Sede da COP30, Pará lidera violência contra defensores de direitos humanos


Por: Fabyo Cruz

12 de agosto de 2025
Sede da COP30, Pará lidera violência contra defensores de direitos humanos
Dorothy Stang foi assassinada em 12 de fevereiro de 2005 (Reprodução/Redes Sociais)

BELÉM (PA) – Estado-sede da 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP30), o Pará é, hoje, o lugar mais perigoso do Brasil para quem defende direitos humanos, sobretudo ambientais e territoriais. A constatação é da segunda edição do estudo Na Linha de Frente, elaborado pelas organizações Justiça Global e Terra de Direitos, que analisou casos registrados entre 2023 e 2024. A divulgação dos dados ganha destaque nesta terça-feira, 12 de agosto, quando é celebrado o Dia Nacional dos Direitos Humanos.

No período, foram identificados 103 casos de violência contra defensoras e defensores de direitos humanos no Pará, o equivalente a 21,2% de todas as ocorrências no País. O Pará ocupa o topo do ranking nacional, seguido por Bahia (50 casos) e Mato Grosso do Sul (49).

Ranking dos Estados mais violentos para quem defende direitos humanos (Reprodução/Estudo “Na Linha de Frente”)

O levantamento revela que a violência é concentrada principalmente contra defensores ambientais e territoriais, que representam 94% das vítimas em todo território paraense. No Brasil, essa proporção é de 80,9%. Entre as vítimas no Pará, mais da metade dos casos (53,9%) ocorreu dentro do território de referência ou na moradia, e 67% aconteceram em áreas rurais.

O Pará também figura entre os líderes em assassinatos: foram seis mortes no período, ficando atrás apenas da Bahia (10 casos). No conjunto do país, 78,2% das vítimas de homicídio eram homens, 36,4% pessoas negras e 34,5% indígenas — dados que refletem o perfil predominante também nas ocorrências paraenses.

O estudo mostra que, em âmbito nacional, as ameaças seguem como a forma de violência mais comum (36% dos casos), mas a criminalização via institucional ganhou espaço e passou a ocupar o segundo lugar (24,7%). No Pará, a situação é agravada pela presença de agentes privados, como jagunços, fazendeiros e empresas, além de agentes públicos, principalmente forças policiais, entre os responsáveis pelos ataques.

Entre os casos mais emblemáticos do Pará e que tiveram repercussão nacional e internacional, estão:
  • Dorothy Stang (2005): Missionária norte-americana naturalizada brasileira, Dorothy Stang foi assassinada no município de Anapu, no Pará. Ela trabalhava na Comissão Pastoral da Terra (CPT) e era uma ativista incansável na luta pela reforma agrária e contra a exploração ilegal de madeira. O crime chocou o mundo e colocou em evidência a violência no campo na Amazônia.
  • Zé Cláudio e Maria (2011): O casal de ambientalistas José Cláudio Ribeiro da Silva e Maria do Espírito Santo da Silva foi morto em uma emboscada em Nova Ipixuna, no Pará. Eles eram conhecidos por denunciar madeireiros ilegais e a grilagem de terras na região. O crime ocorreu após anos de ameaças e pouco tempo depois de Zé Cláudio fazer um discurso profético em que afirmava que sua morte e a de sua esposa poderiam acontecer a qualquer momento.
  • Massacre de Pau D’Arco (2017): Dez trabalhadores rurais foram mortos durante uma ação policial em uma fazenda na cidade de Pau D’Arco, no sul do Pará. O caso gerou grande comoção e denúncias de violência policial e impunidade. Anos depois, em 2021, Fernando dos Santos Araújo, uma das testemunhas e sobrevivente do massacre, foi assassinado, reforçando a sensação de impunidade e a vulnerabilidade de quem luta por justiça na região.
  • Dilma Ferreira da Silva (2019): Líder do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), Dilma foi assassinada junto com seu marido, Claudionor Amaro Costa da Silva, em Baião, no Pará. Ela era uma defensora dos direitos das famílias impactadas pela construção de barragens, como a de Tucuruí, e sua morte foi um duro golpe para os movimentos sociais locais.
Caso recente

A CENARIUM noticiou o caso do ativista ambiental Pedro Paulo de Moraes Lima, diretor da ONG Guardiões e Amigos do Parque Ecológico (Gape), que atua na defesa de uma área de proteção ambiental em Belém, no Pará. Ele ficou conhecido nacionalmente após desaparecer em maio deste ano, o que gerou uma mobilização de entidades de direitos humanos e da sociedade civil.

Pedro Paulo de Moraes Lima (Reprodução/Redes Sociais)

O desaparecimento ocorreu depois que Pedro Paulo denunciou a venda irregular de terrenos e a grilagem de terras dentro da área protegida. Ele relatou ter sido agredido fisicamente e ameaçado de morte por pessoas envolvidas no esquema. Após o episódio, um bilhete foi encontrado em sua casa com os dizeres “Estou sendo ameaçado de morte”, o que reforçou as suspeitas sobre a sua segurança.

Pedro Paulo foi encontrado com vida alguns dias depois, mas confirmou que havia fugido do Pará para o Amazonas, onde buscou refúgio com parentes. Em um áudio divulgado, ele se declarou como um “refugiado político ambiental” e pediu proteção às autoridades locais. O caso dele é um recente exemplo dos riscos enfrentados por defensores ambientais na Amazônia e da violência ligada a conflitos fundiários na região.

Recomendações

Para as organizações responsáveis pelo levantamento Na Linha de Frente, os dados expõem a contradição de um local que, ao mesmo tempo em que sedia um dos principais eventos globais sobre clima, concentra parte significativa da violência contra quem atua justamente na defesa do meio ambiente e no enfrentamento da crise climática. O relatório é acompanhado de recomendações para fortalecer mecanismos de proteção, tanto pelo Estado quanto pela sociedade civil.

Diante da violência persistente, as organizações sugerem que seja criado um Plano Nacional de Proteção a Defensoras e Defensores de Direitos Humanos. Esse plano deve envolver ações coordenadas entre os diferentes poderes da União, dos estados e dos municípios.

Além disso, o estudo também pede que o governo brasileiro cumpra integralmente o Acordo de Escazú, um tratado internacional que garante o acesso à informação, a participação da sociedade e a proteção dos defensores do meio ambiente na América Latina e no Caribe. O Brasil assinou esse acordo, mas para as instituições, ainda precisa avançar bastante na sua implementação prática.

Leia mais: Estados da Amazônia têm piores índices de proteção a defensores ambientais
Editado por Adrisa De Góes

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