouco impacto porque o dinheiro que foi prometido era “uma mixaria” e nunca foi de fato disponibilizado ao Fundo Amazônia, responsável por gerir os recursos doados pelos países ao Brasil para projetos de proteção da floresta amazônica.
Homem manuseia serra elétrica em tronco de árvore derrubada (Ricardo Oliveira/Arquivo/CENARIUM)
“O que vai ser ruim, acho que é a cooperação mais ‘lato sensu’, porque muita coisa que a gente tem hoje de conhecimento da Amazônia e programas científicos, o próprio LBA [Programa de Grande Escala da Biosfera-Atmosfera na Amazônia], tudo foi construído com cooperação americana”, disse o coordenador.
Angelo lembra que os Estados Unidos têm sido um parceiro importante há mais de 40 anos do Brasil em projetos de conhecimento da floresta, conservação da floresta, recursos para a demarcação de terra indígenas (viabilizados pelo Usaid), por exemplo. “Mas é uma coisa também que o Brasil, já há muito tempo, desde a década de 90, faz por meios próprios. Então, essa ausência americana talvez não venha ser tão sentida assim nesses espaços”, avaliou.
Em declaração à CENARIUM, a ministra do MMA, Marina Silva, disse que a saída do segundo maior emissor dos gases do efeito estufa (CO2) do Acordo, com certeza, terá impactos.
“(…) É um prejuízo muito grande e um desafio para a diplomacia climática mundial e para o multilateralismo climático. E os países que têm compromisso com a agenda do enfrentamento da mudança do clima, que já está afetando a todos nós, vão continuar trabalhando e lutando para que todos aqueles que têm responsabilidades históricas de emissão e atual de CO2, possam fazer o seu dever de casa”, disse a ministra.
Marina Silva fala à CENARIUM sobre impactos da saída dos EUA do Acordo de Paris (Ana Cláudia Leocádio/CENARIUM)
Na noite de segunda-feira, após as medidas consideradas nocivas aos esforços de enfrentamento das mudanças climáticas, Marina considerou que a decisão de Trump “são o avesso da política guiada pelas evidências trazidas pela ciência e do bom senso imposto pela realidade dos eventos climáticos extremos que ocorrem, inclusive, em seu próprio país”.
A ministra lembrou que os planos do governo de Joe Biden para energia renovável, infraestrutura e industrialização verde contaram com o apoio dos republicanos no Congresso. Todos esses atos foram revogados pelo novo presidente dos EUA. “Nem a própria população dos EUA aceitará qualquer omissão, pois enfrenta no cotidiano os efeitos da emergência climática”, ressaltou Marina.
Pior para os EUA
O coordenador de Política Internacional do Observatório do Clima, Claudio Angelo, avalia que as decisões do presidente Donald Trump prejudicam mais os Estados Unidos, e foram tomadas em cima de uma mentira, de que o Acordo de Paris custaria mais de U$ 1 trilhão ao país.
“Isso é uma fraude completa. (…) Os Estados Unidos são economicamente prejudicados porque eles ficam de fora dessa nova economia, baseada em energias renováveis, que é um negócio que não tem mais volta, já decolou no mundo inteiro. Inclusive nos Estados Unidos, alguns dos Estados que tem mais proporção de energia renovável são republicanos”, afirmou Angelo.
Para o membro do Observatório do Clima, o perigo dessa decisão é causar um efeito dominó e atrair outros países a abandonarem o Acordo de Paris também. “Num momento em que a cooperação Internacional já está super em baixa, isso pode ser fatal para o combate à mudança do clima. Vamos lembrar que o Acordo de Paris hoje é a única coisa que nos separa de um aquecimento global de 3°C ou mais neste século”, avaliou.
O coordenador de Política Internacional do Observatório do Clima, Claudio Angelo (Reprodução/Renato Parada)
Por outro lado, Angelo também lembrou que os Estados Unidos “sempre foram o país que mais atrapalhou as negociações internacionais de mudança climática”, devido às suas particularidades internas para ratificar os acordos no Congresso.
“Nesses últimos 31 anos toda a negociação de clima foi muito baseada com o mundo respondendo às chantagens, às birrinhas dos Estados Unidos. Então é melhor agora mesmo que eles saiam e saiam de uma vez e parem de atrapalhar o processo, para o mundo discutir a sério como é que faz para combater a mudança do clima sem os Estados Unidos. Vai ser, evidentemente, muito mais difícil de resolver o problema, mas talvez a negociação fique bastante mais fácil sem o peso dos americanos atrapalhando”, concluiu Angelo.
Efeitos das decisões de Trump na COP30
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva decidiu, nesta terça-feira, 21, nomear como presidente da 30ª Conferência das Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP30), que será realizada em Belém-PA, o embaixador André Aranha Corrêa do Lago. Ele atualmente ocupa o cargo de Secretário do Clima, Energia e Meio Ambiente do Ministério das Relações Exteriores e vai conduzir as negociações para o acordo global sobre o tema.
Na avaliação de Lago, além de ser a maior economia do mundo e um dos maiores emissores de CO2 do planeta, os Estados Unidos também são um dos países que mais colaboram com respostas à mudança do clima, por meio do desenvolvimento de tecnologias.
“Os estados Unidos têm empresas extraordinárias e também tem vários Estados americanos, cidades americanas, que estão muito envolvidos nesse debate. Claro, estamos todos ainda analisando as decisões do presidente Trump, mas não há a menor dúvida que terá um impacto significativo na preparação da COP e na maneira que nós vamos ter que lidar com o fato de que um país tão importante está se desligando desse processo”, afirmou o presidente da Conferência.
Para Lago, a decisão soberana do país, de se retirar de um processo, “não significa necessariamente que o Acordo não possa encontrar uma forma de contornar a ausência desse país”.
“Inclusive os EUA continuam membros da Convenção do Clima. Estão saindo do Acordo de Paris, mas eles continuam membros da Convenção do Clima. Então, sim, há vários canais que permanecem abertos, mas não há a menor dúvida que é um anúncio político de muito impacto”, avaliou.
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